Esportes

Tyroane: um sonho de cada lado do campo

RIO – Se Tyroane Sandows jogar na equipe principal de um grande
clube, estaremos diante da vitória de um sonho de criança sobre obstáculos
respeitáveis. O futebol cansa de reproduzir histórias de jovens que mudam de
cidade para tentar a sorte e fraquejam diante da distância de casa. Imagine uma
criança de 11 anos que decide deixar os pais e cruza, sozinha, um oceano para
buscar sua realização. Foi o que fez este sul-africano, hoje com 21 anos.
Formado no Brasil, passou pelo São Paulo e hoje joga no que o Grêmio chama de
equipe de transição, uma espécie de segundo time com jogadores em
observação.

Ty, como é chamado em Porto Alegre, contraria
também a tese de que é preciso uma origem sofrida para ter a fome de vencer.
Filho de uma família de classe média de Johanesburgo, define-se como uma típica criança que
contava as horas para sair do colégio e ir jogar bola. Até que surgiu em sua
vida o Shona Khona, um projeto social que oferecia oportunidades
a jovens, no exterior, através do futebol. Em 2006, Tyroane decidiu se despedir do pai, um diretor de
hospital, e da mãe, uma professora, e embarcou para um período de experiência no
São Paulo. Agradou os observadores do clube, voltou no ano seguinte e está até
hoje no Brasil. Ficou oito anos no clube paulista antes de chegar ao Grêmio.

60252898_Brasil Brasília BsB DF 02-08-2016 - Olimpíada - Treino da equipe de futebol da África.jpgNem tudo foi simples. Por questões legais, em função da idade, não poderia
ficar alojado no Centro de Treinamento do São Paulo. Passou a buscar uma família
que o acolhesse. Através de uma intervenção do cônsul da África do Sul na
cidade, encontrou uma escola bilíngue, para iniciar sua adaptação do inglês para
o português. Enquanto conhecia a escola, uma das funcionárias decidiu acolhê-lo.
Ganhou uma família brasileira.

? Foi uma decisão difícil vir para o Brasil. Na hora, pesou o pensamento de
que estava em jogo o meu sonho de ser jogador. Hoje agradeço a Deus pela
escolha. Claro que o início foi difícil, qualquer um sentiria saudade. No
início, a língua foi o mais difícil, mas encontrei uma família que fala inglês.
Eles me acolheram muito bem, me fizeram feliz, são como uma outra família para
mim. O brasileiro é um povo parecido com o sul-africano, alegre ? disse Tyroane ao GLOBO.

O jovem atacante sul-africano não tem dúvidas: perguntado sobre a grande
herança que sua experiência singular lhe rendeu, usa a palavra ?independência?
como resposta. Claro que o amadurecimento exigido dele foi incomum. Mas Tyroane ganhou também, um segundo país. Hoje, tem
dupla cidadania. E um duplo sonho. Pensa em jogar por uma seleção, seja a
brasileira, seja a da África do Sul.

? Aprendi muito, tive um amadurecimento que um garoto de 11, 12 anos não tem.
Hoje, as duas portas estão abertas, nas duas seleções. Deus sabe o futuro.
Quero, primeiro, jogar pelo Grêmio no time principal e, depois, disputar uma
Copa do Mundo. Pode ser pela África ou pelo Brasil ? afirma.

Amanhã, em cada lado do campo do estádio Mané Garrincha estará um de seus
sonhos.

? Mas, neste jogo, sou 100% África do Sul ? avisa.