Esportes

Canal britânico inova na transmissão paralímpica e gera inclusão na TV

Como mudar a visão da sociedade em relação às pessoas com deficiência física? A TV britânica Channel 4 escolheu um caminho. Mostrá-las, e muito. Principalmente, fazendo coisas incríveis seja no dia a dia ou numa Paralimpíada. Precursora na aposta de uma cobertura diferente dos Jogos Paralímpicos, desde Londres-2012, o canal público tem conseguido o objetivo. No Rio, a transmissão chegou a 700 horas de programação, além do conteúdo online. A campanha promocional atual “Superhumans – Yes I Can” (Superhumanos, Sim, eu posso), que mostra deficientes atletas e comuns em momentos extraordinários, já teve mais de 50 milhões de visualizações. Alguns veículos ingleses criticaram o vídeo. Nada que abale, pois a ideia é atingir o maior número de pessoas possíveis a cada edição.

?Temos um relacionamento estreito com entidades de caridades de deficientes e eles apoiam nosso trabalho sem reservas. Mas, no geral, acredito que o jeito que a mídia retrata pessoas com deficiências ainda tem um longo caminho pela frente. Mas estamos fazendo progresso significativo ? disse Dan Brook., eo diretor de marketing e um dos idealizadores da cobertura, Dan Brooke.

Depois de “chocar” o mundo em casa, com uma cobertura completa, que teve mais de 500 horas de programação, no Rio-2016, a intenção era ir além no esporte e do esporte.

? Antes dos Jogos de Londres de 2012, os Jogos Paralímpicos eram vistos como um primo de segundo grau da Olimpíada, e sobre os mesmos pairava um ar de pena. Tivemos que ousar tanto na escala da programação como no jeito de agirmos, de forma a chocar as pessoas a mudarem de ideia ? lembra Brooke.

Conseguiram com o aperfeiçoamento da tecnologia ? há quatro anos, o LEXI, um sistema de gráficos para explicar as inúmeras categorias, foi criado, e agora trabalha em 3D, com dublagem de artistas ? e, sobretudo, com a presença maciça de apresentadores também com alguma deficiência. Em 2012 eram 50%, agora são 75% da equipe.

Conteúdo de uma matéria só: quadro de medalhas

? O que Londres deixou de legado foi que a metade dos apresentadores deficientes migraram para outras funções dentro da Channel 4, como apresentar programas de atualidades e documentários históricos. O Rio teve um impacto ainda maior: 75% dos apresentadores de televisão têm algum tipo de deficiência como também têm 15% da equipe de produção ? explicou o diretor.

Entre eles, o ator RJ Mitte, mundialmente conhecido pelo papel de Walter White Jr, filho do protagonista da série americana “Breaking Bad”. Ele foi convidado para comentar alguns esportes pela TV, como a bocha. Atuante na luta pela inclusão dos deficientes, o jovem de 24 anos crê que o crescimento dos Jogos Paralímpicos ajudarão nesse processo em todos os setores da sociedade.

? Acho que a importância desses jogos não se limita simplesmente aos deficientes. No fundo, os jogos impactam todo mundo e terão uma influência sobre a maneira em que vemos uns aos outros, o que trará um benefício para o mundo, conduzindo-o numa direção positiva ? analisou o ator, que espera uma abertura maior também em Hollywood. ? Hollywood vai mudar por meio de eventos como este, mostrando pessoas reais fazendo coisas incríveis e tendo um impacto não apenas para os atletas, mas também para seus familiares e países.

Apesar de ter jogado futebol e praticar esportes de inverno, Mitte garante que não tem muita aptidão para ser atleta. Ele agradece a oportunidade dada pela Channel 4 a ele e todos os deficientes.

? A cobertura realizada pela Channel 4 é incrível. Acho que eles são pioneiros, abrindo um novo jeito para as pessoas encararem a deficiência e acho que abrirá muitas portas e oportunidades para os deficientes ? conta.

O bom humor foi peça fundamental para desmistificar as deficiências. Tanto na leveza da transmissão das provas quanto em programas específicos, como o ?The Last Leg? (A Última Perna), criado há quatro anos e que foi mantido na programação. Durante os Jogos Paralímpicos, é exibido sempre em horário nobre britânico diretamente do Rio.

? Bolamos um programa de ?melhores momentos” que misturou esportes com humor. The Last Leg agora é um programa de entretenimento veiculados às sextas-feiras, à noite, em que se conversa tanto sobre a política e celebridades quanto sobre esportes ? conta Brooke.

Sem anúncios em 2012, a TV bancou a cobertura de Londres. Apesar de ser pública, a Channel 4 é financiada por empresas privadas, que recebem isenções fiscais como incentivo . Em casa, optou por uma campanha que chamasse a atenção para o atleta. Na primeira edição do “Superhumans”, a ideia era retratar os competidores paralímpicos como a elite, tal como na Olimpíada. O sucesso foi tão grande que valeu à emissora o prêmio Leão de Ouro de Cannes, em 2013.

? Tinha uma energia e rebeldia que deu como se fosse um tranco nas pessoas, tal como um relâmpago, obrigando-as a assistir o esporte. No caso dos jogos de 2016, queríamos ser diferentes, mais festivo e alto astral, como é o povo brasileiro. Também queríamos mudar o significado do termo Superhumano e incluir pessoas do dia-a-dia com habilidades espantosas, ao lado de atletas extraordinários. Há mais pessoas com deficiências neste anúncio do que na história inteira da publicidade britânica. E ficamos sabendo que está sendo veiculado nas escolas por todo o mundo visando ensinar às crianças o conceito da inclusão ? conta Brooke.

Um dos indicativos de que o objetivo da emissora pela diversidade está sendo alcançado são os números. Pesquisas entre os jovens têm mostrado resultados melhores do que os de Londres-2012.

? Lá tivemos a vantagem de competir em casa sem a inconveniência de fuso horário. Se você tivesse previsto isso antes dos Jogos, eu teria rido na sua cara ? brinca.

A emissora, que existe desde 1982 por um ato do parlamento britânico e hoje é gerida pela Channel 4 Television Corporation, tem a quarta audiência do país. Perde apenas para ITV, BBC One e BBC Two.

Detalhe paralímpico: Blade Runners