Cotidiano

Revogação inviabilizaria o agronegócio brasileiro

Ministro Blairo Maggi disse que já tratou do assunto com presidente Temer e com ministro da Fazenda

Cascavel – A possibilidade de revogação da Lei Kandir tem tirado o sono do agronegócio brasileiro. A lei foi sancionada em 1996 para estimular a participação do Brasil no mercado internacional, deu muito certo e entre os maiores beneficiados está o agronegócio. Vinte e dois anos depois, o Senado retoma o assunto e aprecia, nas próximas semanas, medida que pede a suspensão da lei com o objetivo de aumentar a arrecadação dos cofres públicos, sob argumento de que isso poderia “diminuir” o rombo no caixa, sobretudo dos estados.

Trata-se da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 37 de 2007, que revoga a Lei Complementar 87 de 1996, a chamada Lei Kandir. Entre os benefícios que ela traz está a isenção às exportações de produtos primários ou semielaborados do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Com isso, o produto nacional fica mais competitivo no mercado lá fora.

O setor não concorda com a revogação, só que a aprovação da medida em algumas comissões no Congresso provoca um levante. Segundo o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, isso preocupa e muito. Quase que em tom de desabafo, Maggi confessa que a revogação já passou por algumas comissões, foi aprovada e afirma que o setor precisa ficar atento.

O ministro assegura que o Mapa está se articulando para que isso não ocorra. “Há alguns dias conversei em um evento em Goiás com o Meirelles [ministro da Fazenda Henrique Meirelles] e com o Temer [o presidente Michel Temer] para ressaltar sobre isso (…) uma medida assim tira totalmente a competitividade do setor agrícola. Isso tira renda e se tira a renda não tem desenvolvimento”, afirma.

Blairo Maggi vai além: “Se o agronegócio vai bem, todo o mundo quer tirar um pedacinho, um pouquinho. Acontece que se cada um quiser tirar um pouquinho, o segmento vai morrer e o Brasil perde a grande locomotiva do seu desenvolvimento”, argumenta.

Medida teria impacto bilionário na economia do Paraná

O clima de estranheza e de preocupação com relação a um possível fim da Lei Kandir envolve outros líderes. O secretário de Estado de Agricultura e Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara, afirma que “não concorda, não aceita e que nem quer discutir o assunto”. “Em 2017 tivemos o segundo maior superávit [da balança comercial] da nossa história no Brasil. Foram US$ 81,86 bilhões e um dos principais responsáveis por isso foi o agronegócio. Isso mudaria consideravelmente se a lei fosse revogada”, afirma.

As entidades e as instituições ligadas ao setor ainda não calcularam o tamanho do estrago, alegam que se trata de um cálculo complexo de ser feito, mas são unânimes: a revogação poderá ser sinônimo de falência da economia.

Para Ortigara, não restam dúvidas de que as perdas somente para o Estado do Paraná seriam bilionárias. Isso porque 75,3% das exportações paranaenses em 2017 tiveram ligação com o agronegócio. Dos US$ 18 bilhões exportados pelo Paraná, US$ 13 bilhões tiveram origem na agricultura e na pecuária. “Essas condições nos permitiram em 2017 um superávit de US$ 11 bilhões e isso se deu porque aumentou a participação do agronegócio nas exportações. O Estado aumentou, de modo geral, a participação nas exportações nacionais envolvendo todos os produtos e no setor agrícola também. Voltar atrás na lei mudaria totalmente este cenário. É inadmissível”, completou.

Para o secretário, com a revogação, não terá demanda que dê liquidez para os produtos brasileiros. “Tenho sido duro desde o começo quando começaram a discutir a revogação da lei, aliás, quando a lei foi criada muitos governadores diziam que precisava tributar as exportações, a gente não exporta tributos. O exemplo de insucesso bem perto da gente é a Argentina, que passou a tributar e quase foi à falência. Não se salva cofre público tributando o exportador, que achem outro jeito de economizar, cortem gastos, cortem programas, mudem ações e tributem outras coias. Aliás, queremos ser plenamente compensados na hora certa para aquilo que exportamos, temos salvo o Brasil”, desabafa ao lembrar que entre os setores do agronegócio que estariam entre os mais afetados estão: a carne, a soja e o milho.

“É inimaginável este custo. Não queremos e não admitimos tributar em um centavo. Entendemos que o segmento precisa processar mais para agregar valor aos produtos, exportar menos commodities e mais carne, mas tudo o que não precisamos é exportar com tributo”, completou.

Produtores perderiam R$ 26 bilhões por ano

Em nota, o presidente da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná), Ágide de Meneghette, alertou que “o objetivo da medida é aumentar a arrecadação tributária estadual, como uma alternativa ao ineficaz repasse da União por meio do fundo de compensação das exportações”.

Segundo ele, o Sistema Faep/Senar-PR considera que a mudança faz o Brasil regredir na história. “Se for aprovada, a PEC será uma catástrofe ao agronegócio. Nenhum país que queira ser competitivo “exporta” os tributos incidentes sobre seus produtos. E isso principalmente nas commodities, cujas margens são cada vez mais apertadas – principalmente para os produtores”, destacou.

Para Ágide, caso ocorra, a medida fará com que produtores rurais brasileiros tenham perdas de R$ 26 bilhões por ano, ou 5% do VBP (Valor Bruto da Produção) nacional, de R$ 527,9 bilhões, conforme dados levantados pelo Departamento Técnico Econômico da Faep, com base em dados do Agrostat/Ministério da Agricultura.

“O que a emenda propõe é a redução da renda dos produtores rurais. Isso não vai resolver a crise financeira dos estados, que é decorrente de má gestão. É uma medida injusta, que não atende aos interesses do País e onera justamente quem mais gera divisas. O que precisamos é de reformas estruturais que sigam o caminho inverso e que não onerem ainda mais quem produz e mantém o País de pé”, concluiu.