Cotidiano

Sem recursos, estado interrompe projetos de mobilidade em Niterói

NITERÓI – A crise financeira do estado travou os principais projetos de mobilidade para a ligação entre São Gonçalo e Niterói, região onde há o maior fluxo de passageiros entre cidades fluminenses. As obras do BRT (Bus Rapid Transit) da Rodovia Amaral Peixoto (RJ-104) e da Niterói-Manilha e a Linha 3 do metrô não têm qualquer previsão de início. Nesse cenário de incertezas para transporte coletivo, pela primeira vez o número de veículos em São Gonçalo ultrapassou o de Niterói. Em maio, o município vizinho chegou a 287.693 veículos registrados no Detran, enquanto Niterói tem 286.590. Especialistas ouvidos pelo GLOBO-Niterói afirmam que o crescimento do transporte individual e a ausência de modais de grande capacidade podem prejudicar a mobilidade na região.

No fim do ano passado, o governo enviou aos municípios o projeto conceitual para implantação de um BRT que ligaria a estação das barcas de Niterói a Manilha pela Rodovia Amaral Peixoto. O BRT do Leste Metropolitano teria 28 quilômetros de corredor exclusivo de ônibus de grande capacidade e atenderia não só os moradores de Niterói e São Gonçalo, mas também os de Itaboraí e Maricá. Os planos da Secretaria estadual de Transportes previam a partida dos coletivos da Estação Araribóia e uma viagem que iria até o entrocamento com a BR-101, em Manilha, passando pela Alameda São Boaventura, num percurso com 33 estações, cinco delas terminais e de integração. O projeto está pronto, mas a ausência de recursos deixou o estado sem previsão para o início das obras. Já o estudo para a implantação de um BRT na Niterói-Manilha chegou a ser iniciado pela secretaria há dois anos, mas sequer foi apresentado.

A Linha 3 do metrô, orçada em R$ 3,9 bilhões, que promete encurtar a viagem entre Itaboraí e Niterói em 30 minutos, também está sem previsão de se concretizar. A liberação da verba para a obra foi anunciada pelo governo federal em 2013, mas o repasse não aconteceu. O estado mudou o projeto de metrô para um monotrilho de 22 quilômetros com a intenção de baixar os custos da obra. No ano passado, anunciou a construção de um corredor BRT no mesmo trajeto, mas depois voltou atrás e manteve a proposta do monotrilho. A situação agora é de incertezas. De acordo com a Secretaria, técnicos estão desenvolvendo um estudo para definir o melhor modal de transporte neste trecho.

SEM INVESTIMENTO, FUTURO É DE CAOS

Para o professor de transportes do curso de Engenharia Civil da Uerj e UFF, Gilberto Gomes Gonçalves, a paralisação destes projetos é prejudicial para toda a região.

— O sistema viário está esgotado. O metrô não saiu e o BRT também não sai. Essa é uma das regiões com maior fluxo diário de pessoas no país, e isso cria uma série demandas, em Niterói, de trabalho, lazer e serviços públicos. Sem investimento na oferta de transporte público de melhor qualidade agora, podemos chegar em breve a uma situação insustentável de caos no trânsito, com forte impacto no meio ambiente e na qualidade de vida dos moradores da região — alerta.

Mais de 120 mil pessoas enfrentam todos os dias a rotina de deslocamento entre São Gonçalo e Niterói, segundo o IBGE. Estudo divulgado pela entidade em 2015 mostrou que esse é o segundo maior fluxo diário entre municípios do Brasil. Niterói sempre teve mais veículos do que São Gonçalo. A inversão de posição ocorreu nos últimos dois meses, quando foram registrados 2.022 novos veículos em São Gonçalo. Enquanto a quantidade de carros nas duas cidades é bem próxima — 203.423, em São Gonçalo, e 206.842, em Niterói —, o número de motos é bem maior em São Gonçalo (41.714) em relação a Niterói (32.311). Contando todos os tipos de veículos, inclusive ônibus e caminhões, os dois municípios juntos têm 574.283. Deste total, 494.721 (86,1%) são veículos de transporte individual. O doutor em Engenharia de Transportes e professor da UFRJ, Giovani Manso, considera o índice preocupante.

— O crescimento do transporte individual com a ausência de investimento em infraestrutura vai comprometer completamente a fluidez do tráfego nas principais vias de ligação entre as duas cidades, além de poluir ainda mais o meio ambiente. Isso aumenta a possibilidade de acidentes, o trânsito fica muito mais lento, mais infrações são praticadas, desencadeando uma série de problemas. A sociedade vai pagar um peço alto — avalia Manso.

Questionada sobre o andamento dos projetos de mobilidade para a região, a Secretaria estadual de Transportes não informou em que estágio está o planejamento do BRT da Rodovia Amaral Peixoto e da Niterói-Manilha. Sobre a Linha 3 do metrô, sinalizou novamente que pode transformá-lo em BRT. Em nota, o órgão informou que técnicos da secretaria estão trabalhando em um estudo para definir o melhor modal de transporte de alta capacidade para atender a região.