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João Gomes Jr: o tubarão do top 3

O CRÉDITO DA FOTO É OBRIGATÓRIO: Satiro Sodré_SSPress_CBDARIO – João é teimoso e ?diferentão?. Tentou ser jogador de futebol, mas era perna de pau. Largou a natação quatro anos para fazer faculdade de sistema de informação, mas sem fugir das raias. O talento ralo para chutar a bola ganhou nova dimensão na piscina, onde as pernas ajudaram a ganhar impulso e levá-lo para longe de Vitória (ES). Tão longe que ele é o único nadador apontado pela revista americana “Sports Illustrated” como capaz de ganhar medalha.

O bronze indicado pela influente publicação viria nos 100m peito, prova na qual João é terceiro do ranking mundial da Federação Internacional de Natação (Fina). Ele é o único brasileiro classificado entre os três melhores do mundo no ano dos Jogos. Confiante de que o pódio não vai aguar, ele ainda joga uma boia para Felipe França, quinto do ranking na prova.

A MUDANÇA

Natação30-07? Papel é papel, tem que pôr na água, onde dissolve (risos). A revista americana apontou, mas eu tenho certeza que não sou o único da natação do Brasil. O Felipe está bem e vamos nadar para conquistar duas medalhas, para ser um feito ainda mais memorável ? disse João.

A aptidão que faltou para o futebol aumentou o senso coletivo de João em um esporte individual. Quando era criança no Espírito Santo, o hoje nadador deu os primeiros chutes na Associação Esportiva Siderúrgica de Tubarão, em Serra. O nome do animal no título do clube já indicava um caminho ligado à água e, inclusive, João chegou a fazer maratona aquática.

? Pois é. O começo foi assim mesmo, meio por acaso, mas estava escrito, né? Tentei jogar futebol lá, levado pelo meio pai, que era Vasco. Eu treinei durante um ano e não joguei nenhuma partida ? lembrou João.

Apreensiva, a família via o sonho de João virar atleta afundar. As opções, ali mesmo no Tubarão, eram o vôlei, basquete e futebol de salão. Em um dia de sol, o calor bateu e o mergulho na piscina refrescou as ideias.

? Veio a natação. Eu era criança. Acabou virando um vício. Não foi imposição de pai ou de mãe. Mas uma vontade que deu e não passou ? disse João Gomes Jr.

PROBLEMA NO QATAR

Como nos breves momentos de tensão entre a partida no bloco e o toque na água, João precisou superar hiatos que o afastaram das competições em duas ocasiões e em ciclos diferentes. Primeiro, largou um tempo os campeonatos para estudar.

? Em 2004, dei uma segurada de uns quatro anos nas competições e atrasei minha saída de Vitória. Me formei em sistema de informação, porque não me vejo trabalhando em educação física, que é um trajeto natural dos atletas. Sou meio ‘diferentão’ mesmo ? disse.

A segunda pausa veio como um baque ao ser flagrado em exame antidoping em dezembro de 2014, no Mundial de Piscina Curta no Qatar. O teste de positivo para a substância hydrochlorothiazide. A Fina julgou que o atleta teria ingerido acidentalmente e o afastamento terminou em junho de 2015.

No fim da punição, já com quase 30 anos, mais maduro, mas ainda sem ter ido à Olimpíada,João resolveu trabalhar duro na água para não perder outra edição dos Jogos.

? Minha força vem daí. Em 2012, eu fiquei de fora. Depois, trabalhei duro, duro mesmo, e aconteceu o que aconteceu. Mas eu vi como valeu a pena brigar por isto e me alimentei disto na reta final, do sonho de poder representar o meu país em casa ? declarou o atleta.

Por tudo o que passou, João aprendeu a não dar muita bola para o futuro. A não ser quando pensa em recuperar o tempo perdido. No ranking da faixa etária da seleção nacional de natação, ele só perde para Kaio Márcio, 31, e Thiago Pereira, cinco dias mais velho que João.

? Nesta, eu perco para ele (risos). Tenho 30 anos, mas perdi quatro de natação na faculdade, então, esse tempo perdido, eu quero recuperar ? declarou.

Sempre disposto a atender quem pede um autógrafo ou entrevista, João, enquanto está em busca da ?repescagem? dos anos passados, encontrar tempo para falar com todos. De praticamente um desconhecido, passou a ser o nome da natação na reta final dos Jogos. Com a ausência de Cesar Cielo e a renovação em curso na equipe, com a exposição alcançada por João graças à matéria na revista americana, a pressão aumentou. Mas nada que possa causar rugas de preocupação, segundo ele.

? Nada a ver (risos). A minha juventude é alimentada pelo trabalho de estar na piscina diariamente, por eu acreditar nos meus objetivos e nos meus sonhos. Perseverar. Sou teimoso naquilo que eu quero e a vida tem provado para mim que o trabalho duro dá certo ? disse.

Para quem era perna de pau e caminhou até os Jogos do Rio como um azarão, que agora vira favorito, a teimosia guiou uma personalidade irrequieta, capaz de suportar transformações. É possível que João, mesmo com medalha, vire outra coisa, longe das piscinas. Mas não será por falta de talento, como foi com o futebol.