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Advogado de Ana Cláudia vai pedir R$ 1 milhão em indenizações

2011 418197073-2011080786706.jpg_20110807.jpgMarcelo Franklin, advogado da melhor velocista do Brasil, Ana Claudia Lemos, que cumpriu cinco meses de suspensão por causa de exame positivo de doping, afirmou que vai pedir cerca de R$ 1 milhão em indenizações à favor da atleta. E a farmácia que manipulou o remédio, que continha traços de oxandrolona e que foi consumido por ela para tratamento de lesão no joelho, não será a única ré.

? Ela não usou oxandrolona. Ela usou um remédio para o tratamento de uma lesão no joelho e, indevidamente, na manufatura desse medicamento, houve a contaminação com oxandrolona. Ana Cláudia é vítima ? disse o profisisonal do Escritório Franklin Advogados, que conseguiu provar a contaminação do medicamento, por meio de testes tanto no Laboratório da Universidade Federal Fluminense, no Rio, como em outra unidade, acreditada pela Agência Mundial Antidoping (Wada), em Montreal (Canadá). ? Vamos analisar o que ela perdeu de dinheiro, o que deixou de ganhar, quem falou o que não devia, além do tamanho do estrago na imagem dela. Quem agiu com excesso, seja quem for, responderá a processo individualmente. Nunca vi situações tão irregulares no caso da Ana.

Ela afirma que, além do vazamento da informação, entre outras coisas, enquanto a Associação Internacional de Federações de Atletismo (IAAF) decidia se levava o caso a Corte Arbitral do Esporte (CAS), a Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) encaminhou a IAAF documentos que não constavam do processo, produzidos posteriormente, como um laudo de uma associação das farmácias de manipulação, defendendo a associada.

? Isso é irregular porque não nos deu o direito de rebatê-los. A atleta correu sério risco de a IAAF recorrer (a entidade aceitou a punição).

Ana Cláudia voltou às pistas em julho, após cumprir punição. De fevereiro, quando foi conhecido o resultado da amostra A, até o final desse processo, a atleta passou por maus bocados. Se desfez de todo o patrimônio adquirido por meio do esporte, chegou a perder um apartamento, além de sofrer constrangimento. Ana contou que tinha vergonha de sair na rua porque era abordada por estranhos com perguntas sobre o doping. Disse que perdeu quatro quilos (ela tem 1,58m e 56kg) porque não comia nem bebia, além de amigos. Abandonada, chegou a pensar que não disputaria a Olimpíada.

? Você achou que ficaria fora da Olimpíada do Rio?

Fiquei com medo. Só ouvia frases negativas, “muito difícil”, “não vai dar”. Eram tantas notícias ruins nos primeiros quatro meses que eu pensei que sim, que poderia perder a Olimpíada, e que talvez eu nunca mais pudesse correr. No último mês as coisas começaram a melhorar. Acho que aprendi muito com tudo isso. A me colocar sempre no lugar do outro e ter paciência, que eu não tinha muito. Aprendi a ser mais gente, mais humana.

? Quando soube do positivo, você viu o mundo cair ou nem percebeu o que estava acontecendo?

Não me toquei. Recebi uma notificação por email, abri e reli umas três vezes. Depois fui na internet pesquisar o que era a substância porque eu nem conhecia. Fiquei uns três, quatro dias sem entender o que acontecia. Minha consciência sempre ficou tranquila. Mas até descobrir o motivo, o que tinha acontecido, foi um horror.

? Você conseguia dormir?

No primeiro dia não. Depois eu tive alguns problemas de saúde. Voltei a sentir dores no joelho e ainda tive o plano de saúde cancelado! O dinheiro que eu recebia da Marinha do Brasil era para eu comer e me deslocar até o treinamento.

? Perdeu muito dinheiro?

O clube me demitiu, perdi Bolsa Pódio, o auxílio do COB (Comitê Olímpico do Brasil), patrocínios foram suspensos, campanhas que iam sair, não saíram. Todos os meus investimentos que havia feito pensando no futuro usei para pagar meu processo. Ainda continuo devendo, o que é normal. Mas não ia pagar por um erro que não cometi nem que para isso tivesse que me desfazer de tudo. Não fiz o cálculo do prejuízo financeiro. Só queria me livrar desse pesadelo. Tudo o que eu tinha foi embora. Entreguei meu outro apartamento. Isso sem contar que perdi prestígio, passei muitos constrangimentos. Quando se trabalha, se conquista tudo de novo. O pior é o constrangimento. Me senti envergonhada, não conseguia olhar na cara das pessoas. Eu não preciso disso. Sou uma atleta limpa e vou continuar me dedicando.

? O que você deixou de fazer?

De competir, que é o que mais gosto na vida. Eu não ia a lugares públicos porque as pessoas me reconheciam e eu ficava com vergonha. Elas perguntavam se eu era aquela menina que teve problema com doping. Eu respondia sim… Então fiquei muito tempo em casa. Não tinha vontade de sair. No primeiro mês não comi direito. Perdi 4 quilos, perdi de massa. Não estava saudável. Perdi pelo desgaste, tristeza. Não dormia, tinha muita dor dentro de mim.

? Você se isolou?

Quando recebi a notificação saí das redes sociais. Nos primeiros quatro dias eu não vi TV. Com três ou quatro semanas eu não via a internet.

? O que fazia?

Treinava com um colega e descansava à tarde. Pensava nos Jogos Olímpicos, nas pessoas que estavam me ajudando e nas dificuldades que passei na vida. Fazia tiro chorando, xingava… Também assitia filmes de motivação. Fiquei um mês assim. Vi todos os filmes com esse tema que existem! Não tinha vontade de ver nada, do sol, da rua. Trancada mesmo. Até que um dia eu achei que estava na hora de parar de me esconder. E fui me soltando. Ia na feira, mercado, dar uma volta no quarteirão, andar de bicicleta no parque. Coisas que eu não fazia.

? Quem te ajudou?

Minha mãe sempre me mandava mensagem, minha irmã e o meu treinador (Katsuhico Nakaya), que não é muito de demonstrar sentimento, mas pelo rosto dele eu entendia que ele estava sentindo mais do que eu. São sete anos de trabalho, ele é meu pai japonês. Eu acho que fui a pessoa que menos sentiu. As que mais sentiram foram o Basílio (noivo) e o meu treinador. Quando me afastei da mídia e das redes sociais, eles absorviam os problemas e as críticas e de certa forma ficou mais fácil para mim. Pedia para eles não me contarem nada. Quando o bicho estava pegando eu percebia mas não perguntava.

? Chorou muito?

Não pelo doping. Porque sempre tive a consciência limpa. Mas pelas pessoas que se diziam amigos e às vezes eu precisava escutar uma palavra de consolo e não tinha. Olhava a agenda do meu celular e não tinha um amigo para me ajudar… Uma pessoa que eu pudesse falar qualquer coisa. Foi muito difícil. Eu não podia mais sufocar o Basílio e o meu treinador. Eles já estavam com uma carga maior do que eu.

? Quando voltou a competir, na Liga Diamante, você fez o melhor resultado do país. Qual o sentimento?

Ainda não caiu a ficha. Sempre fui muito ansiosa, com a adrenalina a mil antes da competição. E por incrível que pareça nas minhas últimas competições eu estava calma e dormia bem. E a minha psicóloga falou: isso é amadurecimento, você está preparada para fazer o seu melhor.

? Quais as chances de medalha no revezamento 4x100m?

Vou dar a minha vida nesse revezamento. E vamos melhorar os tempos porque estávamos com uma carga de treino muito pesada. Sou uma peça importante mas as meninas também são. Sozinha eu não ganho nada. Quando voltei, no meu primeiro camping, fui muito bem recebida. Estava igual a cãozinho acuado, e não esperava que me acolhessem tão bem. Falamos sobre outras coisas, menos de doping. O time sonha com uma medalha.