Cotidiano

Touros alados assírios são encontrados em região antes controlada pelo Estado Islâmico

65604372_Layla Salih head of Antiquities for the province of Nineveh of whic.jpgMOSSUL ? Entre túneis estreitos, arqueólogos se arriscam pela escuridão das ruínas dos santuários de Mossul, no Iraque, para encontrar, sob a luz de tochas, dois touros alados do Império Assírio, ainda intocados pela passagem destrutiva do grupo terrorista Estado Islâmico (EI) na região. A cena ? que mais parece saída de um filme de ação ? é, na verdade, uma importante descoberta arqueológica feita, na segunda-feira, por especialistas em uma das áreas recém retomadas pelas forças iraquianas na cidade.

As duas estátuas de mármore sobreviveram a ação do EI, que já destruiu outros santuários e artefatos históricos sob alegação de que seriam ícones hereges ou de idolatria. No entanto, apesar de terem sido encontradas em bom estado de conservação, é preciso agir com urgência para que possam continuar a salvo, como adverte Layla Salih, a responsável pelas antiguidades da província de Nínive, no Norte do país.

? O labirinto de túneis foi escavado pelos terroristas bem embaixo da colina onde está a tumba do profeta Jonas (Nabi Yunes). As ruínas deste santuário, bombardeado pelo EI em julho de 2014, pesam sobre essa pequena colina esburacada como um queijo ? explica Salih. ? Temos medo de que isso possa ruir a qualquer momento e enterre os touros. Todos os dias acontecem desmoronamentos.

As autoridades iraquianas descobriram os túneis no final de janeiro, quando tropas do Exército reconquistaram a parte leste de Mossul. Desde outubro de 2016, as forças iraquianas, com auxílio internacional, estão em ofensiva para reconquistar a cidade, considerada um dos últimos bastiões do Estado Islâmico no Iraque. Segundo fontes locais, os terroristas saqueavam os sítios arqueológicos para vender artefatos históricos no mercado negro.

ACHADOS IMPORTANTES

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As duas estátuas encontradas datam do do século VII a.C., como afirma Layla Salih. São peças provenientes, ao que parece, do palácio do rei assírio Assaradão. Esculpidas em mármore, elas representam figuras da arte mesopotâmica, os touros alados ? dos quais só é possível ver a lateral e suas patas. Um pouco mais afastado desse local, historiadores encontraram ainda escrituras em baixo relevo ? usando o alfabeto cuneiforme ? e desenhos de quatro mulheres de frente.

A Assíria, cuja capital é Nínive (no atual Iraque), era um império do Norte da Mesopotâmia. A arte dessa cultura ficou bastante conhecida pelos desenhos de cenas de guerra em baixo relevo.

? Estes achados são muito importantes, nos ensinam mais sobre a arte assíria. Em geral, as peças mostram pessoas de perfil, mas aqui as mulheres estão retratadas de frente ? explica Salih. ? O EI não pode nos roubar essas imagens, muito menos destruí-las.

A especialista, no entanto, afirma que o grupo terrorista já destruiu ou saqueou diversas outras peças arqueológicas, sobretudo as feitas de cerâmica. Em uma casa no leste de Mossul, autoridades informaram recentemente ter descoberto 107 cerâmicas em bom estado, que, provavelmente, foram furtadas do santuário de Nabi Yunes.

65604358_A member of the Iraqi troops walks inside an underground tunnel in .jpgDesde a proclamação, em 2014, de um califado nos territórios do Iraque e da Síria, o Estado Islâmico atacou diversos sítios históricos. As cenas foram até mesmo gravadas em vídeos e divulgadas pela internet, como é o caso de Nimrod ? considerada joia do Império Assírio, fundado no século XIII a.C ? destruído pelo grupo com explosivos e picaretas.

DESTRUIÇÕES MACIÇAS

No cume da coluna de Nabi Yunes, a cena é desoladora. O que foi um dia a elegante tumba do profeta Jonas foi reduzida em ruínas, com os pilares destruídos. Em meio aos destroços, é possível ver placas em mármore branco, pedras de cores vivas, inscrições do Alcorão e estampas geométricas.

Somente na região de Mossul, ao menos 66 sítios arqueológicos foram depredados. Alguns, transformados em estacionamentos. Templos de cultos muçulmano e cristão também foram atacados, e milhares de manuscritos desapareceram, como afirma o vice-ministro iraquiano de Cultura, Qais Rasheed. Segundo levantamento da pasta, mais de 700 peças arqueológicas foram exumadas dos túneis de Nabi Yunes para serem vendidas no mercado negro.

? Agora, é preciso estudar o terreno para estabilizarmos os túneis e evitar desmoronamentos ? conta Salih. ? A situação de segurança da parte leste de Mossul é ainda instável, temos medo de mais ataques do EI.

A partir das colina histórica é possível ver grande nuvens negras subindo dos bairros à oeste da cidade, onde forças iraquianas travam uma forte ofensiva para tentar expulsar as tropas terroristas da região.