
Foz do Iguaçu e Paraná - O presidente Lula (PT) e o ministro da Educação, Camilo Santana, assinaram, na última sexta-feira (31), o Decreto nº 12.706, que autoriza a desapropriação do imóvel utilizado pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), em Foz do Iguaçu. A medida, publicada no Diário Oficial da União (DOU), prevê que o imóvel seja adquirido pela União pelo valor de R$ 65 milhões repassados por Itaipu Binacional, via convênio firmado com a universidade.
O prédio, localizado na Avenida Tarquínio Joslin dos Santos, no bairro Jardim Universitário, abriga há mais de uma década atividades de ensino, pesquisa e extensão da instituição. O decreto autoriza a União a desapropriar o imóvel, que passará a ser de propriedade pública após a conclusão do processo, conduzido em caráter de urgência.

Críticas
A operação, no entanto, levanta debates sobre o uso dos recursos da estatal binacional. Os recursos da Itaipu são provenientes da tarifa de energia paga por cerca de 130 milhões de brasileiros das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Especialistas afirmam que o dinheiro deveria ser destinado à redução das contas de luz, conforme determina o Tratado de fundação da usina.
A reportagem do jornal Valor Econômico questionou por que não foram utilizados recursos do Ministério da Educação (MEC) ou do Tesouro Nacional para bancar a aquisição. Em nota, Itaipu disse que apoiou a desapropriação do imóvel porque a Unila é estratégica para o desenvolvimento do território onde a usina atua, e que a operação foi anunciada em junho de 2025, durante visita do ministro da Educação, Camilo Santana, a Itaipu.
A empresa disse que a atuação socioambiental de Itaipu é prevista na sua missão institucional e respaldada pelas Notas Reversais de 31 de março de 2005 (BR nº 228 / PY nº 01). “A nota reversal já vem sendo observada, portanto, desde esta data por todas as gestões que passaram pela Itaipu, sempre respeitadas às competências do Conselho de Administração, órgão máximo da Itaipu”.
A validade do documento, no entanto, é questionada, já que o Itamaraty informou que ele não foi submetido ao Congresso e não altera a estrutura tarifária da usina. A empresa binacional frisa ainda que o repasse não altera o valor vigente da tarifa de energia pactuada entre Brasil e Paraguai congelada até dezembro de 2026.
Itaipu já financia uma obra da Unila orçada em R$ 752 milhões. A reportagem questionou a universidade sobre se o valor de R$ 62 milhões faz parte deste pacote ou é dinheiro novo, mas não teve resposta.
A instituição de ensino apenas mandou um posicionamento dizendo que a parceria possibilitou o acordo de cooperação pactuado em 2024 com o Unops, organismo das Nações Unidas (ONU) especializado em projetos de infraestrutura, e ocorrem via PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo na área da educação.
“O valor destinado para aquisição do prédio do Jardim Universitário faz parte do convênio Unila – Itaipu para repasse de R$ 65 milhões para investimento em infraestrutura, tendo em vista que a retomada das obras do Campus Arandu não inclui ginásio de esportes e laboratórios de média e alta complexidade, por exemplo”, disse.
Gastos adicionais
Por ano, os gastos adicionais de Itaipu ultrapassam US$ 1,51 bilhão, valor que tem sido alvo de críticas por financiar despesas que vão além da sua principal função: gerar energia elétrica. A usina pertence meio a meio ao Brasil e ao Paraguai, o que significa que cada dólar gasto de um lado precisa ter o mesmo valor gasto do outro.
Mas há um detalhe importante: o Paraguai não consome toda a energia a que tem direito e vende o excedente ao Brasil. Na prática, isso faz com que cerca de 80% de todo o orçamento da Itaipu seja bancado pelos brasileiros, por meio das contas de luz.
“Política do pague dois e leve um”
Ainda, segundo o Valor Econômico, em outras palavras, os consumidores do Brasil vão arcar com cerca de R$ 104 milhões (valor correspondente à sua fatia no orçamento da usina) para que seja possível a compra do imóvel de R$ 65 milhões usado pela Unila. “Essa é a política do pague dois e leve um”, diz o ex-diretor-geral na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Jerson Kelman.
O imóvel que agora será desapropriado pertenceu à antiga Uniamérica. A Unila ocupa o prédio desde sua fundação, há mais de 10 anos, pagando aluguel mensal superior a R$ 426 mil. As negociações para a compra se arrastavam há pelo menos dois anos.
Com o decreto presidencial, a área será incorporada ao patrimônio da União e destinada oficialmente ao uso da Unila, permitindo à universidade investir em expansão, ampliação e melhoria da infraestrutura de ensino e pesquisa.
O Decreto nº 12.706 autoriza a União a invocar o caráter de urgência na desapropriação, com base no Decreto-Lei nº 3.365/1941. O processo será conduzido pelo Ministério da Educação, que indicou a necessidade de garantir a continuidade das atividades acadêmicas da Unila em um espaço próprio e definitivo.