Um mês depois de viver as piores 43 horas de sua vida, Maria (nome fictício) ainda aguarda informações sobre como seu marido está. Ele é um dos cerca de mil presos que estavam dentro da PEC (Penitenciária Estadual de Cascavel) quando, na tarde do dia 9 de novembro, teve início mais uma rebelião na unidade. “Dias antes quando fui visitá-lo ele disse que estava com medo, que o pessoal tava falando que ia virar a cadeia porque daquele jeito que estava, com tanta opressão não dava de viver. Pensei que era mentira e quando vi na imprensa que era verdade, fiquei desesperada”.
Com uma filha de três anos, Maria disse não saber o que fazer. “Pensei em sair correndo e ir lá ver se ele estava bem e quando vi que tinham matado um, meu desespero foi ainda maior porque não sabia quem era”. Só quando o nome de Tiago Gomes de Souza, de 22 anos, foi confirmado pelo Depen (Departamento Penitenciário do Paraná), é que ela ficou mais tranquila.
Agora, o desespero de Maria tem outro viés. Ela, assim como os familiares dos 780 presos que permanecem na PEC, querem saber como de fato eles estão. “A direção diz que eles estão bem, mas como podem estar se estão amontoados em um espaço que nem teto tem? Como estão bem se estão sem roupas, sem colchão pra dormir e até mesmo um banho não tem?”.
Conforme a assessoria de imprensa do Depen e da Sesp (Secretaria de Estado de Segurança Pública e Administração Penitenciária), 500 dos 780 presos já foram transferidos para os cubículos. Os demais permanecem no solário, mas possuem toda assistência prevista, inclusive médica.
Segurança
Mas, muito além das notícias, os familiares querem ver os presos. “Só vou tranquilizar meu coração quando ver que ele está bem, que não está ferido. Muitas pessoas pensam que eles estão ali porque merecem. Sim, cometeram um erro, mas nem um animal vive assim”.
Segundo o Depen, somente quando a vida dentro da Penitenciária voltar ao normal é que as visitas serão liberadas. O motivo é a falta de estrutura e de segurança, que está sendo mantida pela Polícia Militar, que reforçou as equipes e o patrulhamento para que os presos não se rebelem novamente ou mesmo para evitar fugas.
Conforme a Sesp, esse apoio da PM vai prosseguir até que a nova reforma dentro da unidade prisional seja feita.
Reforma
E a segunda reforma em pouco mais de três anos ainda não tem data para começar a sair do papel. Segundo a Secretaria, somente após a finalização do laudo da perícia, que vai apontar tudo o que precisa ser feito dentro da PEC para voltar a capacidade normal, é que será aberta uma licitação.
Cerca de uma semana depois do fim do motim, o secretário de segurança, Wagner Mesquita, anunciou que serão investidos R$ 2 milhões na reforma, mas o valor oficial só será conhecido quando a licitação for aberta.
PEC
Os números da segunda rebelião
Era por volta das 15h30 do dia 9 de novembro quando presos da PEC (Penitenciária Estadual de Cascavel) conseguiram escalar o solário, ultrapassar as cercas elétricas – que segundo o Sindarspen (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná) não estavam funcionando – e renderam um agente penitenciário. Deste horário em diante, e pelas próximas 43 horas, centenas de policiais foram mobilizados para conter a segunda rebelião registrada em Cascavel em pouco mais de três anos.
Já no primeiro dia, a Sesp divulgou que duas pessoas haviam sido mortas pelos presos; mas no dia seguinte a confirmação foi de apenas o assassinato de Tiago Gomes, decapitado pelos detentos.
Além da morte, 31 pessoas ficaram feridas no motim, dentre elas três agentes penitenciários que foram mantidos reféns. Cerca de 200 foram transferidos para a PIC (Penitenciária Industrial de Cascavel) e, emergencialmente para a carceragem da 15ª SDP (Subdivisão Policial) de Cascavel; dois dias depois, os presos da carceragem voltaram para a Penitenciária.
No sábado, 11 de novembro, quando do fim do motim, o diretor do Depen, Luiz Alberto Cartaxo, disse em entrevista à imprensa que a destruição causada pelos presos foi “menor” do que a ocorrida em 2014 e que, já naquele dia, reparos emergenciais estavam sendo feitos para que, no menor prazo possível, os presos voltassem aos cubículos. Para isso, o Estado teria liberado R$ 100 mil.
Nenhum tijolo
Porém, diferentemente do citado pelo Estado, agentes e presos que saíram da unidade após o motim, dizem que durante todo este mês, nenhum sinal de conserto foi visto. “Eu não vi nenhum tijolo lá pra consertar as paredes e nem mesmo telhas para arrumar o telhado. Não sei o que eles estão fazendo nos cubículos, mas reforma com certeza não é”, disse um preso à reportagem de O Paraná.
Já um agente, que por questões de segurança não quis se identificar, cita que o Estado estaria travando uma queda de braço com os detentos. “Ouvimos pelos corredores que a orientação é fazer com que os presos paguem o que fizeram. Se não podem com dinheiro, que fiquem aqui amargando os problemas que eles mesmos causaram. Por isso não há transferências”.
Em entrevista exclusiva ao O Paraná, poucos dias após o motim, o secretário Wagner Mesquita corroborou a mensagem de Cartaxo durante a coletiva de imprensa de que não haveria transferências. “Não é correto fazer transferências, pois isto estimula novas rebeliões. Além do que, não há para onde enviar”.
Visita
Integrantes da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa do Paraná fazem hoje, a partir das 8 horas, uma visita à PEC. O objetivo é verificar as condições dos presos e da Penitenciária.