Policial

Segurança e Economia querem “fechar” a fronteira

Uma das ações é um estudo para reduzir a tributação do cigarro nacional para conter o contrabando

Segurança e Economia querem “fechar” a fronteira

Foz do Iguaçu – Será no oeste do Paraná o projeto-piloto de segurança na fronteira brasileira. Acordo firmado ontem entre o governador Carlos Massa Ratinho Junior e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, prevê começar por Foz do Iguaçu a integração das forças estaduais e federais de segurança com vistas à proteção nacional.

Moro estima que o cronograma e o plano de ação devem ser apresentados em 45 dias.

Além do combate ao tráfico de drogas, armas e munições, uma frente de trabalho será criada para endurecer regras ao contrabando de cigarros.

A notícia é boa, mas longe de ser inédita. Apesar da alegação de que o Paraná seria o primeiro estado brasileiro a receber um centro de integração para cuidar da fronteira, um trabalho já vinha sendo desenvolvido pelo governo federal no passado, o Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras), cujas ações ficaram restritas ao Mato Grosso do Sul, de Mundo Novo a Caracol, em 650 km de fronteira com o Paraguai. Também chamado de projeto-piloto, o monitoramento era realizado com auxílio de sistema de sensores, decisores (softwares) e atuadores (pessoal) com um projeto cuja proposta era empregar tecnologia nacional de ponta, com radares fixos e móveis, antenas (infovias), além de equipamentos como sensores óticos, binóculos de visão termal e câmeras de longo alcance. As informações captadas pelos postos de vigilância tinham como missão de chegar em tempo real nos centros de operações, sendo interpretadas e usadas como suporte para a tomada de decisão e vinha sendo operado pela 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada. A previsão ali era para aperfeiçoamentos que poderiam ser feitos no projeto com o apoio de um satélite de sensoriamento de imagens, a partir do ano de 2023. Não se sabe o resultado disso tudo.

Já no acordo firmado ontem entre Ratinho e Moro, em Brasília, ficou acordado que a implantação desse novo piloto envolve a criação de um grupo de trabalho de órgãos estaduais e federais com junção de esforços de inteligência para medidas preventivas e ostensivas. “É um projeto que interessa bastante ao Paraná, que já vem fazendo um trabalho de integração e inteligência entre as forças de segurança”, disse o governador. “É muito importante que ele comece por Foz do Iguaçu, que faz fronteira com dois países e é porta de entrada para coisas boas e ruins”.

Entre os envolvidos estão governo do Estado, Secretaria da Segurança Pública e Administração Penitenciária, Polícia Federal, Receita Federal e Polícia Rodoviária Federal, entre outros órgãos que definirão as ações de segurança na área e as estratégias do centro para coibir crimes como tráfico de drogas e contrabando.

O que já existe ou existiu

 

Desde 2012 o Estado atua no enfrentamento aos crimes transfronteiriços com a implantação do BPFron (Batalhão de Polícia da Fronteira) com base em Marechal Cândido Rondon e unidades em outros municípios.

Projetos não faltam. O que falta é estrutura, especialmente de pessoal.

Somente a Polícia Federal estima que seriam necessários cerca de 2 mil novos agentes para dar conta da demanda.

Além do bilionário mercado de contrabando de cigarros e eletrônicos, as principais facções criminosas brasileiras se utilizam da fragilidade da fronteira e de um esquema de corrupção para entrar com drogas, armas de todos os calibres e munições que abastecem o crime por todo o Brasil. Não por acaso, grandes facções como PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) têm bases na região, de onde operacionalizam grandes esquemas criminosos.

Hoje a região de fronteira do Paraná com o Paraguai, considerando o entorno e municípios com até 150 quilômetros de distância da fronteira, contam com delegacias da Polícia Federal em Foz do Iguaçu, Guaíra e Cascavel. Além disso, há as delegacias da Polícia Rodoviária Federal e da Receita Federal de Cascavel e de Foz do Iguaçu.

Vant engavetado

Enquanto anunciam novos projetos, outros vão acumulando poeira. Importante aliado que parou de operar no combate ao crime organizado corresponde ao Vant (Veículo Aéreo Não Tripulado), aeronave que trazia importantes subsídios para apreensões e prisões operou dois anos e depois foi desmontada e guardada numa base em São Miguel do Iguaçu onde ficou nos últimos quatro anos. No início deste ano, a aeronave passou para a responsabilidade da Força Área Brasileira, mas ninguém sabe que fim foi dado nele.

Novas ações

Nesta nova empreitada no enfrentamento ao crime organizado, o ministro Sérgio Moro estabeleceu prazo de 45 dias para definir o cronograma e os planos de ações, além da seleção dos órgãos e agentes que irão compor o centro de integração. “O nosso objetivo é que o projeto aconteça o quanto antes. Vamos fazer esse projeto-piloto no Paraná, para ver o que vai ou não funcionar, e estender essa experiência para outros estados no decorrer da gestão”, explicou o ministro.

O Paraná tem 450 quilômetros de fronteira seca e aquática com o Paraguai e a Argentina, além de fazer divisa com os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. Por todo o Brasil, são 17 mil quilômetros de limite terrestre com nove países. A tríplice fronteira é hoje importante entrada de drogas e armamento pesado que alimenta especialmente o crime organizado no eixo Rio-São Paulo.

Combate ao contrabando de cigarros

Dentro do processo de enfrentamento ao crime na fronteira, uma importante frente estará focada na criação de um grupo de trabalho com a missão de avaliar a redução da tributação sobre cigarros fabricados no País. A intenção é “diminuir o consumo” de produtos estrangeiros “de baixa qualidade”. A iniciativa resulta do entendimento de que o crime organizado é financiado pelo contrabando em alta escala de tabaco no Brasil.

O cigarro está entre os produtos com mais imposto no Brasil, com carga tributária de aproximadamente 80%. No Paraguai, de onde vêm metade do cigarro consumido no Brasil, a carga tributária é de 13%.

Somente na região oeste do Paraná, a estimativa é de que existam pelo menos 30 quadrilhas de grande e médio portes que atuam no contrabando de cigarro, segundo a Polícia Federal, além de dezenas de quadrilhas formiguinhas, que voltaram a se expandir.

O mercado movimenta cerca de R$ 4 bilhões ao ano apenas no oeste, mas o rombo em escalas nacionais é ainda mais preocupante. Somente a evasão fiscal, com impostos sobre o tabaco que deixam de ser pagos com produtos contrabandeados, passa de R$ 11,5 bilhões.

No fim do ano passado uma pesquisa realizada pelo Ibope, encomendada pelo Etco (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial) revelou que 54% dos cigarros consumidos no Brasil têm origem ilícita. A pesquisa revelou ainda que somente no ano passado foram consumidos 106,2 bilhões de cigarros no Brasil sendo que 57,5 bilhões deles vieram do mercado ilegal, geralmente contrabandeados do Paraguai (metade). Os números representaram um aumento de 6% se comparados aos registros de 2017, por exemplo.

Reportagem: Juliet Manfrin com assessorias