Opinião

Coluna Direito da Família - O Leão em casa

O LEÃO EM CASA
Dra. Giovanna Back Franco
Professora universitária, advogada e mestre em Ciências Jurídicas

O Estado é o rei da selva, o manda chuva da sociedade, que determina as regras e aplica as leis, com as consequentes punições. Cotidianamente, o Leão, como na fábula de Esopo, decide se esmaga o cidadão ou não, com seus tributos e suas cobranças impiedosas. Todos os dias, porém, são esses mesmos cidadãos que salvam o Leão da bancarrota, dando-lhe quantias vultosas, ainda que não voluntariamente.
Os impostos são valores devidos e obrigatórios para a manutenção da funcionalidade dos serviços públicos e coletivos. Eles são gerados a partir de relações financeiras, ainda que entre sujeitos da mesma família. O imposto de renda tem seu fato gerador na renda, ou seja, no ganho do indivíduo.
Em algumas relações, porém, existe a bitributação na prática. O Leão morde em dobro, sai de barriga cheia, e ao povo restam as migalhas e, eventualmente, a violação de direitos. Até o ano passado, havia a tributação do imposto de renda sobre os alimentos, sendo que, como as mulheres, como regra, os recebem, em nome dos filhos, acabavam penalizadas em seu direito de igualdade ou isonomia.
Para o Supremo Tribunal Federal, não havia ganho de renda de quem recebia, visto que é o dever de sustento não realizado diretamente, mas mediante pensão alimentícia. Assim, quem paga a pensão será tributado, porém não se aplica a bitributação, na medida em que esta ofende os valores constitucionais, como o melhor interesse da criança.
Dessa forma, o Leão está proibido de morder essa fatia de quem recebe, e ainda tem o dever de restituir quem indevidamente pagou, dentro do prazo prescritivo, pois a decisão tem efeito retroativo.
Nos últimos dias, outra decisão ganha destaque (embora ainda haja prazo de recursos): a vedação de cobrança de imposto de renda sobre o ganho de capital decorrente da valorização de imóveis doados. Com isso, os doadores, que não detém acréscimo patrimonial com a doação, não devem mais pagar o imposto, que será cobrado apenas do donatário (quem recebe), juntamente com o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). Entendimento diverso, seria bitributação, o que não é admissível.
Tendo em vista que a proteção à família é pilar constitucional, é imprescindível que se compreenda que a extensão das entidades familiares alberga não só a família derivada do casamento e que o tratamento isonômico impactaria nas isenções e deduções de cálculo. Tema esse que é melindroso; ao passo que a família trata de subjetividades, como o afeto, o direito tributário é objetivo e restrito às disposições legais, não sendo impactado por convenções particulares.