Mais de 1 bilhão de pessoas no mundo são deficientes visuais por falta de óculos, tratamento descontinuado do glaucoma e adiamento da cirurgia de catarata. Essa é uma das revelações do primeiro relatório sobre visão lançado pela OMS (Organização Mundial da Saúde). O levantamento revela que de todas as alterações visuais que podem ser corrigidas com óculos, a miopia, dificuldade de enxergar à distância, é a que mais cresce globalmente.
A estimativa é de que em 2020 atinja 2,6 bilhões pessoas. Apesar do envelhecimento da população mundial, o número de míopes supera o de pessoas com presbiopia, dificuldade de enxergar próximo após os 40 anos que deve atingir 1,8 bilhão de pessoas no ano que vem.
O risco das telas
Para os pesquisadores da OMS, o excesso de telas e a falta de atividade ao ar livre são os principais gatilhos desse avanço da miopia. Um estudo feito pelo oftalmologista Leôncio Queiroz Neto com 360 crianças com idade de 6 a 9 anos mostra que o uso intensivo do computador e outras tecnologias aumentou para 21% a dificuldade de enxergar à distância, contra a prevalência de 12% da miopia nessa faixa etária.
O médico explica que, nas crianças que usam muito as telas digitais, a dificuldade de enxergar à distância resulta do excesso de esforço visual para perto, que provoca a perda de flexibilidade dos músculos ciliares e a diminuição da amplitude de foco do cristalino. “Isso acontece porque até a idade de oito anos a visão está em desenvolvimento”, explica. No início, a dificuldade de enxergar à distância relacionada às telas pode ser revertida com descanso a cada hora de uso. O problema, pondera, é que muitos pais não conseguem mudar o hábito de crianças que praticamente já nasceram com um celular na mão.
Mais ar livre
O oftalmologista Leôncio Queiroz Neto adverte que as crianças devem ser estimuladas a brincar ao ar livre para reduzir o risco de desenvolver miopia. Alguns estudos, ressalta, mostram que as atividades externas também desaceleram a progressão. O oftalmologista acredita que isso está relacionado ao cumprimento da luz ultravioleta que faz uma reticulação nas fibras de colágeno da esclera, parte branca do olho, e por isso dificulta o crescimento do globo ocular característico da alta miopia.
“O mais preocupante é a progressão da miopia” afirma. Isso porque, explica, a partir de 6 graus aumenta a chance de descolamento da retina, glaucoma e degeneração macular que podem levar à perda definitiva da visão.
O assunto ganhou tamanha projeção na saúde pública que deve ser discutido no 64º Congresso Brasileiro de Oftalmologia que acontece no ano que vem em Campinas, quando o Instituto Penido Burnier, primeiro hospital oftalmológico do Brasil, comemora 100 anos de atividade médica no País.
Terapias combinadas
A boa notícia é que a combinação do colírio de atropina a 0,01% e lente ortoceratológica é mais eficiente que o uso em separado dessas duas terapias no controle da progressão da miopia. Essa é a principal conclusão de um estudo desenvolvido na Jichi Medical University (Japão) que acaba de ser apresentado no congresso de oftalmologia promovido pela AAO (American Academy of Ophthalmology) nos EUA.
O oftalmologista Leôncio Queiroz Neto afirma que o colírio de atropina normalmente é usado para dilatar a pupila durante exames oftalmológicos. O efeito sobre a miopia está relacionado ao bloqueio de receptores da retina coligados à evolução do vício refrativo, salienta.
Já as lentes ortoceratológica, explica, são usadas durante a noite para achatar a superfície da córnea. Por isso, alteram o foco periférico do olho.
O estudo japonês acompanhou por dois anos 80 crianças míopes na faixa etária de 8 e 12 anos que usaram as duas terapias durante três meses. Nas que tinham miopia acima de 6 graus a combinação dos dois tratamentos diminuiu em 28% a progressão. Nas que tinham grau baixo e moderado a redução foi de 38%. O oftalmologista destaca que o uso dessas terapias é desconfortável, mas em crianças que tem aumento de 0,5 grau a cada seis meses é melhor prevenir o risco de perda da visão.