Esportes

Acendimento da pira foi o ponto alto da cerimônia de abertura

VANDERLEI-PIRA.jpgRIO – Após recusa de Pelé, ex-maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima, bronze em Atenas-2004, teve a honra de acender a pira olímpica, uma homenagem ao atleta que foi agredido durante prova na Grécia, perdendo o ouro.

Não foi qualquer desfalque. Imagine que, minutos antes de uma decisão de campeonato, Pelé, eleito o melhor atleta do século XX, machucado, sai de cena. Foi o que aconteceu nesta sexta-feira, quando o esportista mais famoso do mundo informou que não poderia participar da cerimônia de abertura do Jogos Olímpicos. A tarefa ficou para outro ídolo, não tão conhecido, mas que carrega no corpo o espírito olímpico: o ex-maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima, medalhista de bronze na Olimpíada de Atenas-2004, atropelado pelos braços de um torcedor fanático e detentor da maior honraria olímpica: a medalha Pierre de Cobertain.

O acendimento da pira foi o ponto alto da festa. Foi mais ou menos como se apaixonar. Se o público já estava encantado com a cerimonia, com todas suas referencias, canções e alusões, com toda sua gente a dar as mãos, a tirar fotos, foi surpreendido com o momento da pira e a queima de fogos que encerrou a festa.

Recém-operado do quadril, Pelé não teria condições físicas de viajar ao Rio para acender a pira, no momento mais marcante da festa, aquele guardado a sete chaves. Aos 75 anos, o maior jogador de futebol do mundo, não repetiu Muhammad Ali, que teve a honra nos Jogos de Atlanta-1996. A missão ficou para o homem mais falado de Atenas.

UM LONGO CAMINHO

Apostas aqui e ali em relação ao substituto e eis que o fogo olímpico surge nas mãos do ex-tenista Guga, que correu do lado de fora do estádio e entrou no campo bastante emocionado. Ele passou a tarefa para a ex-jogadora de basquete Hortência, que correu alguns metros até chegar a Vanderlei, que pacientemente esperava ao pé de uma escada. Ele subiu, erguendo a tocha olímpica, e chegou até a pira, uma espécie de caldeirão.

Após acendê-lo, ficou olhando o maior símbolo dos Jogos subir e subir ainda mais até encontrar uma escultura do artista americano Anthony Howe, que representa o sol. A escultura emoldurou a pequena chama e o cenário do Cristo Redentor, com o contorno do relevo característico da cidade, completou o cenário. Nesse momento, Vanderlei fez o aviãozinho, eternizado em Atenas-2004, quando terminou a maratona em terceiro lugar.

Vanderley ficou em terceiro lugar na Grácia mesmo após ter sido agarrado pelo ex-padre Cornelius Horan, que invadiu a área de prova da maratona e o parou propositalmente, Faltavam apenas sete dos cerca de 42 quilômetros da prova. O brasileiro liderava e, ajudado pelo grego Polyvios Kossivas, que saiu da plateia para ajudá-lo, prosseguiu na competição e conseguiu chegar ao pódio.

Uma homenagem e tanto para o maratonista que sete meses antes dos Jogos de Atenas sofreu um acidente de moto, quebrou a clavícula esquerda, e por pouco não desistiu de viajar à Grécia. Suas duas primeiras semanas de preparação foram feitas com o braço imobilizado ? o que fez o ?aviãozinho? pelo bronze ser “torto”. Filho de lavradores e retirantes nordestinos que fugiram da seca, antes de correr pelo mundo, Vanderlei trabalhou como boia-fria.

A escultura, em prata, foi o ponto alto da festa. Ela ganhou a acor dourada, reflexo do fogo. Se abriu e fez movimentos circulares. Ao ser colocada em movimento formam-se espirais que representam a vida.

Assim como outras obras famosas de Howe, em cidades como Dubai, a do Rio manteve os movimentos circulares. Quase sempre em metal e movidas pelo vento, suas peças normalmente são estudadas em modelos 3D. Um estilo de trabalho particular que o artista, nascido em Salt Lake City, começou a desenvolver no fim dos anos 1980.

Vanderley, que ganhou a medalha Pierre de Coubertin – entregue pelo Comitê Olímpico Internacional para exaltar o alto grau de esportividade e o espírito olímpico demonstrado por um atleta durante a disputa dos Jogos -, se emocionou ao acender o símbolo olímpico, que durante toda a cerimônia estava escondido. Assim como a escultura, atrás de panos pretos e da parede de caixas, num canto do estádio, que se transformaram durante toda a cerimônia em cenários.

O artista americano, que tem surpreendido o mundo com esculturas cinéticas, cheias de efeitos visuais produzidos através dos movimentos de sua estrutura, caprichou no símbolo que emoldurar a pira todos os dias de competição, até o encerramento. Intencionalmente pequena, a pira de baixa pressão atende aos desafios de reduzir a queima de gases poluentes propostos pela organização.

Após o término da cerimônia, o fogo olímpico será levado do Maracanã até o Boulevard Olímpico, no centro do Rio. Ali uma segunda pira será acesa para que todos os visitantes possam vê-la de perto. A pira-escultura ficará no centro de um espelho d?água em construção em frente às tombadas Igreja da Candelária e Casa França-Brasil, construídas entre o final do século XVIII e início do século XIX.

Essa é a primeira vez que duas piras são acesas nos Jogos Olímpicos. E a festa só começou. (Colaborou: Mariana Filgueiras).