BRASÍLIA – O ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, contratou de forma oculta seu assessor no PRB, Diego Polachini, que é filiado à legenda desde 2011. Pereira presidiu o partido até virar ministro. O assessor atuou na campanha do deputado Celso Russomanno à prefeitura de São Paulo em 2012 e era auxiliar direto de Pereira no partido. Polachini passou a ocupar uma função de confiança na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), subordinada ao ministério, mas desempenha o papel de assessor especial do gabinete da pasta. A ABDI paga um salário de R$ 19,4 mil ao assessor. Os pagamentos da agência não ficam disponíveis no Portal da Transparência do governo federal.
Essa triangulação, que oculta contratações do sistema de transparência do governo, também foi praticada por ministros da Indústria do governo da presidente afastada Dilma Rousseff. A ABDI chegou a abrigar cabos eleitorais da campanha dela recebendo salários de R$ 20 mil em média. O GLOBO mostrou em fevereiro último que a ABDI, quando era presidida pelo petista Alessandro Teixeira, próximo a Dilma, abrigou militantes da campanha à reeleição, dobrou o valor das diárias e empregou a tia de uma ex-miss bumbum como secretária, com um salário superior a R$ 19 mil. A ex-bumbum é mulher de Teixeira.
O ministro é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus e foi nomeado no cargo pelo presidente interino Michel Temer no mesmo dia da admissão do processo de impeachment, em 12 de maio. Já a ABDI passou a ser presidida por um ex-companheiro de partido de Pereira, Luiz Augusto de Souza Ferreira, que foi filiado ao PRB de 2007 a 2013 e que também atuou na campanha de Russomanno.
A ABDI é uma caixa-preta, que recebe recursos públicos, mas tem natureza privada. A agência não divulga salários nem diárias pagas. Desde que chegou ao cargo, no fim de junho, o novo presidente tem recebido adiantamentos de recursos para eventos em São Paulo, cidade onde mora. Parte dos eventos tem relação com o empreendedorismo, área de atuação de Ferreira.
COMÉRCIO NA CHINA
À frente da ABDI, ele vem adotando um programa de ajuste na agência e já demitiu 36 funcionários ? 15 do quadro efetivo, 10 terceirizados, 6 comissionados, 3 estagiários e 2 temporários. Ferreira convocou cinco funcionários efetivos que estão de licença ? sem remuneração ? para que se apresentem e sejam demitidos. Um deles é Márcia Oleskovicz, mulher do prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT). Ela está de licença desde outubro de 2010.
No último dia 8, Ferreira editou resolução diminuindo os valores das diárias internacionais da agência de US$ 700 para US$ 400, nos casos das viagens para as principais cidades da América do Norte e da Ásia, e de ? 700 para ? 400, em viagens para as principais cidades da Europa e da África. O assessor especial do ministro lotado na ABDI foi um dos últimos beneficiários com diárias nos valores mais altos, estabelecidos ainda na gestão de Alessandro Teixeira.
Três dias antes de as diárias serem reduzidas, ele embarcou para o encontro dos ministros de Comércio do G-20 na China, que durou entre os dias 5 e 12, segundo o ministério. No total, o assessor recebeu em diárias para esta viagem ? 3.250,00 ( cerca de R$ 11,1 mil), dinheiro equivalente a cinco diárias.
A comitiva à China incluiu o ministro e dois servidores da pasta. Ministros de Estado, por exemplo, recebem de diária para viagem à China, podendo optar por US$ 300 ou ? 300. Assim, as diárias pagas a Pereira não ultrapassariam ? 1,5 mil, levando em conta os dias pagos a seu assessor. Os pagamentos ainda não estão disponíveis no Portal da Transparência.
Um inquérito do Ministério Público (MP) de São Paulo investiga desde 2014 ?má aplicação de recursos públicos? na destinação de verba da Secretaria Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo à Associação Crédito Popular Solidário ? São Paulo Confia, uma entidade de microcrédito sem fins lucrativos. Ferreira ainda aparece nos registros da Receita Federal como presidente da instituição, função exercida desde 2012. Até julho de 2013 ele foi supervisor geral do Trabalho na mesma secretaria da Prefeitura de São Paulo.
OUTRO LADO
Por meio da assessoria de imprensa, Pereira disse que a indicação de Polachini foi a única encaminhada via ABDI. ?O profissional está alocado no ministério, por força do acordo de cooperação técnica assinado entre a agência e a pasta em 2012. Polachini, para fazer parte da equipe da ABDI, encerrou seu vínculo empregatício com o PRB e se mudou de São Paulo para Brasília. Todos os atos estão dentro da legalidade?, diz a pasta.
O encontro dos ministros de Comércio do G20 na China foi o motivo da viagem internacional, que durou entre os dias 5 e 12, segundo o ministério. ?A pedido do presidente Temer, o ministro Marcos Pereira liderou a comitiva brasileira, formada por mais três técnicos. Por isso, todas as passagens foram compradas com pouca antecedência. Com exceção do ministro, todos viajaram de classe econômica. A prestação de contas de Polachini foi realizada e encontra-se em análise no sistema da ABDI.”
O presidente da ABDI, por meio da assessoria, disse que não recebe diárias para ir a São Paulo, mas ?ajuda de custo para alimentação e deslocamento?. Ele disse não ter sido notificado sobre o inquérito em curso no MP e afirmou que o Tribunal de Contas do Município ?aprovou por unanimidade as contas e julgou regular a aplicação dos recursos?. Ferreira disse ter se licenciado da presidência da organização de microcrédito semanas antes de assumir a presidência da ABDI.