PARATY ? Compreender o passado para iluminar o presente e fazer escolhas diferentes no futuro. Esse foi o tom da mesa ?Breviário do Brasil?, que reuniu o escritor e ensaísta americano Benjamin Moser e o historiador britânico Kenneth Maxwell. na manhã desta sexta-feira, na Tenda dos Autores da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Provocados pela mediadora Lilia Schwarcz, os dois pontuaram suas falas com críticas ao presidente interino Michel Temer e à situação política atual do Brasil. Ao fim da mesa, Moser e Maxwell foram ovacionados pelo público.
O ensaísta lembrou do historiador Capistrano de Abreu, que escreveu que o jaburu era a ave que melhor representava o Brasil, com sua estatura avantajada, pernas grossas e asas fornidas. Um símbolo do nosso atraso.
? Estamos vivendo uma tristeza muito forte hoje. O jaburu voltou e cruzou as pernas ? disse o ensaísta, que lança na Flip o livro ?Autoimperialismo? (Planeta). ? No Brasil, sempre houve um desejo de assassinar a história. Esse movimento recebeu diversos nomes ao longo do tempo. Na época de Lima Barreto, por exemplo, era saneamento. Aqui, desenvolveu-se uma maneira de olhar para o país que nega o passado ao invés de tentar entendê-lo.
Maxwell contou que seu primeiro contato com a história do país foi numa aula que assistiu de Sérgio Buarque de Holanda. Na sala, sentado num canto, estava um jovem que ele achou muito bonito. Era o adolescente Chico Buarque. Autor de estudos sobre a Inconfidência Mineira e o Marquês de Pombal, o historiador defende teses polêmicas, como a que o Brasil de 1822, quando houve a independência, tinha quadros melhores do que os Estados Unidos ao se libertar da Inglaterra.
? Os jovens da elite brasileira eram educados na Universidade de Coimbra, em Portugal, que tinha sido reformada pelo Marquês de Pombal e era o centro mais avançado da Europa. O Brasil não teve capacidade de adotar as ideias de José Bonifácio.
Para Maxwell, o Brasil pode estar vivendo o fim de um ciclo político iniciado com a derrocada do regime militar. Contudo, ele acredita que o mundo inteiro vive um processo de transição cujo destino não está claro.
? Eu estou preocupado com o impasse político no Brasil. O impasse também atinge os Estados Unidos, a Europa, houve o Brexit. Está acontecendo uma transição global profunda, mas não sabemos ainda para onde.
Já no fim da mesa, Moser fez uma crítica dura a um dos principais intérpretes do Brasil, Gilberto Freyre, ao responder uma pergunta sobre a particularidade da questão racial no Brasil. Ele criticou ainda o ministério de Temer, composto por homens, brancos e mais velhos. Para ele, Freyre criou uma tese para acobertar a desigualdade racial no Brasil.
? Freyre deu uma ideologia estrutural para defender que o Brasil deu certo na questão racial. Mas não tem negros aqui ? disse o ensaísta e, em seguida, dois negros se levantaram. ? Ah, tem dois! Nossa, agora sim deu tudo certo. A responsabilidade dos intelectuais é ver os erros do passado e aprender.