
-Tenho mais medo das cobras do que dos hipopótamos. É como se fosse um mascote do povo- afirma Diego Alejandro Rojas, dando uma gargalhada.
Com uma lanterna, o adolescente ilumina o animal que pasta placidamente em um gramado próximo a algumas residências.
Na escuridão, só é visível por causa dos olhos, que quase se confundem com vaga-lumes.

Alguns animais se aventuram, inclusive, a ultrapassar as portas do complexo.
– Hoje saí para treinar futebol e, na frente do prédio, tinha um hipopótamo- conta Lina María Álvarez, de 12 anos, observando, tranquila, o alambrado instalado para conter a fuga dos paquidermes.
A comerciante Rosa González, de 57 anos, recorda quando topou com um dos hipopótamos do traficante em junho passado.
-Nós nos trancamos em casa e o vimos passar. Foi a primeira vez que vi um deles nesta rua- afirmou.
PARAÍSO

David Echeverri, biólogo de Cornare, uma corporação regional de proteção ambiental que dispõe de fundos provenientes de bens confiscados de narcotraficantes, conta que “entre 1982 e 1984 quatro hipopótamos foram comprados de um zoológico da Califórnia” por Escobar.
Deixados à própria sorte na fazenda abandonada depois que Escobar foi morto pela polícia, em 1993, os hipopótamos se multiplicaram.
A maioria dos animais (flamingos, girafas, zebras, cangurus) foram vendidos a zoológicos, mas os hipopótamos ficaram.
– É o maior grupo de hipopótamos do mundo fora da África- ressalta Echeverri.
– Reproduzem-se a cada dois anos, com apenas um filhote. Aqui para eles é um paraíso. Não têm predadores. Estão muito mais tranquilos que em seu habitat natural- acrescenta Jairo León Henao, um veterinário que trabalha com Echeverri.
Em Doradal muitos estão maravilhados.
– Se uma pessoa não mexer com eles, são muito mansos. Estamos acostumados. No povoado estes animais são muito respeitados- afirma com tom afetuoso Mayerli Copete, de 21 anos.
BIODIVERSIDADE
Mas o número crescente preocupa os especialistas. “Nós calculamos que existem cerca de 35. Mas é difícil contar, porque quando eles veem você, mergulham e surgem em outro lugar”, diz Echeverri às margens da lagoa da fazenda onde, sob o sol da manhã, alguns mostram o nariz e as orelhas.
– Eles vêm e vão. Podem andar de três a cinco quilômetros à noite, passam pela ravina de Doradal até o rio Magdalena. Alguns apareceram até em Puerto Berrio, cerca de 150 km daqui- disse Henao.
Desde o ano passado, uma cerca foi instalada no perímetro preferido dos hipopótamos: 25 hectares no coração da propriedade.
-A ideia é fechar a área com pedras, arame e limoeiros espinhosos- indicou Echeverri na frente da cerca que, em 18 meses, deve evitar fugas destes mamíferos que podem medir até três metros de comprimento e dois metros de altura.
Além do perigo de ataques, “representam um risco para a biodiversidade, deslocando a fauna nativa, como o peixe-boi, que já está em vias de extinção, ou a lontra, porque ocupam o mesmo espaço”, diz o especialista.
Portadores de doenças que podem ser fatais para o gado, também são “um incômodo para a pesca, e poluem os rios porque defecam na água”, acrescenta.
COMO NA ÁFRICA
– Até agora, felizmente não atacaram ninguém- afirma o veterinário Henao, que aposta na esterilização para controlar a população, uma opção complicada.
– Não é tão fácil porque não se diferenciam os machos das fêmeas. Os testículos estão dentro, assim é preciso deitá-los e apalpar- explica.
Além das dificuldades, a cirurgia é cara. Apenas quatro foram castrados até hoje.
Os hipopótamos podem viver até 60 anos. Para Echeverri, a solução é assegurar uma boa alimentação “para que não se estressem e não saiam” da área estipulada. Além do capim natural, existe a previsão de distribuição diária de 200 kg de forragens.
Os hipopótamos são uma atração para os visitantes da Fazenda Nápoles, expropriada pelo Estado e repassada parcialmente a investidores privados, que fundaram um parque temático de 400 hectares.
A população local não esconde o fascínio.
“Parece que estamos na África. Somos privilegiados”, comenta Clara Núñez, dona de casa de 48 anos.