Ele entrou sorrateiro no pátio da escola com o corpo quase colado ao meu. Andar desajeitado e olhar inseguro, ainda reclamava da etiqueta da camisa nova, assim como o tênis, de repente apertado, e a mochila, essa sim um estorvo com quase metade de sua altura e que precisava ser puxada.
O momento era importante, o prédio era enorme, um desconhecido de paredes altas e brancas que mostrara apenas seu lado mais lúdico, pipoca e muitos sorrisos a quem, meses antes, brincou no espaço colorido e vibrante, lugar bacana escolhido pelos pais para iniciar sua vida de "gente grande".
Do lado do menino que tentava em vão arrancar a etiqueta em sua nuca, uma mãe pouca coisa mais segura infundia certa naturalidade à própria voz, uma paupérrima tentativa de convencer a si mesma de que estava vivendo um momento maravilhoso e exclusivo, afinal, não é todo dia que se leva, pela primeira vez, o filho para o primeiro ano. Pudera estar ao lado dele no que será sua sala de aula e advertir a todos o que vai acontecer se ele for magoado em minha ausência, esta certa e soberana nos próximos meses. Mas não há espaço para instintos primitivos quando seu filho ingressa no ensino fundamental, isso porque não tem como carregar 30 quilos de criança que, dizem os especialistas, já precisar caminhar com seus pés, os mesmos que o levaram a reconhecer timidamente o espaço onde ficará todas as manhãs.
Como todo filhote de mamífero, de mim meu filho não se apartou por muito tempo e à base segura voltava de vez em quando, certeza de que não importava o imprevisto, o socorro estava ali, bem sentadinho e à sua inteira disposição, auxílio que pediu quando o garoto maior anunciou que no escorrega chegara primeiro. Ao meu ouvido, um triste sussurro: “aquele menino não gostou de mim, mãe…”.
Recomendado ou não, abracei meu garoto mais uma vez. "É da vida, filho, é coisa de gente grande”, situação em direção a qual ele daria o primeiro passo dali a poucos segundos, momento anunciado por um sinal sonoro – de extremo mau gosto, por sinal – ruído que teve o poder de apertar meu estômago e dizer que ter chegado a hora da criatura mais importante da minha vida se despedir e seguir sozinho seu caminho. Mães, acabou, favor sair pelo portão, disse a monitora. Com as unhas ainda tentei reter a ponta dos pequenos e gordinhos dedos que escorregaram do afago das minhas mãos. “Vai me buscar, mãe”? disse ele já a dois passos de distância. Fiz que sim com a cabeça. Na verdade eu se quer sairia das imediações, uma maneira de meus pensamentos estarem perto e chegar ao seu cérebro a frase que nunca canso de repetir: “a mãe te ama, filho”.
Finalmente de volta ao carro e escondida do resto do mundo, repouso a testa sobre a direção. Agora será desse jeito? Meu filho terá de aprender a lidar com a vida e com os conflitos sem eu estar por perto, meu Deus? É, lá fui eu perdi de novo. Desde que dei à luz, Deus passou a ser palavra constante em minha voz. Então que Ele assista àquele menino curioso e contente consigo mesmo por aprender a ler, entusiamo que faz de mim uma mãe orgulhosa, porém despedaçada e em nada tranquila com o futuro cada dia mais longe de meu alcance.
O suspiro é grande e com o dorso da mão limpo o nariz que insiste em escorrer. Tudo bem, tenho tempo, quatro horas para estampar um sorriso em um rosto inchado. Liga não, filho, neurose de mãe, descendente de Eva que ignorou por completo a tal da separação, serpente venenosa e sorrateira que também habita o paraíso, esse rio de felicidade que me banha ao te ver crescer e que também me afoga a alma ao ter a certeza, agora cristalina, de que não poderei te proteger dessa grande aventura que é a vida.