Saúde

Falta de UTI: caos foi anunciado; agora, não há solução imediata para problema

Apesar de grave, o caos não foi surpresa para os agentes da área

Falta de UTI: caos foi anunciado; agora, não há solução imediata para problema

Reportagem: Cláudia Neis

Cascavel – O sistema de saúde colapsou no fim de semana e deixou Cascavel e região sem vagas na UTI para pacientes que não estão com o novo coronavírus. Tanto na rede pública quanto na privada. Na manhã de ontem, autoridades de saúde se reuniram para discutir soluções para o problema. Propostas foram apontadas, mas nenhuma que solucione a situação de imediato.

Apesar de grave, o caos não foi surpresa para os agentes da área. A Prefeitura de Cascavel vinha cobrando a 10ª Regional de Saúde sobre a situação, inclusive enviando diariamente oficio à Regional de Saúde para cobrar a transferência dos pacientes. “Algo que nem é necessário, pois todos os cliques estão no sistema de regulação, que é do Estado”, acrescenta.

O próprio diretor da 10ª Regional, João Gabriel Avanci, admitiu que o número de pacientes em tela de regulação (aguardando leitos hospitalares), que era, em média, 60 por dia, aumentou para 150 nos últimos dez dias.

A reportagem do Jornal O Paraná questionou a Sesa (Secretaria de Estado da Saúde) a razão da demora para a tomada de providências. Nem mesmo o alerta emitido na manhã do último sábado à população sobre a falta de vagas e a operação para tentar coibir abusos no trânsito foi antecipado pelas autoridades.

A secretaria enviou apenas uma nota genérica, repetindo que tem Central de Regulação de Leitos e ampla rede hospitalar onde são concentrados os pedidos de transferências de pacientes e que o remanejamento de pacientes é comum. “A Central trabalha com pedidos simultâneos e essa logística de transferência precisa de um tempo para ser organizada, visto que depende do rastreamento de vagas na região”, informa, sem entrar em detalhes.

Contudo, não respondeu se está em andamento alguma medida como a contratação de leitos privados na região para dar suporte aos pacientes locais.

Pico de demanda

O Ministério Público cita que o que levou ao caos é uma soma de fatores. A demanda geral de leitos, que sempre foi alta, aliada ao agravamento de casos crônicos (muitos que não buscaram acompanhamento durante a pandemia), o aumento de acidentes de trânsito (visto que em duas situações 13 pessoas ficaram feridas com gravidade no fim de semana) e ainda a redução de suporte geral, causada em parte pelo remanejamento de profissionais para as alas de tratamento de pacientes covid-19.

Além da situação que já vinha sendo registrada havia dias, como a espera de pacientes em UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento) por mais de dez dias, o aumento significativo de regulações registradas pelo Samu no fim de semana e a lotação de hospitais privados de Cascavel e Toledo culminaram no caos total.

Para se ter uma ideia, o número médio de regulações diárias no Samu passou de 320 para cerca de 520 no último sábado (12). “O número de regulações aumentou bastante e foram de situações variadas, indo de acidentes, violência, casos clínicos, como infarto até intoxicação por drogas”, resume o diretor-técnico do Samu, Rodrigo Nicácio.

Como está a situação agora?

Dos 37 pacientes que aguardavam transferência a leitos hospitalares nas UPAs de Cascavel no fim de semana, ontem, 31 continuavam na fila. O caso mais antigo está há dez dias clicado no sistema. Dois dos pacientes que estavam nas unidades não resistiram e foram a óbito no fim de semana.

A regulação conseguiu vagas em hospitais distantes, mas, por conta da gravidade do quadro, eles não puderam ser transferidos. Quatro pacientes graves que aguardavam no HU (Hospital Universitário) de Cascavel por leitos de UTI foram transferidos para hospitais da Macrorregional Oeste.

De acordo com o boletim divulgado pelo Município, a ocupação de leitos de UTI SUS não covid em Cascavel era de 96,4% ontem, com apenas dois leitos vagos e 54 ocupados. O HU, o Hospital do Coração e o Hospital São Lucas, de Cascavel, e o Hospital Bom Jesus, de Toledo, estavam 100% lotados. As duas vagas são no Hospital Uopeccan.

Na Macro-Oeste, dos 165 leitos de UTI SUS não destinados a pacientes com o novo coronavírus, 117 estavam ocupados.

Alternativas já apresentadas

De acordo com o promotor de Saúde Pública Ângelo Mazzuchi, as alternativas a serem tomadas são: ampliar o suporte geral, o que não é possível realizar de imediato, pois não há como reduzir os leitos Covid; transferir recursos destinados à covid, o que não pode ser feito pois o número de casos está crescendo e a ocupação de leitos também; diminuir o registro de acidentes é possível, mas, com a retomada dos serviços e das atividades comerciais, não há como garantir que isso aconteça; aumentar a atenção básica, com monitoramento residencial, o que também só traz resultados em longo prazo.

Durante a reunião de ontem, foram apresentadas duas medidas que podem amenizar a situação em um prazo médio e que serão discutidas com a Secretaria de Estado da Saúde nesta terça-feira: otimizar a busca de leitos pela região e pelo Estado pelo macrorregulador oeste e a destinação de quatro dos 14 leitos de UTI do Hospital de Retaguarda (que são destinados a pacientes covid) para atenção geral. Porém, este último, de acordo com o Consamu, depende de contratação de servidores e ajuste de equipamentos para não ter contato com os pacientes covid e isso depende de a Sesa liberar os recursos e avalizar os ajustes.

Além disso, a Promotoria de Saúde Pública deve recomendar administrativamente à Sesa que empodere o Macrorregulador Oeste, que tem tido dificuldade para transferir pacientes para outras regionais, solicitar medidas emergenciais de fiscalização ao comitê de trânsito e, ainda, reavaliar a matriz de risco para a covid-19 aplicada em Cascavel e arredores.

Possível segunda onda de covid-19

Apesar do colapso do sistema de saúde para pacientes sem covid-19 e do aumento da taxa de ocupação dos leitos exclusivos para covid-19, o Município de Cascavel não pretende rever as medidas de isolamento social e flexibilização das atividades comerciais e de lazer. “Não existe, no momento, previsão alguma de novo decreto, até porque não há problemas com leitos covid. Há vagas, conforme mostra o boletim de hoje”, informou.

Já o diretor-geral do HU (Hospital Universitário), Rafael Muniz de Oliveira, alerta para a possibilidade de a região estar entrando em uma segunda onda da doença e afirma que há necessidade de respeitar as medidas restritivas: “Agora, infelizmente, temos que voltar um pouco no tempo. Não é hora de calmaria e sim de retomar a atenção às medidas restritivas para que essa onda venha a ser menor que a primeira”.