
A paciência dos produtores de leite se esgotou. Cansados de aguardar por uma medida mais firme por parte do governo federal contra as importações de leite, os produtores do Paraná decidiram reagir e por volta das 10h15 de ontem (5), interditaram o pedágio do km 464 da BR-277 em Laranjeiras do Sul. O bloqueio durou cerca de 5 horas. A crise no setor leiteiro não é de hoje. Muitos produtores de leite inclusive já admitem deixar a atividade, vender as vacas para o frigorífico e investir em commodities diante da frustração na atividade.
A passagem dos veículos pela cancela aconteceu de forma gradativa e sem o pagamento do pedágio, pela via lateral. Essa é a primeira manifestação enfrentada na praça de pedágio após o grupo EPR Iguaçu assumir a concessão do trecho. Em nota encaminhada ao do Jornal O Paraná, a EPR Iguaçu informou que “após o fechamento das cancelas, prezando pela integridade física de todos os usuários e colaboradores, seguindo procedimentos internos, a concessionária acionou as forças de segurança responsáveis pelo trecho”. O fluxo foi liberado pelas vias auxiliares. Cabines Manuais e Pistas Automáticas ficaram interditadas.
Diante do diálogo estabelecido entre produtores de leite e a PRF (Polícia Rodoviária Federal), o desbloqueio das cancelas ocorreu às 15h30.
Prejuízo amargo
A crise do setor leiteiro se agravou recentemente com preços pagos aos produtores que não cobrem o custo de produção, além da concorrência com importações. O segundo semestre é um período natural de retração na remuneração dos produtores de leite, reflexo do aumento natural da produção e da captação impulsionada pela maior oferta de alimento para o rebanho. Neste ano, porém, o cenário é ainda mais preocupante. Além dos fatores sazonais, a crise foi intensificada pelo crescimento das importações de leite em pó e queijo — especialmente provenientes de países do Mercosul — e pela queda no poder de compra do consumidor brasileiro.
De acordo com lideranças do setor, essa combinação tem afetado diretamente as pequenas e médias propriedades rurais, responsáveis pela maior parte da produção no Estado. Para tentar equilibrar as contas, muitos produtores têm recorrido ao aumento do volume de leite entregue à indústria. A estratégia, no entanto, acaba ampliando a oferta e pressionando ainda mais os preços pagos ao produtor.
Entidades representativas e cooperativas alertam que, sem medidas emergenciais para conter o impacto das importações e estimular o consumo interno, o setor corre o risco de ver milhares de produtores deixarem a atividade. O pedido é por políticas públicas mais efetivas, que garantam condições mínimas de competitividade à produção nacional e assegurem renda ao pequeno agricultor.
O debate sobre a crise leiteira vem mobilizando parlamentares, sindicatos e federações, que defendem uma atuação coordenada entre governo federal, estados e iniciativa privada.
PR pode inspirar lei nacional para minimizar a crise no setor leiteiro
A crise no setor leiteiro mobilizou parlamentares e produtores em audiência pública na Câmara dos Deputados na terça-feira (4). O debate, coordenado pelo deputado federal por Santa Catarina, Valdir Cobalchini (MDB), discutiu medidas para enfrentar a queda nos preços e a concorrência do leite em pó importado, que tem levado muitos produtores familiares ao abandono da atividade.
O destaque foi o exemplo do Paraná, que aprovou o projeto de lei 888/2023, de autoria do deputado estadual pelo Paraná Luis Corti (PSB), proibindo a reidratação do leite em pó importado na indústria. A proposta inspirou parlamentares federais e estaduais e pode se tornar lei nacional, por meio de projeto semelhante da deputada Daniela Reinehr (PL).
Segundo Corti, que participou da audiência em Brasília, a prática de reidratar leite importado adquirido a preços artificialmente baixos distorce o mercado e sufoca o produtor local. “É hora de colocar um fim nisso a nível nacional e valorizar quem trabalha no campo”, afirmou.
Cobalchini, por sua vez, apresentou um pacote de medidas emergenciais, incluindo a suspensão temporária das importações do Mercosul, auditorias sanitárias, compra pública de leite e derivados e linhas de crédito com juros zero. Ele também defendeu a criação de um mercado futuro do leite para garantir previsibilidade de preços.
O deputado federal Pedro Lupion, presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), elogiou a atuação do Paraná e reforçou a importância do Estado liderar o debate. “É um orgulho ver o Paraná encabeçando essa discussão aqui em Brasília, com uma proposta madura e necessária”, destacou Lupion.
O projeto de lei 888/2023 deve ser sancionado ainda nesta semana pelo governador Ratinho Junior, enquanto outros estados e o Congresso Nacional avançam em discussões para transformar o modelo paranaense em política pública nacional.