DISCUSSÃO

Mais burocracia à vista: agro questiona ‘novos poderes’ das prefeituras

Segundo o governo, a Medida Provisória corrigiria distorções do sistema tributário nacional “sem aumentar impostos”

Segundo o governo, a Medida Provisória corrigiria distorções do sistema tributário nacional “sem aumentar impostos”
Segundo o governo, a Medida Provisória corrigiria distorções do sistema tributário nacional “sem aumentar impostos”

Curitiba – Editada para compensar os impactos da manutenção da desoneração da folha de pagamentos de empresas e de municípios, a medida provisória (MP) 1.227/2024 começou a ser analisada pelo Congresso nesta semana. Apelidada pelo governo de “MP do Equilíbrio Fiscal”, a norma prevê diversas medidas e o governo alega que a MP é “indispensável” para reorganizar as contas públicas após o Congresso Nacional prorrogar, até 2027, a desoneração da folha de pagamentos de empresas e de municípios.

A maior repercussão até agora se deu acerca da limitação do uso dos créditos do PIS/Cofins, mas a MP também permite à União delegar ao Distrito Federal e aos municípios a instrução e julgamento de processos administrativos que envolvam o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). A MP altera a Lei 11.250, de 2005, que já previa essa delegação para a fiscalização e lançamento do ITR, um imposto de competência federal. O governo afirma que a nova atribuição é um pedido dos municípios.

Protesto

A Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP) reivindica que Congresso Nacional que derrube por completo a Medida Provisória que delega às prefeituras de cada município a palavra final sobre questões envolvendo o ITR. Além de causar falta de uniformidade na aplicação das normas relativas ao ITR e reduzir a chance de sucesso nas discussões administrativas, a medida aumenta a burocracia e ameaça a competitividade do agronegócio, com o possível aumento no pagamento de impostos. Segundo o governo, a MP corrigiria distorções do sistema tributário nacional “sem aumentar impostos”.

O que se vê, na prática, é mais uma tentativa de penalizar os produtores rurais com aumento de tributos, insegurança jurídica e mais burocracia. Antes, o município encaminhava os casos de debate sobre o ITR à Receita Federal, cuja última instância de discussão era o Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), um órgão paritário que inclui representantes dos contribuintes. Nos municípios, a última instância de discussão do ITR poderá ser o próprio chefe do Executivo, o prefeito, visto que muitas cidades não têm estrutura de tribunais administrativos.

“Isso é um retrocesso sem precedentes para os produtores rurais. Em vez de um órgão paritário para apreciar os recursos, teremos uma regra para cada município, dependendo do humor de cada prefeitura. Imagine a falta de uniformidade na aplicação das normas relativas ao ITR para os produtores rurais. Ninguém quer deixar de pagar imposto, mas queremos regras claras para que todos nós possamos contribuir de forma transparente e justa”, crava Ágide Meneguette, presidente do Sistema FAEP/SENAR-PR.

Outras mudanças

Além da descentralização do ITR para os municípios, outro impacto significativo se refere à oneração das exportações. A MP veda a utilização de créditos PIS/COFINS em compensações e ressarcimentos. Com isso, os possíveis créditos não poderão mais ser usados para compensação, como era permitido anteriormente. Assim, o pagamento de outros tributos administrados pela Receita Federal deverá ser arcado não mais via compensação de crédito PIS/Cofins, mas com o dinheiro em caixa do próprio contribuinte. O reflexo deve ser um aumento do custo tributário.

A MP traz ainda um aumento da burocracia, já que os produtores passam a ser obrigados a entregar declaração eletrônica e comprovar que não possuem débitos fiscais, inexistência de inscrição no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público Federal (Cadin), que não possuem débitos de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), entre outros trâmites burocráticos.

“Ferramenta de arrecadação”

Em entrevista ao O Paraná, o presidente do Sindicato Rural de Cascavel, Paulo Orso, disse que já foi solicitado para a FAEP e CNA a intercessão para que seja derrubado um dos itens da MP 1.227/24, que delega às prefeituras de cada município a palavra final sobre questões envolvendo o ITR (Imposto Territorial Rural). “A prefeituras não podem fazer disso uma ferramenta de arrecadação. Pagamos o ITR em relação a terras nuas, como é calculado, e não sobre os investimentos feitos sobre elas”, afirma Orso.

Laudos apontam divergências

Nos últimos anos, o Sistema Faep/Senar-PR tem recebido uma enxurrada de reclamações de produtores rurais de todas as regiões do Estado sobre notificações e cobranças de ITR consideradas maiores do que o devido. “Temos visto, em todas as regiões do Paraná, muitas prefeituras sem condição de fazer esse tipo de avaliação. Há anos, nós estamos atentos a essa situação e dando o suporte necessário aos sindicatos rurais e aos produtores, para que paguem o valor justo do ITR”, completou Ágide Meneguette.

Em Sorriso (MT), a Capital Nacional do Agronegócio e o maior produtor individual de soja do mundo, por exemplo, o VTN de área de boa aptidão para lavoura é calculado em R$ 5.443/ha. Em 2023, em Campina da Lagoa, no Centro-Oeste paranaense, o valor era de R$ 138.555/ha.