Reportagem: Josimar Bagatoli
Lindoeste – Um esquema de desvio de dinheiro público – inclusive do Fundo Municipal de Saúde – na Prefeitura de Lindoeste pode ter movimentado até R$ 1 milhão em contas bancárias de laranjas. Os casos envolvem pagamentos em duplicidade, empenhos de despesas sem comprovação de notas fiscais e pagamentos feitos apenas com autorização de fornecimento.
Em meio a diversos indícios de irregularidades, os que mais chamam a atenção são pagamentos a estatais e a órgãos públicos, cujos depósitos foram feitos em contas de pessoas físicas. Um dossiê está nas mãos do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), que há um mês apreendeu documentos do Paço.
O esquema inclui pagamento de despesas com cheques nominais – muitos a empresas sem ligação com a administração pública e dos mais diversos ramos, desde clínicas médicas, hotéis até estatais como a Copel. No entanto, o dinheiro que seria para pagar conta com a estatal foi parar em uma conta privada de um suposto laranja. Situação que se repete com Cisop (Consórcio Intermunicipal de Saúde do Oeste do Paraná) e Amop (Associação dos Municípios do Oeste do Paraná).
O principal investigado é Jadiel Almeida Ferreira, proprietário da J A Contabilidade Assessoria e Negócios, que exerceu cargo de secretário de Finanças da Prefeitura de Lindoeste de 2017 a 2019. Era ele quem gerenciava os recursos, realizava os pagamentos e assinava os cheques em conjunto com o atual prefeito, José Romualdo Pedro.
Jadiel tinha todas as senhas bancárias, tanto em nome do financeiro quanto do chefe do Paço. Após as primeiras denúncias virem a público, Jadiel pediu demissão do cargo, em janeiro deste ano.
Um relatório preliminar lista 35 movimentações feitas pelo ex-secretário de Finanças somente ano passado, cujos depósitos foram feitos para ele, sua empresa e pessoas físicas que aparecem como laranja. Esses pagamentos somam R$ 129.480,49.
Tão logo o assunto surgiu, um fato despertou a atenção: foram depositados R$ 79.442,49 nas contas da Prefeitura de Lindoeste, em dinheiro, sem a identificação do depositante.
O ex-secretário será ouvido nesta semana pelo Gaeco.
Corrupção ativa e passiva
Os desvios de recursos públicos foram constatados pelos vereadores Euzébio Silverio da Rocha (PMN) e Douglas Henrique de Souza (PL), que montaram o dossiê sobre corrupção ativa e passiva e formação de organização criminosa a partir de todos os documentos encontrados. Tudo já está com o Gaeco.
Os parlamentares receberam até comprovantes de depósitos. Um deles creditou na conta de Jadiel Almeida Ferreira R$ 140, em novembro do ano passado, e o que chama a atenção é a origem: Fundo Municipal de Saúde. A despesa seria de uma empresa do ramo de diagnóstico por imagem, de Cascavel, que presta serviço ao Município de Lindoeste.
Os depósitos favorecendo o próprio ex-secretário são variados: em 29 de junho de 2018, o Fundo Municipal de Saúde destinou a Jadiel outros R$ 720. As fontes são variadas: em 9 de março do ano passado, por exemplo, o ex-secretário recebeu R$ 450 provenientes do ICMS da Prefeitura de Lindoeste. Já a empresa dele obteve em 2018 dez depósitos diferentes que totalizaram R$ 7.106,68 – montante justificado para pagar empresas supostamente laranjas, mas o dinheiro tinha como destino a conta de Jadiel.
Há apontamentos de notas falsas no valor de R$ 8.431 destinadas a clínicas médicas pagas praticamente às vésperas do réveillon de 2019 e que foram parar na conta de uma panificadora.
Pelo que aponta a apuração preliminar, havia a clonagem das notas “sem escrúpulos e sem nenhum medo por parte da gestão pública – aqui entendida por todos os executores, visto que já se restou comprovado que o prefeito confiava no ex-secretário de Finanças”, pois tinha a senha do próprio prefeito José Romualdo Pedro.
Câmara deve investigar
A denúncia chegou à Câmara de Vereadores e deve render a abertura de uma Comissão Processante para apurar se o rombo é ainda maior, visto que eles tiveram acesso apenas às notas de 2018. Além disso, não está descartado pedir a cassação do prefeito José Romualdo Pedro.
Os vereadores também querem saber se há mais envolvidos no esquema de transferências irregulares.
O prefeito será convocado para dar explicações porque sua assinatura constava nos pagamentos, além de ter confiado no então secretário.
Todos os vereadores da Casa de Leis concordam na abertura da Comissão Processante, especialmente diante do rombo nas contas públicas.
Prefeito nega envolvimento
O prefeito de Lindoeste, José Romualdo Pedro, em entrevista ao Jornal O Paraná, assegurou que não tinha conhecimento da atuação do ex-secretário de Finanças e nega qualquer participação no esquema de desvio.
Afirma que, quando soube dos indícios de desvios, abriu uma tomada de contas – processo por meio de uma comissão especial da própria prefeitura – para verificar os pagamentos, que constatou depósitos irregulares. “Houve a tomada de contas e protocolamos tudo no Gaeco. A apuração foi finalizada há uma semana e agora está tudo por conta do Ministério Público”.
Diante da repercussão do caso, o prefeito se colocou à disposição do Gaeco (ainda não foi ouvido) para prestar esclarecimentos e disse que também vai responder aos questionamentos dos vereadores. “Queremos que apurem todos os fatos. Sobre o ex-secretário, não vamos julgar, e caberá às instituições desempenhar essa função. Ele tinha todas as minhas senhas, como o secretário de Finanças de qualquer município. Pela nossa comissão houve a constatação de irregularidades, mas tudo está no MP”, acrescentou Romualdo Pedro.
A reportagem tentou contato com o ex-secretário, mas não teve as ligações telefônicas retornadas.