Entenda como a votação no Congresso impactou a agenda ambiental do governo Lula e as consequentes derrotas políticas - Foto: Agência Brasil
Entenda como a votação no Congresso impactou a agenda ambiental do governo Lula e as consequentes derrotas políticas - Foto: Agência Brasil

Brasília - Menos de uma semana após o encerramento da COP30, o governo Lula sofreu uma das maiores derrotas de sua atual relação com o Congresso Nacional. Em sessão conjunta ontem (27), deputados e senadores derrubaram 52 dos 63 vetos presidenciais à lei de licenciamento ambiental — um revés considerado emblemático por envolver diretamente a agenda ambiental defendida pelo Planalto no cenário internacional.

Foram 268 votos pela derrubada e 190 pela manutenção na Câmara, além de 50 a 18 no Senado. Na prática, prevaleceu a articulação robusta da bancada ruralista e a autonomia do Legislativo frente ao Executivo. Ainda que o voto do deputado Eduardo Bolsonaro, registrado enquanto ele estava fora do país, tenha sido anulado posteriormente, o placar folgado evidenciou a perda de controle do governo sobre “a base”.

Outros 28 vetos analisados separadamente também foram rejeitados, aprofundando o desgaste do Planalto em um tema sensível: o licenciamento ambiental, peça central do discurso de Lula na COP30 e alvo de críticas de ambientalistas, que chamam o projeto de “PL da Devastação”.

Articulação frágil

A derrubada dos vetos ocorre após meses de tensão entre governo e Congresso, e consolida a força da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que há mais de duas décadas defende a modernização do licenciamento. Para o governo, a derrota tem peso simbólico: ela ocorre justamente após Lula reforçar compromissos ambientais em evento global, enquanto, internamente, vê boa parte de sua agenda sendo redefinida pelo Legislativo.

O presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (União-AP), disse que o momento representa “maturidade institucional”, em referência ao acordo construído entre as lideranças para avançar na votação. Ele citou inclusive a concordância do líder do governo, senador Randolfe Rodrigues, com a deliberação — gesto interpretado nos bastidores como uma tentativa de evitar um desgaste político ainda maior diante de uma derrota inevitável.

A base governista tentou fatiar vetos e adiar votações, mas não conseguiu reverter o clima de maioria consolidada. Tanto Câmara quanto Senado demonstraram alinhamento com a FPA e com setores produtivos, que pressionavam pela derrubada.

Vitória ruralista

A FPA classificou o resultado como uma conquista do setor produtivo e uma resposta a décadas de entraves burocráticos. Para o deputado Pedro Lupion (REP-PR), presidente da bancada, o novo marco representa “um passo decisivo para destravar obras, gerar empregos e atrair investimentos”. Articuladores do texto afirmam que a lei não enfraquece o controle ambiental, mas cria critérios mais previsíveis e adequados ao nível de risco de cada empreendimento.

O deputado Zé Vitor (PL-MG), relator do texto na Câmara, diz que o novo modelo torna o processo mais moderno, eficiente e, ao contrário do que afirmam críticos, mais protetivo. Outros parlamentares ruralistas também ressaltaram ganhos de segurança jurídica e redução do que chamam de “cipoal normativo” — referência às mais de 27 mil regras que hoje orientam o licenciamento.

No Senado, Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura de Bolsonaro, destacou o apoio expressivo de 89 entidades do setor produtivo ao projeto. Para ela, o texto permite avançar em infraestrutura e energia sem abrir mão da proteção ambiental.

Impactos políticos e próximos passos

A derrubada dos vetos recupera integralmente o texto aprovado pelo Congresso e revela a capacidade de mobilização de setores contrários às posições do governo, especialmente no eixo agro e infraestrutura. Para analistas, o episódio acende um alerta no Planalto sobre o aumento da autonomia política do Legislativo em temas considerados estratégicos.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também comemorou a decisão, afirmando que a modernização do licenciamento é necessária para destravar investimentos e dar previsibilidade ao mercado. A entidade sustenta que o novo marco pode acelerar projetos ligados à economia de baixo carbono, saneamento e logística.

Ainda assim, parte do conteúdo dos vetos permanece em negociação. Os dispositivos referentes à Licença Ambiental Especial (LAE) ficaram de fora da votação, pois o tema é tratado na Medida Provisória 1.308/25, que será analisada por comissão mista nos próximos dias.

A tendência é que o governo tente recompor pontes com o centro e setores moderados do Congresso para evitar novas derrotas. No entanto, o episódio deixa evidente que a coalizão governista segue fragmentada e enfrenta dificuldades para manter coesão em pautas de alto impacto econômico e ambiental.

Acordo para análise da LAE

O Congresso Nacional entrou em acordo para adiar a análise de parte dos vetos presidenciais ao Licenciamento Ambiental. Os itens relacionados à LAE (Licença Ambiental Especial), não serão votados na sessão conjunta de ontem.

Isso se deve ao fato de o tema ainda estar em análise em uma Medida Provisória (1308/25) enviada pelo Governo Federal. O entendimento é para a negociação de um aperfeiçoamento de outros pontos no texto do deputado Zé Vitor (PL-MG), relator da MP. O relatório deve ser analisado pela Comissão Especial no dia 3 de dezembro na Câmara dos Deputados e, no dia seguinte, no Senado Federal. A medida perderá validade em 5 de dezembro.