Opinião

Whistleblowers, caixa 2 e outros efeitos das medidas de Moro nas empresas

Opinião de Tatiana de Toledo

O Pacote Anticorrupção e Antiviolência é a primeira medida tangível de Moro no governo de Jair Bolsonaro. O projeto prevê a alteração de 14 leis, tendo como foco principal algumas mudanças no tratamento para crimes de corrupção, crime organizado e crimes violentos. De acordo com o ministro, as medidas têm também como objetivo unificar alguns esforços para o melhor tratamento de crimes correlatos, já que o crime organizado se utiliza de corrupção para garantir a impunidade e está intimamente ligado à maioria dos crimes violentos.

De forma prática, no que diz respeito à corrupção mais diretamente, as principais medidas tratam de tipificação de crimes de caixa 2; o regime fechado para o começo do cumprimento de pena de corrupção passiva, ativa ou peculato; confisco de bens para condenados a mais de seis anos de prisão; prisão após condenação em segunda instância; adoção de recompensa para os “informantes do bem” por parte do governo; dentre outras alterações que endurecem o tom do governo no combate à corrupção.

Apesar de as medidas receberem muitas críticas e de ainda estarem sujeitas à aprovação no Congresso, o que possibilita alterações, o projeto é uma das medidas prioritárias do governo negociadas ainda durante o período de campanha e de transição e demonstra que um dos focos da nova gestão presidencial está em reforçar o combate à corrupção e ampliar penalidades.

Grande parte das novas medidas não afeta tão diretamente as empresas privadas, dado que todas já estão sob a égide da Lei 12.846/13, porém a medida que prevê recompensas do governo para os ditos “informantes do bem” ou “whistleblowers” é um tema que deve ser discutido no âmbito privado, pois se trata de um grande motivador de denúncias sobre condutas que afetem o interesse público ou crimes contra a administração pública (corrupção, por exemplo) e que podem afetar diretamente a condução de processos investigativos dentro e fora das empresas.

De acordo com trecho do Projeto Anticrime, a alteração proposta na Lei 13.608/2018, Artigo 4º A: A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios e suas autarquias e fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, manterão unidade de ouvidoria ou correição, para assegurar a qualquer pessoa o direito de relatar informações sobre crimes contra a Administração Pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou omissões lesivas ao interesse público.

Nos Estados Unidos e na Europa, a figura do “whistleblower” já existe há muitos anos e possibilita que cidadãos sem qualquer participação em crime possam realizar uma denúncia e oferecer valiosas informações que permitam a realização de investigações e garantam a sua proteção. A recompensa irá existir se o patrimônio público puder ser recuperado. Isso mostra que o governo americano, por exemplo, considera necessária a participação do cidadão, dando-lhe voz no controle da administração pública e na defesa do interesse público em geral.

De forma prática, caso essa medida seja aprovada no Brasil as empresas precisam garantir que seu Programa de Compliance contemple uma política anticorrupção e de não retaliação efetiva, pois o denunciante está sob proteção legal e que repensem sobre a prática de reportar irregularidades também no âmbito corporativo, dado que essa prática pode auxiliar as empresas a se defenderem e a se precaverem de danos maiores, como perdas de negócios, multas do Poder Público, desvalorização na bolsa de valores, proteção da reputação etc. Ao trazer estes fatos, a adoção da figura do “informante do bem” preserva o propósito de uma empresa, que não é o cometimento de irregularidades.

Tatiana de Toledo é gerente na Protiviti, consultoria global