A Páscoa é a principal celebração do ano litúrgico cristão e também a mais antiga e importante das festas do calendário cristão. Não possui dia específico – uma vez que sua celebração varia de ano a ano -, mas tem como norma acontecer entre 22 de março e 25 de abril. No Brasil, como nos demais países com maioria cristã e de acordo com o Novo Testamento, essa é a data em que se comemora a ressurreição de Cristo, três dias após ter morrido na cruz.
Assim, para os cristãos, a Páscoa ganhou um novo significado, pois celebra a ressurreição de Cristo e trata da passagem da morte para a vida.
Mas, certa vez, na lua cheia, um coelho me contou uma história curiosa.
O orelhudo me confidenciou que, na antiguidade, nos primórdios das civilizações, muito antes de ser considerada a festa da ressurreição de Cristo, a Páscoa anunciava o fim do inverno e a chegada da primavera, um período de transição no ano.
Após a treva, chega o período de luzes. A etimologia da palavra páscoa já dizia isso – afirmou o coelho. Do hebreu “peschad”, em grego “paskha” e em latim “pache”: passagem.
Mais ainda, os antigos povos pagãos europeus, nesta época de transição das estações do ano, homenageavam Ostera ou Esther – em inglês, “Easter”, em português, Páscoa. Ostera era a deusa da primavera, representada como uma mulher que segurava um ovo em suas mãos, enquanto aos seus pés nus saltitavam alegres coelhos – seus irmãos e irmãs -, símbolos da fertilidade. Na equivalência grega, Ostera era Persephone e, na romana, Ceres, e ambas as deusas simbolizam a nova vida.
Nessa época, me disse o coelho, era costume entre os povos que adoravam as tais deusas decorar ovos de modo a homenageá-las, costume que, apesar da repressão cristã aos povos pagãos, prosseguiu até hoje. No século X, por exemplo, o rei Eduardo I, da Inglaterra, driblava a vigilância da Igreja e banhava ovos em ouro para presentear os amigos e aliados na Páscoa.
O dentuço disse mais.
Muitas civilizações acreditavam que o mundo nasceu de um ovo. Na maioria, o ovo cósmico assurge de um período de trevas e caos, como no caso da Índia, onde se acredita que a gansa Hamsa – sopro divino – chocou o ovo cósmico nas águas primordiais e que tal ovo, ao se partir, originou o céu com sua clara e a terra com a gema.
Os chineses, por seu turno, acreditavam que um ovo se partiu ao meio e dessa cisão surgiu a terra – Yin – e o céu – Yang.
Os celtas falavam do ovo da serpente que continha a representação do Universo: a gema era o globo terrestre, a clara o zênite e a casca equivalia aos astros no céu.
Na tradição cristã, o ovo surge como renovação. Muitos países europeus possuem a crença de que comer ovos no domingo de Páscoa traz saúde e sorte durante todo o resto do ano.
Mas o levado coelho não deixou de se gabar enquanto contava sua incrível história. A fertilidade do coelho, sempre propenso a grandes ninhadas, bem como seu breve período de vida – na natureza não dura mais do que dois anos -, traz pontos em comum com diversas civilizações antigas e modernas.
Regressando milhares de anos, encontramos o nosso amiguinho felpudo sendo venerado no antigo Egito. Lá o coelho representava o nascimento e a nova vida. Outros povos da Antiguidade o consideravam símbolo da Lua. Daí, então, o astro selenita determinar a data da comemoração pascal. O dia da Páscoa, nas Tabelas Eclesiásticas, é o primeiro domingo depois da lua cheia que ocorre no dia ou depois de 21 março – data do equinócio.
Ressuscitado da crença de Ostera, o coelho me disse que chegou à América escondido na bagagem dos imigrantes alemães por volta do ano 1700. Na versão germânica, o danado escondia ovos coloridos que deveriam ser encontrados pelas crianças na manhã do domingo pascal.
Assim, meus amigos, coelhos não botam ovos, mas, oportunamente, eles contam histórias que ajudam a explicar os simbolismos da Páscoa.
M.R. Terci é escritor, roteirista e poeta