Cascavel - Tratar dos direitos dos menores ainda é um campo minado de emoções, decisões difíceis e, muitas vezes, uma boa dose de mitos que precisam ser desfeitos. Um indicativo interessante da dificuldade em relação a tais direitos está no uso de termos como “guarda”, que denota uma relação de posse, quando, na verdade, deveria estar mais atrelada à responsabilidade, ao cuidado e à tomada de decisões. Como bem aponta o jurista Rodrigo da Cunha Pereira, palavras têm força e poder; por isso, vale a pena repensar os termos que se perpetuaram, mas que mudaram radicalmente de significado ao longo do tempo.
Os debates sobre guarda se iniciam com a separação do casal, já que, no âmbito do relacionamento, ambos são guardiões e detêm os mesmos direitos e deveres. É importante lembrar que existem mães solo mesmo dentro de um relacionamento, onde o genitor pode atuar apenas como executor de tarefas, sem a devida responsabilidade afetiva pelo menor. No mundo ideal, em caso de separação ou divórcio, para alcançar o melhor interesse da criança — que é o coração das regras familiaristas — a responsabilidade sobre os menores deveria permanecer conjunta entre ambos os genitores. Por isso, a regra geral sobre guarda é que ela seja compartilhada.
Contudo, a ideia de dividir a responsabilidade de forma salomônica é um mito. Na realidade, essa modalidade de guarda permite que os pais participem ativamente da vida dos filhos — não apenas com os benefícios, mas especialmente com os ônus. É um convite à cooperação e não à competição. Um ambiente hostil entre os genitores certamente não cumprirá o melhor interesse do menor, seja por desacordos entre ambos ou por riscos de violência doméstica.
Para garantir a estabilidade do menor, ele reside fixamente com um dos pais (o guardião), enquanto o outro tem direito de convivência por meio de visitas, que podem ser estipuladas de várias formas, desde que atendam às necessidades do menor. É essencial ressaltar que, independentemente da modalidade de guarda e da extensão do direito de visitas, o direito à pensão alimentícia é devido ao pai guardião, ou seja, aquele com quem a criança reside — mesmo em situações em que o menor passe períodos com o outro genitor, como nas férias.
Quando a divisão conjunta de responsabilidades não é viável, a guarda será unilateral e pode ser atribuída a um terceiro, parente ou não, em situações de negligência ou violência de ambos os pais, o que não se confunde com a adoção. A legislação ainda sugere que os pais poderiam abrir mão dos encargos parentais por vontade própria, em completo dissenso com a obrigação constitucional de assistência, criação e educação dos filhos menores. O abandono do dever de cuidado pode resultar em abandono afetivo, passível de indenização.
Como regra geral, a definição da guarda, especialmente quando não for a modalidade padrão, depende da realização de um estudo psicossocial. Nesse processo, psicólogos ou assistentes sociais, por determinação judicial, investigam o contexto familiar para evidenciar o melhor interesse da criança. Este trabalho, no entanto, é minucioso e pode ser parcial, pois é difícil para alguém externo à dinâmica familiar compreendê-la em toda a sua complexidade.
Além disso, como as questões sociais e familiares são dinâmicas, a guarda não é um instituto definitivo e pode ser alterada quando houver mudanças fáticas relevantes. Essa brecha permite decisões apressadas sob a alegação de alienação parental, uma questão que exige uma abordagem interdisciplinar, podendo levar a situações de risco para a integridade psicológica do menor. Por isso, tramita um projeto de lei que visa à revogação da lei da alienação parental.
Essa questão está longe de ser simples, pois existem diversos projetos de lei com conteúdos contraditórios que buscam alterar a conhecida lei de alienação parental, tanto recrudescendo quanto minimizando seus impactos. O cenário institucional e político é complexo e revela a diversidade de opiniões sobre a proteção dos menores, mas nunca deve desconsiderar a prioridade da proteção integral da criança.
Dra. Giovanna Back Franco
Professora universitária, advogada e doutoranda em Direito