Na contramão do mundo, a delegação feminina do Brasil deu um passo atrás. Depois de chegar ao recorde de 47,4% de mulheres no time olímpico, em Londres-2012, o percentual caiu quase 10% no Rio-2016. Apesar de ser a maior participação do gênero em números absolutos (209), elas representam 44,9% da equipe nacional. Enquanto isso, segundo o COI, a edição brasileira dos Jogos será a mais próxima da paridade de todas. Segundo os últimos dados divulgados ? a conta ainda pode mudar ?, 5.180 competidoras estão inscritas, de um total de 11.437. Ou seja, 45,29% dos participantes, número 10,77% superior à última Olimpíada.
Num país, onde o número de mulheres já ultrapassou o de homens ? de acordo com o IBGE, dados de 2012 apontam 51,5% contra 48,5% ?, a igualdade ainda não se reflete no esporte de alto nível. Até mesmo na comparação por grupos de idade, elas são maioria. Dos 465 atletas brasileiros, a maior parte se concentra entre 21 e 30 anos. Olhando a população geral, nesse recorte, 50,28% são do sexo feminino.
A queda da presença feminina é vista como um retrocesso para José Eustáquio Alves, doutor em demografia e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE).
? Esperava que aumentasse e não que diminuísse. Tivemos a primeira presidente mulher em 2010, os Jogos são aqui no Brasil… É um retrocesso em relação ao crescimento que vínhamos tendo. O mundo todo manteve e o Brasil diminuiu. Não foi uma queda tão grande em termos absolutos, mas em termos de tendência é muito ruim. O ideal é a equidade ? disse Alves, lembrando que, em 2012, foi a primeira edição com participação feminina em todos os países.
PÓDIO ASCENDENTE
Das 42 modalidades olímpicas, as brasileiras vão competir em 35. Já os homens vão ser espectadores em três, sendo que duas são exclusivamente de mulheres: nado sincronizado e ginástica rítmica. Em algumas, o Brasil não conseguiu atingir índices de classificação. Caso da equipe feminina de hóquei sobre a grama. Segundo o diretor executivo de esportes do COB, Marcus Vinícius Freire, o esporte não tinha convite garantido, e o país perdeu 16 atletas:
? Acordamos com o COI que as seleções teriam de atingir um nível no ranking para poder participar. As meninas não conseguiram, e esse número fez diferença.
Por outro lado, as brasileiras, em estádios, ginásios, nas águas, e nas areias, têm sido garantia do crescimento do país no quadro geral de medalhas, ainda que longe da igualdade absoluta. Desde que conquistaram o primeiro ouro, com a dupla de vôlei de praia Jacqueline e Sandra Pires, em Atlanta-1996, o peso das mulheres no pódio tem crescido. Em Sydney-2000, foram quatro de 12 (33%); em Atenas-2004, uma pequena queda: duas de dez (20%); em Pequim-2008, cinco de 15 (40%); e em Londres-2012, seis de 17 (41%). Sendo que, nas duas últimas edições, o Brasil trouxe seis ouros, quatro conquistados por elas.
? No alto rendimento, as mulheres ainda têm mais dificuldades em obter apoio, patrocínios, a estrutura é mais precária, e isso se reflete no número de medalhas ? afirma Hildete Pereira de Melo, economista da UFRJ que estuda as diferenças de gênero no mercado de trabalho.
Hildete acredita que um aspecto cultural relacionado à prática do esporte explica o fato de a predominância feminina na população geral não ter equidade no alto rendimento:
? Há um estímulo muito grande na infância dos meninos para a prática de esportes. Faz parte da sociabilidade do sexo masculino. As brincadeiras separadas reforçam o estereótipo de gênero. O extremo disso é o conceito de fragilidade, que é incompatível com a prática esportiva, principalmente no alto nível. Não adianta apenas olharmos os indicadores, que mostram mais mulheres no Brasil. Ha toda a questão das construções sociais, que refletem lá em cima.