Esportes

Ekaterina Karsten, o adeus depois de 7 olimpíadas

O olhar de Ekaterina Karsten se ilumina, e ela subitamente interrompe a
entrevista. Estica o pescoço e, com um sorriso juvenil, acompanha junto aos
jornalistas a chegada da final do single skiff feminino na Olimpíada do Rio,
vencida pela australiana Kim Brennan, na manhã de sábado.

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Aos 44 anos, 13 a mais do que a já experiente Brennan, Ekaterina queria estar
na água da Lagoa Rodrigo de Freitas, medindo forças com a australiana na regata
decisiva. E quase esteve: remadora bielorrussa, ela havia saído da água há
pouco, após uma arrancada de almanaque nos metros finais lhe garantir o segundo
lugar na Final B do Single Skiff, posição que equivale à oitava colocação
geral. remo EM 14 DE AGOSTO

Com sete Olimpíadas no currículo, a bielorrussa segue como uma das melhores
remadoras do mundo. Há três meses, foi quarta colocada no Campeonato Europeu ?
cujo melhor recorde no single skiff feminino, por sinal, continua sendo o
marcado por Ekaterina em 2010 (7min24s63). Aos poucos, porém, as marcas de
brilho começam a se apagar no rosto e na carreira da remadora. Ela responde com
fala pausada e baixa, aparentando um cansaço que beira a resignação.

? Não sei como é em outros países, mas na Bielorrússia a juventude não tem
uma liderança clara. Eles estão quase sempre nos smartphones e computadores, não
vejo ninguém que eles possam admirar no esporte. Estou feliz de poder competir e
ser um desafio aos atletas mais jovens. Quero inspirar nossa juventude e mostrar
a eles que até nessa idade você pode ter bons resultados, e que ficar no
computador não é a única coisa divertida ? reflete Ekaterina, decepcionada por
ter sido eliminada antes da disputa de medalhas: ? Eu estava contando com ir à
Final A e disputar medalha, mas o problema é que hoje em dia as atletas estão
cada vez mais fortes. Além disso, as ondulações que eu peguei nas quartas de
final exigiram muito esforço. Cheguei sem forças à semifinal.

INÍCIO PÓS-SOVIÉTICO

O primeiro título mundial de Ekaterina veio em 1991, na Áustria, quando
competia no double skiff e representava a União Soviética, bloco de repúblicas
comunistas que havia desmoronado, política e economicamente, dois anos antes. Em
sua primeira Olimpíada, a de Barcelona-1992, Ekaterina ? cujo nome de solteira é
Khadatovich ? competiu pelo Comunidade dos Estados Independentes, a equipe
pós-soviética que foi àqueles Jogos usando a bandeira olímpica. Segredos Olímpicos: remo e canoagem

Desde então, todos os grandes feitos dela foram alcançados por Bielorrússia ?
ela nasceu em Minsk, a capital do país ? e competindo no single skiff. Foi nessa
categoria que a remadora levou seis títulos mundiais e dois ouros olímpicos, em
Atlanta-1996 e Sidney-2000. Nesse meio tempo, casou-se com um alemão, adotou o
sobrenome Karsten e mudou-se para Potsdam, na região da antiga Alemanha
Oriental, onde vive até hoje.

Ekaterina soma cinco medalhas em Olimpíadas: além dos dois ouros, foi prata
em Atenas-2004 e bronze em Pequim-2008 e Barcelona-1992, esta última competindo
no skiff quádruplo. Em Londres-2012, terminou na quinta colocação, disputando a
Final A. A eliminação nas semifinais na Olimpíada do Rio foi tão decepcionante
que, na sexta-feira em questão, a remadora nem sequer quis falar com os
jornalistas de seu próprio país ? algo incomum, segundo Nick Stula, repórter da
TV Belarus. Todos ficaram esperando por cerca de uma hora e meia na zona mista,
área pela qual os atletas costumam transitar após as competições para atender à
imprensa de todo o mundo.

A remadora, primeiro, passou direto com seu barco e foi para os vestiários do
Estádio de Remo da Lagoa. Um membro da comissão técnica bielorrussa garantiu que
ela voltaria. Depois, a mensagem foi que Ekaterina decidira treinar
imediatamente após a eliminação na semifinal, de modo a se preparar para a Final
B no dia seguinte. Por fim, veio um fora delicado: a remadora estava recebendo
uma massagem e precisava descansar. Quarto dia de remo na Lagoa

? Ficamos desapontados. Yuriy Rodionov, o técnico principal da equipe de
remo, diz que o erro de Karsten foi competir em um barco individual. Ele queria
colocá-la no double skiff (barco de dupla), mas Norbert Laderman, o treinador
alemão de Ekaterina, convenceu ela de que poderia disputar medalhas no single
skiff. Por isso, esperávamos que ela brigasse por uma medalha aqui no Rio ?
lamentou Stula.

ESPÍRITO OLÍMPICO EM BAIXA

Embora a remadora viva fora de Bielorrússia há quase duas décadas, Stula
garante que a idolatria por Karsten se mantém em alta no país. A própria
Ekaterina não descarta trabalhar futuramente como treinadora ou até dirigente
para a equipe nacional de remo, mas hesita quando indagada se voltaria ao país ?
a família, segundo ela, está adaptada à Alemanha. Certeza, contudo, ela tem uma:
os Jogos do Rio foram sua última Olimpíada:

? Não vou para Tóquio-2020 de jeito nenhum. De todas as sete Olimpíadas que
disputei, a do Rio foi a pior em termos de instalações para os atletas.

Ekaterina começou sua trajetória olímpica após uma década de boicotes dos EUA
e da União Soviética aos Jogos sediados por um e outro, seguido pelo fim do
bloco comunista. Em uma das voltas que a História proporciona, o fim de sua
trajetória acontece em meio ao banimento massivo de atletas da Rússia, antiga
liderança soviética, devido às acusações de doping institucional.

O papel abertamente pró-banimento dos EUA voltou a esquentar os ânimos da
adormecida rivalidade da Guerra Fria. Ekaterina expõe seu incômodo:

? Conversei com jornalistas russos que me disseram já estarem acostumados,
mas eu não. Realmente não sinto o espírito olímpico nestes Jogos.