Cotidiano

Só manobras e clientelismo sustentam Cunha

Os seis meses de tramitação, apenas no Conselho de Ética, do pedido de cassação do deputado suspenso Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não são um recorde qualquer. Ele está sendo estabelecido à custa de muita manipulação e manobras engendradas pelo acusado e seguidores na Câmara, sem qualquer escrúpulo.

Atingido pela Operação Lava-Jato, em que há depoimentos e mesmo provas de que o deputado pressionou para receber propinas geradas por negócios na Petrobras ? com o dinheiro sendo depositado em contas na Suíça ?, Eduardo Cunha, já presidente da Casa, compareceu à CPI da Petrobras e nela garantiu não ser dono de qualquer conta no exterior. Passou pouco tempo até o Ministério Público suíço remeter à Procuradoria-Geral da República provas da existência delas: fichas cadastrais, cópias de passaporte, entre outras provas irrefutáveis.

Mas o deputado não desiste. E para isso tem advogados, certamente bem pagos. A versão rocambolesca do deputado é que as contas, por serem de um trust ? um ente jurídico criado, geralmente por razões de sigilo e/ou tributárias, para deter patrimônios no exterior ?, não podem ser consideradas dele, apenas um ?beneficiário?. Ora, o trust não substitui o dono real, e este deveria ter declarado a existência das contas ao Fisco.

Apesar de todos os obstáculos criados por Cunha, o relatório do pedido de sua cassação, do deputado Marcos Rogério (DEM-RO), foi, enfim, lido na quarta-feira, com a única conclusão aceitável: pela cassação de Cunha. O relatório ainda será votado na Comissão.

Continuará não sendo fácil, porque mesmo com o mandato suspenso pelo STF, a pedido do MP, e, por consequência, destituído da presidência da Casa, Cunha se mantém ativo na liderança de uma bancada do baixo clero.

Há tempos não se tem dúvida de que o deputado usou os poderes de parlamentar, de líder de bancada e presidente da Casa em benefício próprio. Inclusive pecuniário. Num dos processos que estão no Supremo, com o ministro Teori Zavascki, relata-se em detalhes como o deputado pressionou a Samsung Industries a pagar-lhe US$ 5 milhões, para ele não atrapalhar um contrato de fornecimento de navios-sonda à Petrobras.

Cunha usava deputados de sua bancada particular (no caso, Solange Almeida, hoje ex-deputada, atual prefeita de Rio Bonito, interior fluminense) para emperrar o contrato, com pedidos de esclarecimentos sobre o negócio, via Comissão de Fiscalização e Controle. Conseguiu o dinheiro.

Apenas os deputados poderão cassá-lo. A torcida é para que a robustez do que tem sido provado contra ele na Lava-Jato, material incluído no relatório do Conselho, vá desidratando seu poder. Infelizmente, o Congresso, principalmente a Câmara, reflete uma péssima legislação eleitoral, que dá espaço a legendas nanicas de aluguel, manipuladas com facilidade. Eduardo Cunha é a expressão viva desta distorção.