Cotidiano

Bill Murray defende ?Rock em Cabul?: ?Não faço filmes para ficar famoso ou rico?

Rock em Cabul2.jpgMARRAKECH – Mesmo com os primeiros sinais de fracasso de ?Rock em Cabul?, seu mais recente longa-metragem de ficção, que estreia nesta quinta nos cinemas brasileiros, Bill Murray se recusou a abandoná-lo à própria sorte. Dois meses depois da estreia da comédia musical nos Estados Unidos, em outubro, e poucas semanas após os atentados que mataram mais de 120 pessoas em Paris, o ator americano estava no Marrocos promovendo o filme, cuja trama envolve guerrilheiros, prostitutas, traficantes de armas e estrelas de reality shows do Afeganistão, no conturbado Oriente Médio.

Tal desprendimento dá uma ideia da dimensão do sentimento de lealdade de Murray, ícone da cultura pop forjado por filmes como ?Os Caça-fantasmas? (1984) e ?Feitiço do tempo? (1993), aos projetos nos quais acredita e se envolve, independentemente do desempenho deles de crítica ou de bilheteria. No filme, ele interpreta Richie Lanz, agente musical decadente que, demitido pela cliente durante viagem de negócios a Cabul, vê uma chance de redenção no talento de uma jovem muçulmana, que aspira a ser a primeira mulher a competir no programa ?Afghan star?, o ?American idol? local.

? Não faço filmes para ficar famoso ou rico. Faço filmes para que as pessoas os vejam, mesmo que acabem não gostando deles. Até porque não posso obrigar ninguém a gostar dos meus trabalhos. Mas, quando alguns desses filmes têm algo especial a dizer, faço o possível para que o máximo de pessoas o conheçam, que deem uma chance a ele ? explicou o ator de 65 anos durante o Festival de Marrakech, em dezembro passado, onde foi homenageado pelo conjunto da carreira. ? Também queria ver como esse filme seria recebido no mundo muçulmano. Os muçulmanos americanos entenderam o espírito da história e se divertiram.

PROVOCAÇÕES CULTURAIS

Dirigido por Barry Levinson (?Bom dia Vietnã?, de 1987) e escrito por Mitch Glazer (?Os fantasmas contra atacam?, 1988), ?Rock em Cabul? é uma comédia alimentada pelas extravagâncias de seu protagonista e por provocações culturais. Largado em Cabul pela ex-cliente, Richie circula pelas perigosas ruas da capital com traficantes de armas (Danny McBride e Scott Caan). No momento seguinte, está ao lado de um mercenário de pavio curto (Bruce Willis), negociando munição com o líder de um pequeno vilarejo no meio do deserto. A descoberta da voz de Salima (Leem Lubany) dá a ele um novo sentido na vida, mesmo com riscos para ambos.

? Todo filme que envolve um certo grau de idealismo é um pouco complicado de se fazer entender. Não queríamos pregar nada, ou advogar em favor de alguma coisa. ?Rock em Cabul? quer contar uma história que, apesar de fincada na realidade, transmite algum otimismo ? analisou Murray, que, entre outras extravagâncias de seu personagem, canta uma versão de ?Smoke on the water?, da banda Deep Purple. ? Acho que mostramos as fraquezas desse cara, que não é nenhum super-homem, que se vê preso em uma situação complicada e tenta encontrar uma saída. Diria que sim, é uma história ardilosa, difícil de fazer.

A verdade é que ?Rock em Cabul? deve muito ao carisma de Murray. Egresso do televisivo ?Saturday Night Live?, o ator consegue expressar seu lado mais divertido mesmo em ?Encontros e desencontros? (2003), de Sofia Coppola, filme que ajudou a descolá-lo da imagem do mero comediante boa-praça. Durante os três dias que passou em Marrakech, demonstrou extrema paciência com o próprio status de celebridade: tirou fotos com fãs, deu autógrafos e até circulou pela cidade sem o habitual aparato dedicado aos convidados do festival. Nem os excessos inspirados pela mídias digitais o tiram do sério.

? Não quero me sentir paralisado por causa da fama, de toda a atenção que recebo. Como aconteceu na festa aqui, em minha homenagem. Estávamos dançando, nos divertindo, e todo idiota que tinha um celular na mão ficou tirando fotos e filmando. É muita loucura ? lembrou Murray, que mora com as quatro filhas do segundo casamento em Charleston, na Carolina do Sul, longe dos holofotes de Hollywood. ? A única vantagem de ser famoso é quando você precisa levar um filho ao hospital. Aí você recebe toda a atenção do mundo.

VONTADE DE DIRIGIR NOVAMENTE

O prestígio pode lhe ser útil também em outro departamento: o ator gostaria de voltar a dirigir um filme. Tomou gosto pela experiência mais de 25 anos atrás, quando precisou assumir a codireção (com Howard Franklin) de ?Não tenho troco? (1990), comédia sobre dois ladrões atrapalhados que atuam em Nova York.

? Eu e o Howard, que também assinava o roteiro, achávamos a história muito engraçada, mas não conseguimos encontrar ninguém de quem gostássemos para dirigi-la. Escalamos atores que foram descobertos, na época, antes de ser tornarem os astros que são hoje, como Tony Shalhoub, Stanley Tucci, Geena Davis, Randy Quaid. Tenho muito orgulho daquele filme ? lembrou Murray. ? Gostei de dirigir, porque gosto de trabalhar com atores. Achava que iria continuar dirigindo, mas não aconteceu. Mas já está na hora de dirigir novamente. Tenho um bom olho para isso.