Esportes

No computador, Jesus leva chave para ouro inédito da canoagem no Rio

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Jesus Morlán, espanhol de 49 anos, rechaça o rótulo de perfeccionista. Mas é difícil não ter essa impressão logo nos primeiros minutos de contato com o treinador dos canoístas Isaquias Queiroz e Erlon Souza, esperanças de três medalhas para o Brasil na Olimpíada do Rio. Morlán é daqueles que presta atenção até ao espaço que as planilhas com planejamento de treinos e competições ocupam em seu computador ? cerca de 15 gigabytes, ele estima. Em uma conta simples, são cerca de mil documentos detalhando rivais e locais de provas. Segredos Olímpicos: A canoagem como você nunca viu

? O que importa não é o computador, e sim o que você consegue passar para os atletas. Fui contratado para levar os meninos a uma medalha olímpica. Não vamos colocar desculpas nem escapar da pressão. Daqui a gente tem que sair com medalha ? afirma Jesus. Links canoagem

O objetivo, embora inédito para a canoagem, não é mistério: está até na mensagem pessoal de Jesus no aplicativo Whatsapp, com três medalhas douradas ao lado de três bandeiras brasileiras.

FAMA ESPALHADA

Antes de embarcar no projeto olímpico do Brasil, Morlán treinou o espanhol David Cal, ouro em Atenas-2004 na C1 1000m, prova que Isaquias disputará no Rio, e dono de outras quatro medalhas olímpicas, todas de prata. A fama de perfeccionista acompanha o treinador em qualquer lugar: do Rio de Janeiro, antiga base de treinos da canoagem, até Lagoa Santa (MG), a casa atual:

? Ele quer ter domínio total sobre a parte climática, a competição e a rotina do atleta. Não só a questão disciplinar, mas também a perspectiva de vida deles ? diz Marcelo Freitas, supervisor de remo do Flamengo quando Isaquias e Erlon treinaram pelo clube, em 2012.

? O Jesus é muito focado ? confirma Frederico Pessoa, diretor municipal de esportes de Lagoa Santa. ? Até evitamos aparecer nos treinamentos no último mês, para não atrapalhar.

GOSTO POR COMPETIR

À primeira vista, a fisionomia de Jesus Morlán lembra a de José Mourinho, o treinador português de futebol, conhecido justamente pela obsessão com os detalhes. Quando perguntado sobre sua filosofia de trabalho, Morlán cita o brasileiro Bernardinho, do vôlei, outro exemplo da mesma linha:

? Acho que todos os melhores técnicos do mundo são perfeccionistas. O Bernardo é assim. Não é uma coisa só minha. Eu não me considero nada. Trabalho muito. Tudo está pensado, tudo é planejado ? garante o espanhol, que não vê a hora do início das competições de canoagem, na segunda-feira:

? Agora chegou a melhor parte dos quatro anos, que é competir. Isso é o que eu mais gosto.

MUDANÇA PLANEJADA

Jesus Morlan chama para si a responsabilidade de algumas mudanças importantes na trajetória da canoagem para a Olimpíada do Rio. Uma delas, segundo o próprio treinador, foi uma reorganização do calendário de competições na Lagoa Rodrigo de Freitas, para que as provas de maiores distâncias das quais Isaquias participa, a C1 1000m e a C2 1000m ? esta última ao lado de Erlon Souza ? fossem intercaladas pela C1 200m, mais curta.

? Teremos o C1 200m no meio do calendário, que foi uma troca pedida por nós no programa olímpico, uma troca que beneficia o Brasil. O Isaquias se cansaria muito se competisse duas provas de 1000 metros em sequência ? aponta.

A mudança mais importante, porém, aconteceu há dois anos: quando Jesus Morlán completava uma temporada à frente da equipe brasileira, que ele havia assumido em abril de 2013, a canoagem masculina de velocidade mudou-se de mala e cuia para Lagoa Santa, cidade com cerca de 50 mil habitantes em Minas Gerais. À época, Isaquias tinha 20 anos e já conquistara seu primeiro título mundial. O treinador agiu rápido para blindar seus atletas.

? É uma cidade pequena, sem grandes tentações, e que fica próxima ao aeroporto (de Confins, em Belo Horizonte). Além disso, a temperatura e o vento são muito semelhantes aos do Rio de Janeiro. Houve uma pesquisa do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) comparando o Rio a Lagoa Santa, com 25 anos de dados. Deu a mesma coisa. Por isso o local foi escolhido ? esclarece o espanhol, que ainda cita as vantagens de ter uma lagoa exclusiva para treinamentos. ? Temos duas raias orientadas para os quatro pontos cardeais. Pode ventar como quiser que a gente escolhe uma raia para treinar. Treinamos com vento lateral, semelhante ao do Rio de Janeiro.

RECOLHIMENTO EM MINAS

O Flamengo foi uma das últimas casas dos canoístas da seleção brasileira antes da mudança para Lagoa Santa ? eles também chegaram a treinar no interior de São Paulo e até em Curitiba nos últimos dois ciclos olímpicos. Marcelo Freitas, supervisor de remo do rubro-negro carioca e um dos responsáveis por costurar o acordo para Isaquias, Erlon e companhia usarem o clube como base durante os treinamentos na Lagoa Rodrigo de Freitas, esclarece que a ideia da mudança para uma cidade pacata em Minas Gerais partiu do próprio Jesus.

? Ele não achou as condições do Rio de Janeiro as mais adequadas. É uma cidade com muitos atrativos, sem dúvida. Claro que a molecada percebia isso ? lembra Freitas.

Frederico Pessoa, diretor municipal de esportes de Lagoa Santa, lembra que não ocupava o posto quando a canoagem se mudou para a cidade. Mas ele constatou, ao longo dos últimos anos, alguns dos possíveis atrativos identificados por Jesus Morlán:

? O fato de a cidade ser pequena foi um atrativo. Estamos falando de jovens de 20 e poucos anos. Com esse estrelato repentino, no meio da zorra que é uma cidade grande, existiu uma grande preocupação com oba-oba mesmo. É repórter atrás o tempo inteiro, um monte de gente procurando. Os atletas estranharam essa mudança em um primeiro momento, mas esse foi o plano do Jesus.

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