BRASÍLIA – A rapidez com que o ex-ministro das Relações Exteriores José Serra precipitou sua saída do ministério e agilizou sua posse no mandato de senador, da manhã desta quinta-feira, está intrigando até mesmo os amigos mais próximos. O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), foi comunicado meia hora antes do ex-chanceler tucano entregar a carta de demissão ao presidente Michel Temer, ontem a tarde.
Todos sabiam das dores incapacitantes e problemas causados pela complicação na recuperação da cirurgia de coluna que, segundo Serra dizia, estavam tornando simples despachos insuportáveis porque não conseguia ficar em pé nem sentado. Essa semana o quadro físico piorou com uma cirurgia nos olhos, feita no domingo, que lhe deixou com fortes hematomas nas pálpebras.
Surpreendido com a rapidez dos fatos, Aécio ainda não se pronunciou até agora e os tucanos procurados pelo GLOBO dizem que ainda estão tentando entender o que aconteceu. Serra tomou posse logo cedo no Senado e, ao contrário do que se previa, não se licenciará para cumprir os quatro meses de um programa sério de fisioterapia, recomendado pelos médicos que o operaram.
? Ninguém entendeu ainda o que precipitou isso tudo ? disse um dirigente do PSDB.
Aécio está cuidando das articulações para a substituição de Serra no Itamaraty. Além dos senadores Aloysio Nunes (SP), Tasso Jereisssatti (CE) e o suplente José Aníbal, corre na cúpula do ministério o nome do embaixador nos Estados Unidos, Sérgio Amaral.
Serra havia comunicado ao suplente José Aníbal que conversariam nos próximos dias para acertarem a posse no Senado, provavelmente depois do carnaval. Mas hoje logo cedo encaminhou ofício a Mesa da Casa informando que estava retomando o mandato.
A única pessoa que sabe os detalhes da decisão de Serra é o deputado Jutahy Magalhães (PSDB-BA), seu mais próximo aliado e confidente. Na noite da última terça-feira o deputado baiano jantava na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), quando, já na madrugada de quarta-feira, foi chamado por Serra para ir à sua casa.
Lá chegando, Serra lhe disse logo no início da conversa que tinha decidido sair do ministério. Mostrou-lhe um laudo pós operatório que recomendava não fazer viagens longas nem levar solavancos. A cirurgia para corrigir um problema em duas vértebras era inadiável pois poderia deixar-lhe paralítico, além das dores muito fortes que estavam dificultando até mesmo a ida para despachos no Ministério. O risco da paralisia foi afastado, mas as dores aumentaram.
? Com esse laudo e você viajou para a Alemanha? ? assustou-se Jutahy.
? Viajei para ver como reagia. Mas voltei péssimo. Estou decidido. Vou sair e ajudar o Michel no Senado ? respondeu Serra, informando que não tinha como honrar as quatro viagens internacionais previstas para os próximos meses, uma dela para o Vietnã.
Jutahy então lhe aconselhou falar o mais rapidamente com Michel Temer, temendo que a decisão vazasse antes do comunicado ao presidente. Esperava, entretanto, que isso acontecesse nessa quinta-feira. Ontem, como tudo mundo, foi surpreendido com a notícia da entrega da carta de demissão.
? Eu senti que ele devia sair desde o dia 2 de fevereiro, na posse do Imbassahy e da Luislinda, no Planalto. Ele estava muito abatido. Disse que estava sentindo dores horrorosas e a situação era insuportável, não conseguia ficar em pé nem sentado. Estava indo dormir as quatro da manhã e tendo que acordar as sete. Dormir tarde não era problema, mas não tinha como continuar despachando com dor ? contou Jutahy.
Serra também foi aconselhado a não indicar ninguém para a vaga deixada no Itamaraty.