Enquanto 2016 e seu desfile de más notícias não acabam, ganha força o coro que pede o fim não do ano, mas do mundo. Neste ciclo pródigo em surpresas ruins, muitos têm encerrado seus pitacos sobre crises mundiais e particulares com um sonoro ?Vem, meteoro!?. Seja com tom pessimista ou crença no recomeço da existência, a expressão pegou.
Nas redes sociais, o pedido apocalíptico ganhou ainda mais força. Entre textões, tweets e posts, verifica-se que o clamor cósmico é motivado por duas categorias bem diversas de acontecimentos. De um lado, o #vemmeteoro conclui lamentos sobre notícias que dominam o noticiário, como acidentes aéreos, crimes chocantes, mortes de celebridades, escândalos de corrupção e resultados eleitorais contrários à ideologia de quem escreve.
Outra vertente ? às vezes irônica, às vezes simplesmente sem noção ? é a das queixas motivadas por dramas cotidianos. Mas bem cotidianos mesmo. Exemplos abundam, como revela uma colheita feita nos últimos dias na rede de microblogs Twitter: ?Meu deus eu nao suporto ignorância!!!!!! #vemmeteoro?, ?Vc recém vive uma situação chata e em todos os lugares tocam música que te lembram essa situação… #vemmeteoro?, ?Acabo de morder um bombom de chocolate recheado com… PASSAS. Esse mundo tá perdido. Vem, meteoro!? e por aí vai.
Em meio a tantas manifestações há inclusive pedidos cientificamente corretos. Em 17 de novembro, astrônomos amadores usaram a expressão enquanto aguardavam uma chuva de meteoros da constelação de Leão.
Fred Coelho, professor de Literatura e Artes Cênicas da PUC-Rio, escreveu a respeito da frase-meme em sua coluna no GLOBO: ?[O meteoro é] algo divino, mas não proveniente de um Deus exterminador. Viria do espaço infinito que não explicamos ? mesmo o contemplando com olhos vorazes em busca de saídas.? Ele completa:
? Uma metáfora destrutiva como uma espécie de ?fim universal de todas as dores?, mas que venha do céu. Como se a nossa autodestruição em conta-gotas não bastasse. O peso dos fatos é tanto que ao menos o desejo retórico desse fim já alivia algumas dores.
SUCESSO METEÓRICO
No meio do ano, a turma de bacharelado do Faculdade CAL de Artes Cênicas criou o espetáculo ?Vem, meteoro! ? Missão BT9? para comemorar o encerramento de seu curso. Na peça, a plateia ?interpretava? um paciente em coma que precisava ser acordado pelos atores, e tudo acabava com a queda de um corpo celeste. A direção foi do premiado Pedro Kosovski, que esclarece: o título não é seu.
? O nome da peça veio de um improviso da (atriz) Cristina Flores. Nos ensaios, ela tacava bolinhas de papel e em tom de terror falava: ?Vem, meteoro!? ? conta Kosovski, que não é íntimo da expressão. ? Me parece que fala do fim dos tempos, quando é melhor antecipar o fim do que viver sangrando na crise. Com certeza, a Cris vai saber melhor do que eu.
Com a palavra, a especialista.
? Tem gente que torce pelo fim para que tudo termine e tem gente que torce pelo fim pra que tudo recomece. Eu já nem sei se algo precisa acabar para começar de novo. Acho que pode ser concomitante! Tudo ao mesmo tempo, agora. Vem, meteoro ? diz Cristina Flores, que também ajudou a conceber o final da peça. ? Na cena final, o meteoro batia e a Soraya Ravenle morria em câmera lenta, cantando ?Let it go?, aquela música do ?Frozen?. ?Let it gooo… Let it gooo…? Me parece um bom jeito de receber o fim do mundo.
UTILIDADE PÚBLICA
Hashtags à parte, os verdadeiros apocalípticos se perguntam: qual é a chance real de um meteoro atender ao pedido e… vir?
Antes de responder, Luis Guilherme Haun, astrônomo do Planetário do Rio, oferece um minidicionário. Anote aí: o que muitos chamam de meteoro, uma pedra no espaço, chama-se asteroide. Quando um asteroide entra na nossa atmosfera, pegando fogo e se desmanchando, vira meteoro (que é a mesma coisa que estrela cadente). Quando o objeto é grande o suficiente para colidir com a Terra, chama-se meteorito.
Quem está de olho nos asteroides que podem virar meteoros e, com azar, meteoritos são os telescópios do programa NEO (de Near Earth Objects, ?objetos próximos da Terra?), comandado pela Nasa. De todos os 15 mil objetos monitorados, apenas um deles, o asteroide 2016WJ1, inspira cuidados. Mas nada de pânico: na escala de Turim, onde 0 é a possibilidade nula de choque com a Terra e 10 a certeza do impacto, o pedregulho recebe um 1.
? O que quer dizer esse ?1?? ? pergunta o próprio astrônomo Haun, percebendo certa ansiedade em seu interlocutor. ? É uma possibilidade muito pequena, é mais fácil acertar na MegaSena. Logo ele vai novamente cair para 0 na escala de Turim. Em vez de pensar nisso, melhor olhar o carro na hora de atravessar a rua.
Ou, como não custa nada, postar #nãovemmeteoro.