“Nasci em Belém do Pará, e me formei engenheira agrônoma na antiga Faculdade de Ciências Agrárias do estado. Sou pesquisadora da Embrapa há 28 anos. Moro em Campina Grande (PB), trabalhando num projeto sustentável de plantio de algodão colorido agroecológico em comunidades no semiárido.”
Conte algo que não sei.
Há pessoas que não sabem que existe um tipo de algodão naturalmente colorido, que sai da planta de fibra colorida. E que essa espécie é uma tecnologia ecologicamente correta e pode ser usada na agricultura tradicional e numa agricultura agroecológica. Esse algodão produzido de forma sustentável está atravessando fronteiras. A moda sustentável está na Europa, nos Estados Unidos, e o preço é diferenciado. Compradores da indústria têxtil têm interesse, sim, em algodão colorido orgânico do Brasil, produzido em projetos que trabalham o social.
A demanda por produtos orgânicos vem crescendo?
Existe um acréscimo em torno de 30% por ano na procura por produtos orgânicos de qualquer natureza, de alimentos a fibras.
O que é uma agricultura agroecológica?
Na agricultura agroecológica, não pensamos no produto em si, mas no meio ambiente como um todo. O cultivo consorciado (do algodão com outras espécies) beneficia o equilíbrio da entomofauna, ou seja, dos insetos e animais que estão ali, das abelhas, por exemplo, que são importantes. É feito um arranjo produtivo local em função da cadeia do algodão. Na agricultura orgânica, usam-se produtos naturais, mas para ser um projeto agroecológico você tem de produzir usando insumos naturais da própria comunidade, da sua fazenda. Nada pode vir de fora. Você tem que trabalhar o esterco a partir dos animais que cria, trabalhar a dimensão do ambiente. Até o lixo produzido na comunidade: você não pode ser orgânico e ter um saco de lixo espalhado. O agroecológico é um estilo de vida.
Como funciona esse Projeto de Vida Comunitário com a agroecologia?
Começamos a desenvolver no ano passado, junto a comunidades rurais locais, o Projeto de Vida Comunitário, com a participação de vários órgãos. Estamos trabalhando em Pernambuco, Paraíba e Ceará, onde identificamos uma comunidade ou um assentamento.
Como funcionam esses projetos agroecológicos?
Trabalha-se a área social, com a organização da comunidade, e a parte produtiva, com o apoio técnico no campo. A partir daí, essas comunidades se tornam unidades de referência em tecnologias do plantio consorciado do algodão com culturas alimentares como gergelim, amendoim, milho ou feijão.
Onde eles estão se desenvolvendo?
No semiárido, um na Paraíba, na comunidade Quilombo Serra Feia; no Ceará, na comunidade rural de Irapuá; e em Pernambuco, na comunidade Pilãozinho. O Projeto de Vida Comunitário é conhecer o passado, saber o que está sendo feito no presente, para traçar a meta do futuro.
A região do semiárido é castigada pela seca. Como os agricultores reagem à proposta?
Com a seca, eles ficam com uma baixa autoestima muito forte. Quando mostramos o projeto e o que eles podem sonhar em suas vidas, é uma emoção, uma paixão. Eles têm pouco para cultivar a terra, e a água é cada vez mais escassa. E o algodão tem todas as condições para se desenvolver nessas regiões, porque tolera bem a falta de água. É um sonho real de uma comunidade.
O que a motivou a participar?
É a emoção de estar num ambiente tão adverso e ver que os agricultores querem ainda lutar. É uma questão de cidadania.