A vacinação contra a covid-19 é tida como a medida mais efetiva para controlar a pandemia de covid-19 no mundo todo. Mas não significa que ela conseguirá, sozinha, dar fim à doença, tampouco evitar mortes. Casos de pessoas que tomaram as duas doses preconizadas e se infectaram, algumas morreram, alimentam o discurso antivacina. A médica infectologista Juliana Gerhardt Moroni conversou com o Jornal O Paraná e explica essa e outras dúvidas acerca da vacinação contra a covid. Docente de Medicina da Unioeste e preceptora da Residência Médica em Clínica Médica do HUOP (Hospital Universitário do Oeste do Paraná), ela afirma: “Vacinas são umas das maiores armas da medicina contra doenças infectocontagiosas”.
O Paraná – Qual a diferença entre as três vacinas aplicadas atualmente no Brasil?
Juliana Gerhardt Moroni – Coronavac: vacina de vírus inativado (ou “morto); ao entrar no organismo, gera uma resposta imunológica de anticorpos e células de defesa; é a forma mais comum de produzir vacinas (como a da gripe/H1N1); são duas doses com intervalo de 3 semanas.
AstraZeneca: vacina de adenovírus não replicante – possui um vírus vivo inativado (ou seja, não consegue se replicar), o adenovírus, que carrega uma proteína do vírus SARS-COV-2; quando o nosso organismo identifica esse adenovírus, inicia uma resposta imunológica muito forte, por isso o maior índice de reações adversas nesta vacina; são duas doses com intervalo de 12 semanas.
Pfizer: vacina de RNA mensageiro; não há utilização de vírus, mas de uma molécula de RNA mensageiro viral que simula uma proteína do vírus SARS-COV-2 e que vai estimular e ensinar nossas células a criar uma defesa contra o vírus; são duas doses com intervalo de 12 semanas.
O Paraná – “Por que algumas pessoas ainda morrem mesmo após tomar as duas doses?”
Juliana – Infelizmente, nenhuma vacina apresenta 100% de eficácia contra uma doença; nos estudos são avaliados vários desfechos, como: infecção assintomática, infecção sintomática, infecção grave que leve a necessidade de hospitalização, e mortes. Essa porcentagem tem variado bastante entre os estudos e depende também do tipo de população estudada (principal fator que leva a diferentes resultados é a idade). Já é sabido de outras vacinas que os idosos, por exemplo, apresentam uma taxa de resposta menor. E ainda é importante lembrar que são necessárias as duas doses, com a máxima resposta ocorrendo 14 dias após a segunda dose. Em uma média, estamos observando uma redução de 80 a 90% nas mortes, porém como dito, infelizmente essa proteção não é 100%. Enquanto houver alta circulação viral, muitas pessoas transmitindo, e ainda poucas pessoas vacinadas, as infecções e mortes vão continuar ocorrendo, mesmo em vacinados (porém, como já está sendo observado, em uma proporção muito menor).
O Paraná – As vacinas impedem transmissão e infecção pelo vírus? O que elas previnem?
Juliana – Se uma pessoa vacinada for infectada, ela tem uma chance cerca de 50% menor de transmitir o vírus aos outros, porém ainda pode transmitir, principalmente para pessoas não vacinadas ou parcialmente vacinadas. Como falado, mesmo vacinado, ainda há risco de ser infectado pelo vírus, porém há uma redução de mais de 80%. O principal objetivo das vacinas é reduzir casos graves, hospitalizações e óbitos, com variação entre os estudos, chegando a 95% menos risco de morrer da doença (porém não 100%).
O Paraná – Quais cuidados as pessoas precisam manter, mesmo tomando as duas doses da vacina?
Juliana – Quem já está vacinado com as duas doses há mais de 14 dias está em grande parte imunizado. Porém, em nosso país, ainda muitas pessoas não receberam a vacina. Por isso, a circulação viral ainda é alta, e a recomendação é que os cuidados sejam mantidos: uso de máscaras, distanciamento, evitar aglomerações e locais fechados, higienização constante das mãos. Um grupo pequeno, no qual todos estão completamente vacinados, pode se encontrar em locais abertos e bem ventilados. Mesmo se vacinada, uma pessoa que está sendo exposta ao vírus (trabalhando, viajando, frequentando restaurantes e festas) deve evitar contato com idosos, mesmo que vacinados.
O Paraná – Qual a importância de as pessoas tomarem a vacina mesmo que a eficácia não seja 100%?
Juliana – Vacinas são umas das maiores armas da medicina contra doenças infectocontagiosas. Elas são uma medida de saúde pública, ou seja, estou protegendo o indivíduo que foi vacinado, mas também toda a população, já que, quando uma comunidade atinge pelo menos 75% de todos vacinados, a circulação viral tende a reduzir de forma muito importante. Quando estamos diante de uma doença, como a covid-19, que não possui um tratamento antiviral eficaz, a única forma de conter a pandemia é com vacinação em massa, e, até que esta seja atingida, aplicação rígida das medidas de prevenção: isolamento imediato de todas as pessoas com sintomas e seus contatos, uso contínuo de máscaras de boa qualidade, não realizar aglomerações, ventilar muito bem os ambientes, e intensificar a higiene das mãos.