Cascavel – Mobilizações de três décadas levaram o clamor do oeste do Paraná até a Capital e pressionaram o Executivo estadual a atender a uma reivindicação que custou dezenas de vidas e representou um símbolo do esquecimento por parte dos governantes: a intervenção de um dos maiores entroncamentos rodoviários do País, o Trevo Cataratas, será finalmente executada com recursos do acordo de leniência entre o Ministério Público Federal e a Ecocataratas, quando esta assumiu existência de atos de corrupção e lavagem de dinheiro relacionados ao contrato de concessão por meio do pagamento de propinas para mudanças no contrato, benéficas à concessionária desde 2000. O acordo foi homologado pela Justiça em setembro e agora as obras foram anunciadas.
A passagem em nível vai facilitar o fluxo de cerca de 30 mil veículos que passam pelo local por dia. A obra integra um pacote de oito projetos que serão executados com recursos do acordo de leniência de R$ 400 milhões, dos quais R$ 150 milhões são para investimentos que a empresa que controla a Ecovia e a Ecocataratas fará até 2021 ao longo da BR-277, principal corredor rodoviário e de exportação do Paraná.
Considerada uma das maiores obras urbanísticas do País, a execução do Trevo Cataratas terá que ser “com trabalhadores 24 horas por dia”, afirma o governador Ratinho Júnior (PSD). O canteiro de obras terá que funcionar noite e dia para que até 27 de novembro de 2021 – quando se encerra o contrato de concessão – a intervenção esteja pronta. “É uma obra aguardada há anos. Uma intercessão em desnível. É uma obra de grande complexidade, com três rodovias e de acesso a uma cidade com 300 mil habitantes”, afirma o secretário de Infraestrutura do Estado, Sandro Alex.
Reestruturação
O projeto do viaduto do Trevo Cataratas contempla diversas novas faixas e sobreposições, com trincheiras e elevações, substituindo os atuais semáforos. A complexidade se dá também pelo fluxo de veículos que não poderá ser interrompido.
A obra está contemplada em duas fases – a primeira a um custo de R$ 80 milhões e a segunda de R$ 20 milhões – mais R$ 30 milhões em desapropriações de áreas ao redor.
O custo representa exatamente a verba prevista no acordo. O problema é que há mais obras inclusas no pacote. Pelo que informa o Estado, o valor efetivo da obra não foi fechado, mas “terá de ser enquadrado nos R$ 130 milhões destinados para intervenções no trecho da BR-277”.
E quando começa?
A grande questão que ficou em aberto é quando as obras começarão, na prática. Isso porque há uma série de prazos que devem retardar o início das atividades.
Segundo a Secretaria de Infraestrutura de Logística, as concessionárias têm pelo menos seis meses para apresentação dos projetos e, quando apresentados, o DER verificará as planilhas e os serviços a serem executados, repassando os ajustes necessários. O início das obras só ocorre após aprovação dos projetos executivos.
Por nota, a Ecocataratas e a Ecovia informam que têm até 1º de julho de 2020 – dentro do prazo de 210 dias estabelecido pelo Acordo de Leniência – para apresentar os projetos executivos das obras prioritárias, conforme previsto no Parágrafo 11º da Cláusula Sexta do referido Acordo. “Após a aprovação dos projetos executivos e dos orçamentos das obras pelo Poder Concedente, as obras poderão ser iniciadas”.
Pacote inclui marginais e terceiras pistas
O acordo de leniência firmado entre o MPF e a Ecorodovias já homologado pela Justiça definiu que, dos R$ 400 milhões a serem devolvidos pela concessionária, R$ 220 milhões ficaram para redução de 30% da tarifa, R$ 150 milhões em obras rodoviárias e R$ 30 milhões em multas.
São R$ 130 milhões do trecho da Ecocataratas (responsável por 543 quilômetros da BR-277 de Foz a Guarapuava) e R$ 20 milhões da Ecovias (296 quilômetros na BR-277 em Paranaguá).
Além do Trevo Cataratas, o acordo incluiu a construção de marginais na BR-277 em Foz do Iguaçu e terceiras faixas entre Cascavel e Guarapuava, esta última consumirá até o “último centavo do acordo”, diz o secretário de Infraestrutura, Sandro Alex. Nem os locais nem a extensão das terceiras faixas foram divulgados por enquanto.
De acordo com o governador Ratinho Junior, a concessionária tem um cronograma a ser executado e já existe uma tratativa com o Ministério da Infraestrutura para que, em caso de atraso, o Trevo Cataratas esteja dentro da nova concessão: “Ou seja, não há risco dessa obra não ser entregue”, disse. “Essa obra terá serviço 24 horas por dia, uma verdadeira força-tarefa. Vamos tentar entregar até 2021”, emendou o secretário Sandro Alex.
Fluxo de obras organizado – A grande dificuldade será organizar a engenharia de tráfego na região por conta do intenso fluxo de veículos: ação que será desempenhada pelo DER (Departamento de Estradas de Rodagem), pela Ecocataratas, pela Polícia Rodoviária Federal e pela Prefeitura de Cascavel. A reunião entre eles deve ser organizada nesta semana. Os detalhes do projeto não foram divulgados pela Ecocataratas, apenas as imagens de como o trevo deve ficar depois de concluído, com algumas passagens de níveis e várias alças.
Projeto defendido por toda a região
A obra de readequação do Trevo Cataratas foi definida como prioritária para o desenvolvimento e o crescimento regional pelo G8, pelo POD (Programa Oeste em Desenvolvimento) e pela Caciopar (Coordenadoria das Associações Comerciais e Industriais do Oeste do Paraná). Em agosto deste ano, essas entidades se reuniram e montaram uma estratégia para que o trevo fosse contemplado com os recursos que seriam devolvidos pela Ecocataratas.
No dia 23 de agosto, elas reuniram deputados da região (Marcio Pacheco, Coronel Lee, Michel Micheletto e o suplente Elio Rusch) para “fechar questão” sobre o assunto e levá-lo em uníssono ao governo do Estado.
Agora, com a obra definida, as entidades defendem que há muito o que avançar no oeste – principalmente em logística -, mas que o Trevo Cataratas representa um passo de reconhecimento do Estado.
“Temos muito a avançar, mas precisamos reconhecer o empenho do governo do Estado, do MPF e de todos os entes públicos, prefeitos e deputados, que se empenharam para que esse dia chegasse”, disse o presidente da Caciopar, Alci Rota Júnior. “Agora, no quesito infraestrutura, falta muito, pois falamos de uma região responsável por 30% da produção estadual”.
Apesar dos transtornos que serão gerados durante os trabalhos, a obra vai beneficiar diversas empresas da região. “É uma questão de sobrevivência das empresas, pois quem trafega pela região enfrenta todo esse problema. Agora teremos um período de turbulências, mas na frente reconheceremos que valeu a pena”, acrescenta Rota Júnior.
Luta de 30 anos
O Trevo Cataratas é um entroncamento que reúne as rodovias BR-369, no sentido de Maringá, a BR-277, entre Guarapuava e Foz do Iguaçu, a BR-467, em direção a Toledo, e a Avenida Brasil, que é principal via de acesso a Cascavel. O governador afirma que o trevo é o principal gargalo logístico do Estado e que a obra será executada em duas fases, com implementação de viadutos e a retirada dos semáforos. “É uma obra emblemática. A população cobrava do Estado há mais de 30 anos”, destacou Ratinho Junior.
O prefeito de Cascavel, Leonaldo Paranhos (PSC), comemora esse passo dado pelo governo: “Muitas famílias choraram nesse trevo com acidentes fatais. Ele também é um gargalo para o desenvolvimento. É uma obra que vai mudar o oeste do Paraná porque Cascavel é um corredor da produção do Paraná, do Mato Grosso do Sul e do Paraguai”.
O novo trevo deverá receber o nome de Alsir Pelissaro, ex-presidente da Cettrans (Companhia de Engenharia de Transporte e Trânsito) que faleceu este ano devido ao câncer.
Empresa não queria executar a obra
O governador Ratinho Júnior ressaltou que as obras anunciadas já deveriam ter sido executadas há muito tempo e que a negociação com a empresa durou quatro meses. Segundo ele, houve muita resistência para que o Trevo Cataratas fosse englobado no acordo. “A empresa relutava em aceitar a obra pelo esforço de engenharia empregado. Foi uma imposição do Estado que o Trevo Cataratas virasse realidade. É uma obra complexa, maior desafio urbanístico que temos no Paraná com entroncamento de três rodovias. A obra é emblemática pelo tempo de espera e possivelmente operários trabalharão 24 horas para entregá-la a tempo”, afirma o governador.
A Justiça Federal do Paraná homologou o acordo de leniência da Ecorodovias em setembro deste ano e a empresa reduziu as tarifas nas seis praças de pedágio em 30%. Os R$ 400 milhões do acordo devem ser pagos até o fim das concessões, em 2021. A concessionária reconheceu o pagamento de propinas para conseguir mudanças contratuais, atos de corrupção e lavagem de dinheiro.
A soma do primeiro acordo de leniência feito com a Econorte, a Ecocataratas e a Ecovias representa R$ 1 bilhão de obras no Estado.
Projetos doados
A concessionária vai doar todos os projetos executivos elaborados, o que permitirá celeridade ao Estado na execução das obras que não foram contempladas. “Nós apontamos obras importantes para o desenvolvimento do Estado. Os critérios foram técnicos e visam reduzir os índices de acidentes e melhorar a capacidade de tráfego e mobilidade”, diz Ratinho Junior. “Essas obras já deviam ter acontecido, mas foram retiradas dos contratos”.
Obras no litoral
Já no caso da Ecovias, que tem R$ 20 milhões em saldo, haverá a duplicação da PR-407 – 800 metros em cada sentido no perímetro urbano de Pontal do Paraná; passarela da Avenida Ayrton Senna – perto de instituições de ensino (Paranaguá); passarela em São José dos Pinhais; alça de retorno para Curitiba entre a BR-277 e a PR-508; e iluminação da BR-277 – cinco quilômetros na chegada ao Porto de Paranaguá.
Novo Anel de Integração terá 4,1 mil quilômetros de rodovias
O Anel de Integração do Paraná será modernizado a partir de 2021. A licitação será feita pelo governo federal e terá 4,1 mil quilômetros de estradas estaduais e federais – o atual tem 2,5 mil quilômetros.
O novo programa de concessões incorpora ao polígono original três estradas estaduais: PR-092 (Norte Pioneiro), PR-323 (Noroeste) e PR-280 (Sudoeste). O leilão também deve abranger os trechos paranaenses das BRs 163 (Oeste), 153 (de Ourinhos a União da Vitória) e 476 (Rodovia do Xisto). O governo federal investiu R$ 60 milhões no projeto.
Pelo cronograma da EPL (Empresa de Planejamento e Logística S.A), contratada pela União para fazer os estudos de viabilidade da nova concessão, a modelagem técnica, econômico-financeira e jurídica será concluída em 2020. O documento vai concentrar todas as informações necessárias para a licitação, incluindo formas de cobranças, projetos prioritários e valores previstos de tarifas.