A neurocientista Suzana Herculano-Houzel, pesquisadora da UFRJ, decidiu ir embora. Mas antes deu significado à difusa imagem da expressão ?fuga de cérebros?. A crônica anemia financeira de agências de fomento para pesquisas foi uma das razões, mas ela toca numa ferida mais importante, relacionada à baixa produtividade científica brasileira, com raras exceções: a cultura do igualitarismo.
Algumas soluções engenhosas têm sido apresentadas, como o exemplo da parceria entre pesquisadores da UFRJ e o Instituto D?Or de Pesquisas, no Rio de Janeiro, com descobertas importantes sobre mecanismos de ação do vírus zika no tecido nervoso. Mas essa não pode ser a solução para um problema tão grave como o risco da mediocrização persistente da universidade, caso a discussão inadiável do estímulo ao mérito e à inovação não seja levada a sério.
Outro argumento falacioso, e frequente, é o subfinanciamento como causa da improdutividade. Uma conta simples pode desmontá-lo. No ranking da Times Higher Education (THE), instituição que gradua as 800 melhores universidades do mundo, são usados indicadores de produtividade como ensino, internacionalização, pesquisa, inovação associada à indústria e citações. Estas pressupõem relevância das publicações de pesquisas feitas nas instituições.
Com base nos dados da THE, comparamos a produtividade científica versus gastos entre a UFRJ e as universidades de Chicago, que tem o maior número de prêmios Nobel no mundo; a PUC do Chile, considerada a melhor da América Latina; e a da Cidade do Cabo, na Africa do Sul.
A UFRJ custou US$ 1,02 bilhão aos cofres públicos em 2014, um terço do custo da universidade de Chicago, e gasta muito mais do que a melhor da América Latina e o dobro da Universidade do Cabo. Sua posição, entretanto, é muito inferior no ranking da THE.
A vocação para aumento de gastos com a burocracia, que destrói orçamentos de estados brasileiros, também tem sua face na universidade pública. A crise de insolvência da USP, em 2014, demonstrou isso.
Instrumentos corporativos (que são diferentes de valores corporativos) poderiam ser usados para ajudar as universidades em sua missão de ensino, pesquisa e inovação. Além de uma melhor auditoria da academia, recursos autônomos, como fundos, poderiam ser instituídos e separados dos orçamentos engessados, politizados e exageradamente voltados para custeio de pessoal. Se independentes, e transparentes, estariam menos sujeitos à manipulação política.
Auxílio a pesquisadores (os chamados grants) pode ser criado como mecanismo oficial de recompensa por excelência acadêmica, através de tais fundos, em linha com indicadores definidos pela comunidade científica das próprias instituições.
O novo ministro da Educação e Cultura poderia assumir essa pauta e reiniciar o estímulo ao mérito nas universidades públicas. Se não trouxer Suzana de volta, poderia ao menos impedir que jovens pesquisadores continuem desistindo ou, pior, permaneçam acomodados e incorporados à doutrina do corporativismo mediocrizante.
Jorge Marcondes é professor de neurocirurgia e pesquisador da UFRJ