BRASÍLIA – O advogado do presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Marcelo Nobre, afirmou nessa terça-feira que a presença do deputado não é necessária para a defesa final diante do Conselho de Ética da casa na próxima quinta-feira. A afirmação foi feita após a assessoria de Nobre confirmar pela manhã que Cunha pretende participar da sessão.
Na última vez que o presidente afastado da casa prestou depoimento em uma comissão na Câmara, na CPI da Petrobras em março de 2015, ele declarou não possuir contas no exterior. Meses depois, após abertura de uma investigação pelo Ministério Público da Suíça que apontava a existência de contas em nome dele naquele país, o conselho foi acionado para investigar Cunha por quebra de decoro.
– Não é por esse fundamento (o depoimento na CPI) que a defesa acha que o cliente não deveria vir, mas é por absoluta falta de necessidade. Se trata nesse conselho de uma necessidade de prova material que não existe. Não é em testemunho que vai fazer prova que precisa ser provada materialmente, mas meu cliente acha que existe a necessidade de uma defesa política e eu tenho que respeitar. Pela defesa é desnecessário, porque não existe prova.
A declaração de Nobre foi após a sessão do Conselho de Ética que ouviu o professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP), José Tadeu de Chiara, usado como testemunha de defesa do presidente afastado da casa. O processo foi aberto no conselho após Cunha ser acusado de mentir no depoimento dado à CPI. Chiara, que afirmou ter tido apenas um contato esporádico com Cunha antes do depoimento desta terça, disse que o dinheiro de origem do exterior não precisa necessariamente ser declarado no Brasil.
? Essa é uma área em que muitos falam e opinam, mas eu atuo efetivamente no mercado financeiro de capitais há muitos anos. Tive oportunidade de estudar em diferentes situações o funcionamento de trustes. Por tudo que nós já falamos, é impossível o truste ser passível de qualquer declaração no país. É um contrato pessoal, ainda que quem o organize esteja na qualidade de beneficiário, ele não tem nada a declarar ? afirmou Chiara.
A participação do professor foi bastante questionada por membros do conselho. Vice-líder do conselho, Sandro Alex (PPS-PR), disse que a sessão parecia surreal e que os deputados deveriam estar debruçados sobre os documentos de uma denúncia de pagamento de propina a um político.
? Nós estamos analisando uma denúncia do pagamento de propina a um político diante das investigações do processo resultante da Lava-Jato, onde esse dinheiro foi enviado, não declarado e movimentado no exterior. Isso documentado e denunciado pelo STF. E nós estamos aqui nos tornando pós-graduados em truste. Parece até surreal! Afronta toda a nossa inteligência.
O relator do processo, Marcos Rogério (DEM-RS), disse que toda a explicação de Chiara sobre conceitos de truste estava complicando ainda mais uma definição final sobre o tema.
– Na tentativa de simplificar o que é truste, o senhor tem tornado o tema cada vez mais complexo – declarou Marcos Rogério.
O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) questionou a participação de Chiara como testemunha, afirmando não ver relevância no que ele dizia, pois o conselho já havia ouvido o advogado suíço Didier de Montmollin sobre o mesmo tema. Marcos Rogério declarou que o depoimento do professor não seria usado para compor o parecer como testemunha, mas apenas como um informante. Nobre questionou a decisão do relator e afirmou que não usar o professor como testemunha seria um absurdo.
? Nós estamos falando com uma das maiores autoridades sobre trustes no mundo. Isso deveria ser interesse não somente do conselho. Aqui se discute se truste é conta bancária. É sim uma testemunha de autoridade e que tem muito a dizer sobre as trustes.
Ao final da sessão, o relator afirmou que a defesa de Cunha trouxe testemunhas semelhantes, mas com argumentos contraditórios sobre o uso das trustes e que levará em conta as informações apresentadas.
? O advogado que esteve aqui anteriormente, Didier de Montmollin , teria dito que o instituidor da truste teria condições de manter o controle do patrimônio. Chiara diz o contrário: o patrimônio é do truste e não daquele que abriu a truste. São dois convidados da defesa que trazem informações contraditórias.
Chiara foi a última testemunha a ser ouvida pelo Conselho de Ética antes da defesa final de Cunha, que será feita na próxima quinta com presença confirmada do parlamentar afastado. Na última semana, o relator avisou que incluirá no parecer a acusação de que Cunha recebeu propina do esquema da Petrobras, ou seja, a acusação de recebimento de vantagem indevida.
A votação do parecer do vice-presidente do conselho, Sandro Alex (PSD-PR) sobre a substituição de membros do colegiado foi adiada para quarta-feira. A sugestão é que as vagas decorrentes do afastamento de membros titulares ou suplentes deve ocorrer apenas em casos como renúncia, perda de mandato ou morte. Se for aprovada, a vaga somente será preenchida através de nova indicação do líder do partido.
*Estagiário sob supervisão de Isabel Braga