Reportagem: Cláudia Neis
Cascavel – A falta de energia elétrica na propriedade da piscicultura Nereide Tebaldi Dolla, em São João d`Oeste, distrito de Cascavel, levou o fruto de um trabalho de nove meses e deixou dívidas, incerteza e revolta. “Faltou luz das 16h30 do dia 15 de dezembro até as 11h15 do dia 16. E nós perdemos 27 toneladas de peixe. Nesse período em que os peixes estão prontos para a venda, os aeradores precisam ficar ligados 24 horas por dia para oxigenar a água. Sem energia, todos morreram”, lamenta.
Ela ligou inúmeras vezes para a Copel relatando a situação e pedindo providências urgentes. “Eu ligava e diziam que estavam enviando uma equipe. Liguei várias vezes. Entrei em um aplicativo em que sou cadastrada por conta da piscicultura e ele não funcionou. Eu pedia ‘por favor’ para virem porque meus peixes estavam morrendo, mas quando o problema foi resolvido já era tarde”, relata Nereide.
Ela e o marido vivem da renda dos quatro açudes. O prejuízo passa de R$ 130 mil e só não foi maior porque dois dias antes dois açudes haviam sido esvaziados. “Consegui vender toda a produção para uma empresa de Santa Catarina, que no dia 13 veio e levou os peixes de dois açudes; no dia 17 eles viriam buscar o restante, mas aí aconteceu essa tragédia”.
Ressarcimento negado
Nereide tem a dívida de financiamento dos açudes e a ração dos peixes para pagar, que chegam a R$ 100 mil. “Sem contar que agora eu preciso comprar alevinos para colocar nos açudes e não tenho dinheiro. A minha esperança era de que a Copel nos ressarcisse, mas a Copel negou que tenha responsabilidade sobre o ocorrido”, revela.
Em um email enviado à produtora, a Copel justifica: “Verificamos que consta em nossos registros interrupção no fornecimento de energia a essa unidade consumidora. Este fato é inerente ao serviço de distribuição de energia elétrica e ocorre devido à atuação de dispositivos de proteção da rede de distribuição, com a finalidade de preservar a segurança de pessoas e de propriedades. Assim sendo, não há como a concessionária garantir o fornecimento ininterrupto de energia”.
Na propriedade de Nereide existem 11 aeradores e, mesmo com placas de energia solar já instaladas, a conta de luz chega a R$ 3 mil por mês.
Sem saída, Nereide pretende renegociar os financiamentos e buscar uma forma para pagar a ração. Já os alevinos vieram da solidariedade de quem ela nem conhece. “Um produtor de Marechal Cândido Rondon se comoveu com a situação e disse que vai fornecer os alevinos para que eu pague depois da metade do ano. É emocionante que, numa situação dessas, exista gente do bem e disposta a ajudar a gente a recomeçar”, agradece.
A piscicultora pretende acionar a Justiça para cobrar a responsabilidade da Copel.
Oito mil frangos mortos
Situação semelhante aconteceu na propriedade de Janaína Paticowski, na Linha Scanagatta, em São Salvador, distrito de Cascavel. “Foram várias quedas, uma atrás da outra, logo após a meia-noite, até que não voltou mais. Passamos o dia 11 quase todo sem luz. Só foi religada às cinco horas da tarde, quando os frangos já estavam mortos. Foram quatro aviários atingidos”, conta, um total de 8 mil frangos.
Ela ainda não sabe o tamanho do prejuízo, já que são cooperados e a cooperativa vai avaliar a perda após a entrega do lote. “Não sabemos de quanto foi o prejuízo, só sabemos que foi grande. Há alguns meses um vizinho perdeu os frangos de dois aviários pelo mesmo motivo e a cooperativa cobrou dele R$ 30 mil… então no mínimo R$ 50 mil acreditamos que possa ser cobrado. Além disso, tivemos um aerador de um açude queimado e dois painéis eletrônicos do poço artesiano, um agora e um já há algum tempo. O aerador e as duas placas somam mais de R$ 9 mil de prejuízo”, afirma Janaína.
O rendimento dos aviários é o sustento da família. Um laudo relatando a situação e as perdas foi enviado à Copel, com uma solicitação de ressarcimento. A resposta foi negativa. Janaína também vai buscar na Justiça o ressarcimento dos danos.
Ela conta que na madrugada dessa terça-feira (14) foram registradas novas quedas de luz. E que tem protocolos inclusive de solicitação de manutenção na rede elétrica, e corte de galhos próximos aos fios, mas que nunca foram atendidos. “É um descaso. Estamos perdendo nossas produções, tendo prejuízos enormes. Alguém precisa fazer alguma coisa”, apela.
O que diz a Copel?
Sobre as negativas aos pedidos de ressarcimento dos casos citados o gerente de Serviços das Regiões Oeste e Sudoeste da Copel, Paulo Nachtygal, afirma que a Companhia precisa seguir as regras da Aneel. “Dentre as regras está especificado que não existe a possibilidade de fornecimento ininterrupto de energia às propriedades e que, para atividades como a criação de frangos e peixes, o produtor deve ter um gerador de energia, que pode ser acionado em caso de interrupção no fornecimento”, explica Paulo.
Ele diz que muitas vezes as quedas se dão por condições climáticas e que a Copel age da maneira mais rápida possível para solucionar os problemas, mas não é possível garantir o restabelecimento imediato. E há casos em que a queda ocorre pelo sistema de proteção, que desliga ao registrar alguma situação de perigo na rede, evitando outros acidentes.
Sobre os dois casos específicos citados na reportagem, eles foram reportados à equipe responsável e estão sendo verificados novamente pela Copel.
Investimentos e melhorias
Paulo garante que a região oeste, que tem maior demanda, foi um das que mais receberam investimentos de melhorias ano passado, sendo 40% dos R$ 800 milhões investidos pelo Estado ano passado.
Outro programa que deve trazer melhorias nas redes elétricas é o Paraná Trifásico, que já está em andamento. “São mais de R$ 2 bilhões de investimento em uma série de obras ao longo de quatro anos. A primeira delas deve ser inaugurada nas próximas semanas na região oeste. É um programa inédito no País, que vai levar energia de melhor qualidade às unidades consumidoras, e o oeste também será um dos maiores beneficiados justamente por conta da grande demanda”.