Entenda a recente movimentação do Supremo Tribunal Federal e seus impactos no Oeste do Paraná e no setor agropecuário - Foto: Ari Dias/AEN
Entenda a recente movimentação do Supremo Tribunal Federal e seus impactos no Oeste do Paraná e no setor agropecuário - Foto: Ari Dias/AEN

Paraná - A recente movimentação do Supremo Tribunal Federal, que tenta impedir a Procuradoria-Geral da República de julgar as contestações relacionadas à lei do Marco Temporal, reacendeu o alerta no setor agropecuário. No Oeste do Paraná, a medida é vista com preocupação por produtores e entidades de classe, que enxergam na decisão um risco direto à segurança jurídica e à estabilidade econômica da região.

“O que o Supremo está fazendo agora é um absurdo”, dispara o presidente do Sindicato Rural de Palotina, Edmilson Zabott, em entrevista concedida à equipe de reportagem do Jornal O Paraná. “A lei do Marco Temporal foi criada pelo próprio STF e ratificada pelo Congresso em 2023, como manda a Constituição. Mesmo assim, o presidente da República vetou a lei. Isso gera uma insegurança jurídica tremenda, porque coloca em xeque decisões que deveriam garantir previsibilidade ao País”.

Zabott lembra que a questão ultrapassa o interesse dos produtores rurais e atinge toda a sociedade. Segundo ele, a instabilidade nas regras sobre demarcações de terras indígenas ameaça cadeias produtivas essenciais à economia brasileira. “É preciso deixar claro que essa insegurança jurídica não afeta apenas o produtor rural. Ela vai atingir o cidadão comum, o consumidor, o trabalhador urbano. Afinal, quem abastece as gôndolas dos supermercados? Quem garante o alimento nas mesas? Não são as ONGs, nem a Funai, nem os indígenas. É o produtor rural”, vocifera.

Polo de Produção

A região Oeste do Paraná é considerada um dos principais polos de produção de proteínas animais do Brasil. Somente ali estão 70% da produção estadual de tilápia e 45% da produção nacional, além de frigoríficos que lideram exportações e uma das maiores bacias leiteiras do país. O Paraná já é o segundo maior produtor de leite do Brasil, além de ocupar posição de destaque nas cadeias de suínos e frangos.

“Essa estrutura gigantesca, que gera emprego, renda e movimenta o comércio, está em risco”, alerta Zabott. “Para produzir proteína animal, o primeiro documento exigido é o certificado de qualidade sanitária. Sem ele, a carne, o leite ou o peixe não podem ser comercializados nem no mercado interno, nem no externo. Se houver demarcações sem critérios, como as que estão sendo planejadas, todo esse sistema sanitário pode ser comprometido”, alerta Zabott.

O líder ruralista cita como exemplo a situação entre Palotina, Terra Roxa e Guaíra, onde já existem 17 áreas em processo de aldeamento. Segundo ele, essas terras estão sendo adquiridas pela Funai com apoio de Itaipu, “sem consulta à sociedade e sem estudos de impacto de vizinhança”.

“Essas áreas estão sendo compradas como se fossem legítimas demarcações indígenas, mas até agora não há provas claras da presença de povos originários em várias delas. O que existe, na prática, são invasões. E quando essas áreas forem oficializadas, os produtores vizinhos terão suas propriedades ameaçadas, tanto em termos de segurança física quanto sanitária”, ressalta Zabott.

Desemprego

O presidente do Sindicato Rural de Palotina alerta ainda para o risco de desemprego em massa caso o status sanitário da região seja comprometido. Ele cita como exemplo a planta frigorífica instalada em Palotina, que emprega diretamente mais de 11 mil pessoas.

“Esses empregos não são só de Palotina. Vêm de cidades vizinhas, até do Mato Grosso do Sul. Se perdermos o status sanitário, a produção vai cair, as exportações vão travar e milhares de famílias vão sentir o impacto”, afirma.

Para o setor, as consequências das demarcações extrapolam a questão fundiária. “As pessoas pensam que estamos falando apenas de perda de terra, mas o que está em jogo é muito mais: é a base econômica da região, as cadeias produtivas, o abastecimento interno e a imagem do Brasil como fornecedor confiável de alimentos”, diz Zabott.

“Se não há lei para o campo, não há lei para ninguém”

A indignação do dirigente rural é alimentada pelo que ele considera um desequilíbrio entre as decisões de diferentes poderes da República. “Se o Congresso aprova e o Supremo ignora, qual é a lei que vale neste país?”, questiona. “O que significa isso? Que, se o agricultor não precisa respeitar a lei da propriedade, o cidadão também não precisa pagar conta em banco ou em loja? Estamos caminhando para um cenário de anarquia jurídica.”

Na avaliação de Zabott, o precedente aberto pelo STF enfraquece o princípio da segurança jurídica, um dos pilares da economia moderna. “Se um produtor não tem garantia de que a terra é dele, nenhum contrato mais tem validade. Isso vai repercutir em todos os setores: financeiro, industrial, comercial. É um efeito em cadeia.”

Zabott reforça que o problema não é ideológico, mas técnico e social. “Nós não somos contra os indígenas, eles têm direito ao seu modo de vida. O que não dá é transformar áreas produtivas em palco de disputa política. Cada aldeamento novo significa tirar de produção centenas de hectares, reduzir empregos e comprometer a arrecadação dos municípios”, avalia.

Além disso, Zabott destaca que o modelo de expansão dos aldeamentos proposto ignora aspectos sanitários e ambientais. “Como garantir o controle de zoonoses, de biossegurança, de trânsito de animais e pessoas nessas áreas? Qual é o plano de mitigação? Ninguém fala disso. E o custo de uma contaminação sanitária recai sobre toda a sociedade”, adverte.

Um apelo por coerência

No entendimento do presidente do Sindicato Rural de Palotina, o setor agropecuário não pede privilégios, mas coerência e estabilidade nas regras. “O que queremos é segurança jurídica para continuar produzindo, empregando e gerando riqueza. O agro não é inimigo do Brasil — ele é a base da economia nacional”, afirma.

Zabott conclui com um apelo à responsabilidade institucional: “O STF criou a tese do marco temporal. O Congresso, que representa o povo, ratificou. Se nenhuma dessas decisões vale, então estamos diante de um país sem lei. E um país sem lei não tem futuro”.