
Cascavel e Paraná - O agronegócio brasileiro vive uma era de alta produtividade e tecnologia, mas por trás da imagem de sucesso há um fenômeno silencioso e preocupante que vem redesenhando a vida no interior: o chamado “novo êxodo rural”.
Diferente do movimento clássico das décadas passadas, em que famílias migravam para as cidades em busca de emprego, a nova saída do campo tem origem econômica e estrutural. Pequenos e médios produtores rurais enfrentam dificuldades para manter a atividade viável diante da mecanização crescente e necessidade de investimentos; da falta de sucessores e dos altos custos de produção.

O engenheiro agrônomo e sócio da empresa PlantPlan, Leonardo Galafassi, observa que o problema está na equação entre tecnologia e escala. “Hoje, a agricultura moderna exige grandes áreas para diluir os custos de máquinas como plantadeiras, pulverizadores e colheitadeiras. Para o produtor com 30 ou 50 alqueires, investir em equipamentos de alto valor é economicamente inviável”, explica.
Segundo ele, o dilema se agrava quando há interesse dos filhos em permanecer na atividade rural. “Se há mais de uma família envolvida na propriedade, aumenta a necessidade de área para sustentar todos, pagar a tecnificação e manter o negócio rentável. Essa conta simplesmente não fecha”.
Diante disso, muitos produtores optam por arrendar terras vizinhas para alcançar a escala necessária. O valor médio do arrendamento na região de Cascavel chega a 60 sacas de soja por alqueire ao ano, o que garante continuidade à produção, mas com margens cada vez mais esmagadas. “O arrendamento é, muitas vezes, a única forma de seguir no campo sem comprometer o fluxo de caixa. O problema é que essa solução, a longo prazo, pode se tornar um círculo vicioso: o produtor cresce na área, mas não necessariamente no lucro”, afirma Galafassi.
Quando a sucessão familiar não ocorre, a situação se inverte — o proprietário se torna arrendador. Nesse caso, a rentabilidade é baixa. Um alqueire na região vale hoje cerca de duas mil sacas de soja, o equivalente a R$ 240 mil, enquanto o arrendamento máximo gira em torno de 60 sacas anuais, cerca de R$ 7,2 mil. “Isso representa um rendimento bruto de apenas 3% ao ano. Se compararmos com a taxa Selic, hoje em 15%, é fácil perceber que a terra está rendendo menos do que o custo de oportunidade. O patrimônio perde poder de compra com o tempo”, analisa Galafassi.
Impacto vai além da economia individual
O impacto vai além da economia individual. O arrendamento em larga escala e a concentração de terras reduzem a mão de obra rural e esvaziam as comunidades, afetando escolas, comércios e serviços locais. “Quando o campo perde gente, perde vitalidade. O agricultor que sai não é substituído facilmente. A produção se concentra em poucas mãos e as cidades pequenas minguam”.
Para ele, o enfrentamento do novo êxodo rural exige soluções coletivas e estruturais. A aposta está na formação de cooperativas e associações de produtores, capazes de compartilhar máquinas, reduzir custos e garantir acesso permanente à assistência técnica. “É utópico imaginar que os agentes públicos consigam atender todas as propriedades. Por isso, precisamos fomentar o cooperativismo, começando pelo apoio à gestão, à contabilidade e aos processos burocráticos. Isso gera transparência e desenvolve lideranças locais”, defende.
Com esse suporte inicial, os produtores poderiam adquirir máquinas modernas de forma conjunta, manter as famílias no campo e garantir a sustentabilidade econômica e social das propriedades. “O agricultor brasileiro é resiliente e tem vocação para produzir. O que falta é estrutura coletiva e política de longo prazo para que ele não precise escolher entre arrendar a terra ou abandonar o campo”, conclui Galafassi.
O novo êxodo rural, portanto, não é apenas um movimento de saída física, mas também de desalento econômico e desestrutura social. Reverter esse processo passa por políticas que estimulem a sucessão familiar, a profissionalização dos jovens e o cooperativismo — caminhos capazes de transformar o campo em um lugar de oportunidades e não de despedidas.