
DoppingDe Rose explica que cerca da metade dos casos positivos no Brasil são para substâncias que não proporcionam ganho de performance ou doping acidental, comprovando assim a falta de intenção do atleta em trapacear. Ainda assim, o especialista avalia que, somente agora, com a criação de fato de uma agência especializada – a Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) -, o Brasil poderá elaborar estatísticas confiáveis e próprias.
– No relatório de 2014, é possível observar que as substâncias encontradas eram associadas: um estimulante que vinha num analgésico, por exemplo. Casos que mostram a falta de educação com o tema e a falta de cuidado ao usar medicamentos – explica De Rose.
EXEMPLOS EM PROFUSÃO
O médico recorda o incidente com o nadador Cesar Cielo, em que uma farmácia de manipulação assumiu a culpa na contaminação de um suplemento com o diurético furosemida, substância proibida, num caso clássico de contaminação cruzada. O atleta foi absolvido. Ele lembra ainda da também nadadora Etiene Medeiros, que registrou positivo para fenoterol, presente em medicamento para tratamento de asma – ela também não foi punida.
– É preciso educar para combater o doping, além de aumentar o controle para inibir os que tem intenção de trapacear – opina De Rose.
Ele firma que o Brasil passou a ter exames frequentes, para as mais variadas modalidades esportivas, a partir de 2015 com a ABCD. E ressalta que o atletismo e o futebol sempre foram as modalidades mais testadas no país.
– Não há histórico no Brasil sobre o tema. Por incrível que pareça, esse tema é novo – observa o médico, que cita como caso emblemático do Brasil, o doping da equipe de atletismo de Presidente Prudente, quando cinco atletas foram flagrados por uso do hormônio eritropoietina (EPO). – Esse sim foi intencional, o único grande escândalo do Brasil.
Até Jayme Netto Júnior, treinador de três desses cinco atletas, consagrado com duas medalhas em cinco Olimpíadas, e réu confesso no episódio de Presidente Prudente, em 2009, concorda com a pouca intencionalidade.
– Vejo muitos casos de descuido, um pouco como o brasileiro é. Diferentemente do que ocorreu em Prudente, em que sim, tivemos a intenção. Me fascinei pela recuperação física que meus atletas podiam ter e paguei por isso. Não vejo outro caso no Brasil como esse – admite Jayme, que chegou a ser banido do esporte, mas teve a pena reduzida para sete anos, já cumpridos.
Essa falta de cultura de dopagem no Brasil é um contraste em relação ao momento em que a cidade do Rio vive, ao receber uma Olimpíada cercada de polêmica por causa do escândalo de doping russo. Mas pode impulsionar ainda mais o controle, segundo Rogério Sampaio, ex-judoca campeão olímpico, novo secretário nacional da ABCD.
– Com o aumento nos controles principalmente fora de competição, o julgamento de casos de doping num tribunal específico e a educação farão com que o Brasil tenha menos casos. Não só para os que burlam a regra mas também para os que a desconhecem.
De acordo com dados da ABCD, de outubro a dezembro de 2015, foram realizados 639 testes, sendo 349 em competições e 290 fora de competição. Em 2016, de janeiro a julho, foram feitos 2.227 testes, sendo que 1.257 em competição e 970 de surpresa. Para efeito de comparação, a CBF realiza entre 4,2 mil e 4,5 mil exames por ano.
Thomaz Mattos de Paiva, responsável pela Comissão Nacional Antidopagem (Conad) da Confederação Brasileira de Atletismo, afirma que a modalidade tem histórico no controle de doping. Mas esse número aumentou.
– É preciso estatística geral, de todas as modalidades, algo que não existe. Porque se há mais testes no atletismo, a possibilidade de mais casos positivos é maior. Sem controle, não há positivo – observa Thomaz, que também acredita na falta de cultura de dopagem no pais. – Antes da Olimpíada mais de 100 atletas brasileiros perderam testes surpresa porque não conhecem o mecanismo. E mais: além de ensinar o atleta profissional, é preciso ensinar o brasileiro em geral. O comércio de substâncias proibidas na internet mostra o quanto esse problema é disseminado entre os atletas amadores.
Informação faltou a Maurren Maggi que em 2003, às vésperas do Pan-Americano de Santo Domingo, foi pega em um teste surpresa. Sua amostra deu positivo para clostebol, componente de uma pomada cicatrizante usada pela saltadora. O caso a tirou do Pan e também da Olimpíada de Atenas-2004. Sua punição foi de dois anos.
– Hoje vejo muita gente sendo pega em exame de doping e não pagando pelo crime. Vejo facilidades que não tive. E acho que minha punição estava correta. Não deveria ser diferente.