Cotidiano

Governo quer mudar destinação do FAT para equilibrar contas

BRASÍLIA – A proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos será a primeira etapa de uma reforma fiscal que incluirá ações para conter despesas obrigatórias. No rol de medidas estão, por exemplo, mais restrições no acesso a benefícios como o abono salarial e a Loas (Lei Orgânica de Assistência Social). Outra ação em estudo prevê mudanças profundas no FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), que deixaria de aportar no BNDES 40% de suas receitas arrecadadas com PIS/Pasep e assumiria as despesas com benefícios sociais, como a Loas. O FAT continuaria pagando também o seguro-desemprego. Com mais gastos sociais, o Fundo teria de começar a receber dos bancos, especialmente o BNDES, os recursos que têm emprestados.

O segundo estágio da reforma inclui a mudança na Previdência Social e revisões na concessão do auxílio-doença, de pensões por morte e possivelmente no seguro-desemprego. Integrantes da equipe econômica afirmam que apenas a fixação do teto para gastos não será suficiente para reequilibrar as contas públicas a longo prazo. As ações adicionais, que são impopulares, devem ficar para depois da votação final do impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso.

TETO DE GASTO POR 20 ANOS

O texto da PEC, que foi intensamente discutido pelo presidente interino, Michel Temer, com a área econômica e com o núcleo político do governo nos últimos dias, deve ser encaminhado ao Congresso ainda esta semana, com um prazo de 20 anos de vigência do teto por sugestão do Ministério da Fazenda. No entanto, a partir do nono ano, o governo poderá fazer uma revisão do indexador. Inicialmente, a regra é usar como base as despesas de 2016 e passar a corrigi-las com base apenas na inflação do ano anterior medida pelo IPCA.

Um prazo tão longo não tem a simpatia da área política do governo, pois pode dificultar a aprovação do texto no Congresso. Mas na noite de terça-feira, a área econômica afirmava que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tinha convencido Temer sobre a importância de se dar uma sinalização de longo prazo ao mercado. O texto da PEC também deve propor que a regra valha para Executivo, Legislativo e Judiciário.

Enquanto o teto vigorar, o governo informou que qualquer lei aprovada em desconformidade com a norma pode ser vetada ou declarada inconstitucional. Deve haver ainda mecanismos para travar o descumprimento do teto, como proibição de reajustes de servidores, criação de cargos, concessões de novos subsídios e realização de concursos.

A PEC também vai alterar as destinações para saúde e educação. A Constituição estabelece hoje percentuais mínimos que a União é obrigada a gastar nessas áreas.

Meirelles também chegou a sugerir ao Planalto que a PEC trouxesse medidas mais duras de contenção de gastos, como a extinção do abono salarial. No entanto, a medida foi vista com preocupação por Temer e está sub judice. Assim, o que deve vir pela frente são maiores restrições no acesso a esse benefício. O abono é uma despesa obrigatória crescente e que, segundo técnicos do governo, não está direcionada às camadas mais pobres da população.

RISCO POLÍTICO

O governo Dilma Rousseff chegou a propor, em 2014, regras mais duras de acesso ao abono. Na época, o governo sugeriu que, para ter direito ao benefício, o trabalhador deveria atuar com carteira assinada por, ao menos, seis meses. A regra permitia o pagamento do abono com apenas um mês na formalidade. Após passar pelo Congresso, a proposta que prevaleceu foi a proporcionalidade do pagamento: quem trabalha um mês no ano, tem direito a 1/12 do benefício, e assim por diante.

Interlocutores do presidente interino afirmam que a área política do governo decidiu retirar do texto tudo o que identificarem como sendo de difícil aprovação do Congresso. Líderes de partidos aliados serão ouvidos hoje sobre o conteúdo da proposta antes de ela ser encaminhada ao Legislativo. Por conta disso, é possível que o texto só chegue ao Congresso nesta quinta-feira.

O PT já avisou que se posicionará contra essa proposta, alegando que reduz recursos da Saúde e Educação. Há o temor político de que Temer crie dificuldades para seu governo ao abrir tantas frentes de conflitos, com propostas que mexem na Previdência, com servidores e benefícios.