Entenda os desafios da produção de leite no Brasil e como o preço pago ao produtor impacta a sustentabilidade do setor - Foto: Vandré Dubiela / O Paraná
Entenda os desafios da produção de leite no Brasil e como o preço pago ao produtor impacta a sustentabilidade do setor - Foto: Vandré Dubiela / O Paraná

Cascavel e Paraná - Apesar de a produção brasileira de leite ter alcançado cerca de 25 bilhões de litros em 2025, com um crescimento de 2% em relação ao ano anterior, a sustentabilidade da atividade enfrenta sérios desafios. A maior parte dessa produção, mais de 70%, concentra-se no Sul e Sudeste, mas a estrutura produtiva está cada vez mais polarizada: grandes produtores de alta tecnologia expandem sua participação, enquanto os pequenos lutam contra a baixa rentabilidade.

O principal entrave da crise do leite reside no preço pago ao produtor, que, em setembro de 2025, variou entre R$ 1,60 e R$ 2,57 por litro. Em muitas regiões, esse valor é insuficiente para cobrir os custos elevados de ração, suplementos, energia e mão de obra, pressionando a margem de lucro. A situação é agravada pela pressão das importações, já que o volume de leite em pó e queijos oriundos do Mercosul aumentou significativamente, ampliando a oferta e minando o poder de negociação do produtor nacional. Essa combinação perigosa gera margens mínimas ou até negativas, especialmente para os pequenos e médios. Como resultado, o Brasil permanece deficitário no comércio de lácteos, importando mais do que exporta. Para que o setor avance e se torne competitivo, é fundamental focar na qualidade, rastreabilidade e certificação, critérios cada vez mais valorizados pelos mercados internacionais.

Palestra

A busca incessante por qualidade e segurança alimentar na cadeia produtiva do leite foi o foco da palestra de Eduardo Portugal, médico veterinário do setor de suprimentos de leite da Frimesa, durante o recente Fórum Conexão Brucelose e Tuberculose, promovido pela ADAPAR (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná) na Acic (Associação Comercial e Industrial de Cascavel). O evento teve participação direta da Câmara Técnica de Sanidade Agropecuária do Programa Oeste em Desenvolvimento, ressaltou a importância de ir além do produto final, focando na sanidade e na origem da matéria-prima.

De acordo com Portugal, o conceito de qualidade evoluiu, e hoje não se limita apenas ao produto. É determinante que a propriedade rural esteja sanitariamente bem organizada, garantindo que a origem das vacas esteja livre de doenças.

“Quando se fala na qualidade de alimento, tem a parte da origem, principalmente, da propriedade rural. A origem sanitária. Porque antigamente se falava só do produto. Aquela propriedade, ela está bem organizada sanitariamente? Para você ter um produto de qualidade sanitária também? A origem das vacas? Estão livres de doenças?”, questionou o médico veterinário.

Boas práticas

A melhoria da qualidade do leite passa diretamente pela adoção de boas práticas, como a utilização de bons resfriadores. O leite é classificado como uma “matéria-prima viva”, e o controle de bactérias, inclusive as láticas que influenciam o sabor e a durabilidade, é essencial para o padrão sanitário e o shelf life (tempo de prateleira) do produto.

Portugal destacou que a implantação das instruções normativas (INs) no Brasil contribuiu significativamente para a melhoria da qualidade do leite nacional. Contudo, o próximo passo crucial é o pagamento do leite por qualidade, priorizando os extratos secos, gordura e proteína de alto padrão.

O desafio da rastreabilidade foi apontado como uma das barreiras sanitárias atuais, mas também como um caminho de sucesso. Portugal citou o exemplo do produto WEM (Whey Protein Concentrate), produzido em Marechal Cândido Rondon e exportado, que só alcançou este patamar devido a um trabalho exemplar de rastreabilidade. “Fizeram um trabalho de rastreabilidade muito bom e querem saber a origem do soro, onde o queijo é produzido”, exemplificou o veterinário.

Avanços em durabilidade do leite

O avanço na durabilidade dos produtos é notável. O veterinário relembrou que, há 20 anos, o leite pasteurizado durava cerca de três dias. Hoje, já se alcança 11 dias, embora haja potencial para mais, citando o exemplo dos EUA, onde o prazo é de 25 dias, e o leite UHT importado pode durar 8 meses.

Para que a cadeia do leite se fortaleça, o especialista defendeu a necessidade de reduzir o custo total da cadeia, o que inclui buscar formas eficientes de condensar o leite de pequenos produtores sem comprometer a qualidade.

“Temos que saber como condensar esse leite de pequenas propriedades, para que o custo não seja alto, esse leite tenha qualidade e possa dar uma condição muito boa para o pequeno e médio produtor de leite. Aí fica bom para a indústria, fica bom para o produtor e fica bom para o mercado também de ter um preço mais acessível”, concluiu Portugal, reforçando que a qualidade e a rastreabilidade são a chave para a sustentabilidade de toda a cadeia produtiva.