A presença deles não é uma novidade em Cascavel. Em praticamente todos os semáforos da região central é possível encontrá-los, seja com placas improvisadas em pedaços de papelão com apelos de “fome” e “ajuda” ou ainda vendendo “balinhas”, lá estão eles, os moradores de rua – ou pessoas em situação de rua, para o politicamente correto – grupo que abriga outro grande: os usuários de drogas.
Eles são já são, inclusive, conhecidos dos comerciantes. Rostos familiares abordando clientes no estacionamento e mãos ligeiras tentando alcançar produtos nas prateleiras diante da distração dos funcionários. O que muda é o lugar onde eles ficam ‘mocados’ – escondidos. Quando a presença começa a gerar muito incômodo e medidas são tomadas pelos comerciantes ou autoridades, é hora de encontrar outro imóvel vazio ou “outro canto” para se instalar em condições indignas. E o resultado é sempre o mesmo: lixo é acumulado e mau cheiro.
Muitos estabelecimentos instalaram grades e estruturas de ferro pontiagudas para evitar que estes “desocupados” se instalem em frente às lojas.
Na esquina da balada
Depois do último despejo da marquise do antigo prédio da Justiça Federal, na Rua Paraná, que ganhou enormes grades bem na calçada, o endereço mais recente deste pessoal é no cruzamento das ruas Paraná e Pio XII, sob o deck de um bar que está fechado e disponível para locação. A região é conhecida pelas principais baladas da cidade e o grande movimento nas noites cascavelenses, geralmente a partir das quintas-feiras.
É ali que cenas de verdadeira degradação humana são flagradas a qualquer horário do dia: tráfico e consumo de drogas acontecem atrás do gradil, de onde é possível avistar muito lixo acumulado.
Mesmo com todo o frio registrado no início da semana – terça-feira foi o dia mais frio do ano no Paraná – eles estavam lá no ‘mocó’. Com pouca roupa e sem calçados. Bastaram alguns poucos minutos em frente ao local para observar o entra e sai e a tentativa de se aquecer no sol do início da tarde.
A reportagem do Hoje Express percorreu o comércio da região e encontrou comerciantes assustados. “É visto que são usuários de drogas”, apontou a recepcionista de um escritório. A maioria dos estabelecimentos funciona com as portas fechadas. Na confeitaria próxima, os ‘desocupados’ entram para abordar clientes que estão às mesas e pedir dinheiro ou comida, causando constrangimento às atendentes. Logo à frente, na farmácia, os funcionários já reconhecem quem são os que só ficam do lado de fora abordando os clientes no estacionamento e os mais ‘assanhadinhos’ que entram e tentam colocar no bolso algum produto. “Ainda bem que eles não são pessoas violentas”, analisa uma balconista.
“A droga dos pobres”
O ‘cachimbo’, que não é o da paz, é o último estágio da dependência de drogas. O crack é conhecido por ser a droga dos mais pobres, por não ter nenhuma ‘procedência’ e ter um custo muito baixo, e gera grande dependência em pouco tempo de uso. Esta substância leva à marginalização do usuário, que em pouco tempo perde também a dignidade e passa a viver como mendigo e submete-se a situações mais vexatórias.
E o cachimbo que presenciamos ser aceso nas esquinas é utilizado para fumar a pedra de crack, alimentando um problema de assistência social, segurança e saúde pública ainda longe de ser solucionado.
Segurança Pública “enxuga gelo”
E o aumento do uso de drogas à luz do dia em Cascavel preocupa os órgãos de segurança pública que trabalham “enxugando gelo”, já que este tipo de situação acaba migrando de um ponto para o outro. A reportagem do Hoje Pedro Fernandes de Oliveira, secretário municipal de Segurança Pública, disse que desde que esta “onda” aumentou na cidade, em alguns pontos que existia uma grande concentração de usuários de drogas, entre a Rodoviária e o Terminal Oeste uma viatura ficou fixa por semanas o que refletiu positivamente. “A situação que tínhamos ali melhorou, mas tem como evitar, porque eles migram e estamos falando de seres humanos”.
Oliveira disse que entende a cobrança da sociedade, mas que o Poder Público faz o que está ao seu alcance e o fato é que, além de moradores da cidade tem ainda de outras cidades da região e muitos estrangeiros em situação de rua.
“Não conseguimos deixar os guardas parados, a função é de eles estarem rodando, mas existe hoje uma concentração do problema na região central, casos que misturam os problemas tanto de segurança, assistência social e saúde, porque a pessoa que é usuária de drogas ela é uma pessoa doente”.
Polícia Militar
Prevenção e repreensão fazem parte da rotina da Polícia Militar. O tenente Gustavo Cardoso, que atualmente responde pela a 1ª Cia de Policiamento da PM de Cascavel, disse que os locais com maior circulação de entorpecentes têm reforço no policiamento. Além dos bairros e o Cento, há pontos específicos como a “Rodoviária Velha” e o Lago Municipal.
“Temos um trabalho nestas regiões de forma ostensiva, assim como nos bairros, para identificar problemas de usuários em situação de rua que são os mais recorrentes”. Segundo ele, diversas operações são realizadas com a equipe de inteligência e tática, com o Choque, Cavalaria e Rocam, que são com as motocicletas.
Drogas lícitas x ilícitas
Rafael Tortato, que é secretário municipal Antidrogas, constatou que o aumento do uso de drogas à luz do dia piorou depois da pandemia e que, o problema não são apenas as drogas ilícitas, como a maconha, crack e a cocaína, mas também o consumo de álcool que é a “porta de entrada” para este “caos” das ruas.
“O famoso corote traz problemas graves para o início de uma dependência química que desencadeia para problemas de saúde tanto emocional quanto física. O resultado disso é o abandono parental e de pessoas que largam as suas vidas para viver nas ruas, por isso, temos que cada vez mais trabalhar na prevenção, expondo os problemas que as drogas de um modo geral trazem”, disse, complementando ainda que muitos defendem a ideia da maconha ser natural, mas que ela desenvolve uma série de malefícios.
Hoje, programas municipais, como o “Vida Nova”, têm 54 pessoas acolhidas, além das ações do Sim Paraná, CAPs e hospitais que estão atendendo pessoas em situação de dependência.
O que dizem os candidatos sobre drogas e ajuda aos dependentes?
O Hoje Express questionou, via assessoria, os quatro candidatos a prefeito de Cascavel: Renato Silva (PL), Marcio Pacheco (PP), Edgar Bueno (PSDB) e Professora Liliam (PT). Somente Renato e Pacheco responderam.
O atual vice-prefeito e candidato pelo PL, Renato Silva, disse que “eu e o Paranhos sempre priorizamos esse tema; é uma área que recebe muita atenção do nosso governo e nosso objetivo e dar continuidade, ampliar e fortalecer”. Silva disse ter diversas propostas: fortalecimento do Programa Vida Nova, Patrulha Amiga nas Escolas, Ser Feliz sem Drogas, Jovens + Fortes e Blitz da Prevenção. “É importante também destacar que vamos ouvir muito a sociedade, fortalecendo a atuação dos conselhos que se relacionam direta e indiretamente com o tema. O meu foco e do Henrique Mecabô é dar continuidade ao trabalho que eu e o Paranhos desenvolvemos, fortalecendo e ampliando”.
Marcio Pacheco, que é deputado estadual, quer aprimorar e fortalecer o Programa Municipal de Prevenção às Drogas, que atuará na educação das crianças contra o uso de drogas e conscientização. Pacheco aponta também o fortalecimento da parceria com as entidades filantrópicas, organizações de “fundamental importância no apoio à recuperação dos usuários, bem de suas famílias com suporte psicológico, espiritual e social”.
Pacheco quer inovar com implantação da “multa administrativa a quem estiver fazendo uso de drogas ilícitas em áreas e logradouros públicos, como prevê o PL 2/2024 que tramita na Assembleia Legislativa do Paraná e tem o nosso apoio”.
Fotos: Nileide Herdina/Vandré Dubiela O Paraná/Hoje Express