Opinião

Coluna Direito da Família: O Catar e a competição pela representatividade

Enquanto a bola rola em campo, não se podem desconsiderar os aspectos políticos que fazem parte do grande encontro mundial que é a copa. Ao contrário do imaginário popular, a plateia deste evento não se reserva apenas a um gênero, mas à coletividade. Deveria ser uma maneira de celebração da diversidade, enquanto cerne da essência humana.

Ocorre que o próprio país que sedia a copa tem legislações questionáveis quanto à dignidade humana. Alguns diriam: mas é o país deles e o que nós temos a ver com isso? Tudo. O reconhecimento dos direitos humanos se faz a partir da luta social, em vista da progressiva ampliação e alcance das minorias, que não o são por quantidade, mas por lacunas de representatividade. O olhar empático à dor alheia é fundamental na construção de uma sociedade mais justa, pacífica e, sobretudo, igualitária.

Ao mesmo tempo em que se discute calorosamente sobre a liberdade, como pressuposto para a existência humana em sociedade, não se deve olvidar que esta depende da igualdade. Não deveria ser chocante a uma mulher iraniana assistir à sua seleção jogar, pois deveria ocupar os mesmos centros de política que hoje são reservados aos homens. Assim como não deveria ser rotineira a violação de direitos das mulheres, especialmente no seu local de amor e afeto: o relacionamento doméstico.

Esta reflexão é imprescindível para a redução dos alarmantes casos de violência doméstica que acontecem diuturnamente nos lares brasileiros. Não somos o país pacífico e acolhedor que tantas vezes foi mostrado lá fora. Somos um país com uma construção cultural misógina, racista e aristocrática. E não é possível defender esses costumes arraigados como mera liberdade de expressão, pois não é admissível a sobreposição de um direito sobre outro, de modo a sufocar o último. Imperiosa se faz a convivência harmoniosa dos direitos e dos indivíduos.

Todavia, quando se trata de direitos, por vezes de omitem os deveres. O dever é sempre do outro, de alguém hipotético e abstrato. Na sociedade pós-moderna, fomentada pela tecnologia da informação, desemboca-se uma avalanche de desinformações, destinadas, em grande medida, a sustentar verdades que não existem e distanciar os indivíduos, criando o grupo do eu (e dos que pensam como eu) e do “eles” (que pensam de modo diverso). Muito pouco de democrático parece ser esse espaço então, pois as divergências de opiniões se polarizam, mas nunca se resolvem.

Assim, quem tem poder se impõe e as minorias acabam esmagadas pelas vozes uníssonas do ódio e da intolerância. Não à toa, nesse mesmo período, mais mulheres enfrentam a desigualdade de gênero em seu lar, até velada, tendo seus direitos tolhidos. Pior de tudo, o fazem sob a alegação de defesa da família ou dos bons costumes, esquecendo-se de mencionar que se trata da família patriarcal e dos costumes machistas que sustentam o status quo masculino há milênios.

Dra. Giovanna Back Franco – Professora universitária, advogada e mestre em Ciências Jurídicas