Reportagem: Juliet Manfrin
Toledo – Os problemas cada vez mais frequentes detectados pela sociedade civil, vereadores e/ou entidades e instituições especializadas em varreduras em processos licitatórios têm chamado a atenção e provocado um alerta.
Entre os exemplos estão os processos em investigação pelo Ministério Público do Estado sobre a aquisição de equipamentos para usinas de reciclagem em cerca de 150 municípios, de quase R$ 40 milhões, cuja suspeita é de direcionamento do certame.
Nessa semana o TCE-PR (Tribunal de Contas do Estado do Paraná) suspendeu a licitação da Secretaria de Segurança Pública para a locação de banheiros químicos para a Operação Verão após denúncia de restrição na concorrência.
Há um mês, após fiscalização de rotina no Portal da Transparência, a organização Vigilantes da Gestão Pública identificou e denunciou ao Ministério Público de Toledo possíveis irregularidades na tramitação para contratação de serviços e realização das festividades alusivas à Semana Farroupilha. Segundo o presidente da entidade, Sir Carvalho, estava evidenciado um possível direcionamento. A Justiça suspendeu a licitação.
Essas situações se somam a outras centenas em investigação por todo o Paraná. E o que elas têm em comum? Segundo Sir Carvalho, a enxurrada de contestação de editais “frágeis e irregulares” evidencia o mau uso de dinheiro público e abre brechas para que as organizações criminosas se utilizem deles para ganhar muito dinheiro sem oferecer um serviço adequado a quem paga a conta: o contribuinte.
Há poucos dias Sir esteve em Ibema, onde fez orientações sobre licitações “para prevenir que editais sejam publicados com problemas que permitam que empresas irregulares participarem dos certames”. E é isso o que ele está disposto a fazer por todo o Estado, sempre que for chamado: “Há no Paraná um quadro dantesco na gestão pública municipal quando o assunto são os processos licitatórios, com raras exceções”.
Os principais problemas
Somente na região oeste do Paraná, as compras públicas envolvendo prefeituras e demais repartições públicas estaduais e federais movimentem R$ 2 bilhões por ano. O problema é que nem todo esse dinheiro tem destino correto ou acaba em empresas idôneas e de fato capacitadas para oferecerem produtos e serviços de qualidade, alerta o presidente da Vigilantes da Gestão Pública, Sir Carvalho.
Com faro treinado para a caça de irregularidades, Sir é categórico: algo preciso ser feito e com urgência.
Dentre os principais problemas que têm levado à má gestão e/ou à destinação do dinheiro público são os editais mal formulados, geralmente feitos em Paços Municipais que não têm recursos humanos capacitados. “Em seguida vêm as nomeações políticas nas secretarias de onde saem os termos de referência ou os projetos básicos que devem ser bem delineados para dar sustentação a um bom edital. São esses documentos vindos das secretarias que vão nortear a equipe de licitação”, reforça.
Mas os motivos não param por aí. “A soma de uma série de fatos permite que prefeituras e entes públicos virem presas fáceis para grupos organizados, criminosos que visam lesar o erário”, alerta.
E, claro, há ainda os casos de conivência de agentes públicos. “Não é só a inabilidade e/ou a incompetência, mas um processo mal elaborado, mal feito, abre portas a empresas desonestas… sempre que o edital é lançado, o mercado o analisa, as empresas sérias fazem um procedimento padrão e já identificam as pegadinhas. O resultado é que elas não participam e aí os processos são direcionados para algum grupo e/ou segmento viciado”, detalha.
Em casos assim, abrem-se brechas para as chamadas fatias criminosas e de corrupção, dando origem aos famosos “combinados” entre agentes públicos e empresas. “E aí sempre entra um contexto ainda mais complexo e perigoso. A população que fica desassistida ou assistida de forma ineficaz, um asfalto que não dura, a saúde que não funciona, seja por falta de conhecimento, de gestão ou de convicção. Isso precisa mudar!”
Menos transparência vai agravar situação
Dentre os mecanismos de monitoramento das ações do poder público, geralmente via editais e extratos de contratos, estão as publicações nos chamados Diários Oficiais. Isso porque a legislação exige que os atos sejam tornados públicos.
Só que uma decisão recente do presidente Jair Bolsonaro acabou com a obrigação de prefeituras, autarquias e instituições públicas de publicar editais em diário oficial impresso (jornais), mecanismo que pode abrir mais brechas para a falta de transparência.
Apesar de todos os entes públicos terem de publicá-los, obrigatoriamente, por meio de portais da transparência, ainda há um longo caminho para tornar essas informações mais acessíveis, compreensíveis e fidedignas.
Segundo Sir Carvalho, não se pode esquecer que existe uma corrente de modernização nos atos e nos balanços de empresas e repartições – públicas e privadas – e nada pode ser negado na substituição de ferramentas, mas o alerta é incisivo: os portais da transparência ainda são muito ruins, nem sempre trazem as informações que deveriam trazer ou são simplesmente inavegáveis. “Não é de todo mal [publicar nos meios eletrônicos], mas precisa haver a certificação do portal, se há uma integralidade adequada, se supre as necessidades da transparência, se não sofre manipulações… Existe hoje o Diário Oficial Eletrônico que atende às nossas necessidades, mas reforço: é preciso ter transparência e facilitar o acesso”.