Reportagem: Cláudia Neis
Foz do Iguaçu – A relação entre Brasil e Paraguai no gargalo de transporte internacional já estava complicada por conta de um excesso de fiscalização do lado paraguaio, que vinha causando transtornos aos caminhoneiros, que demoravam muito além do normal para retornar ao Brasil.
A situação que já era crítica se agravou no início desta semana com a manifestação de cerca de 400 caminhoneiros – proprietários de veículos pequenos que faziam o transporte de cargas menores, fracionadas – que desde o início da pandemia não conseguem trabalhar devido às restrições do governo paraguaio, que fechou a fronteira com o Brasil. “Esse transporte foi proibido por conta da pandemia. Os produtos que eram transportados por esses veículos menores estão indo em caminhões maiores, que equivalem a dez deles. Então, deixaram de transitar dez veículos pequenos no lugar de apenas um. Isso foi uma medida inteligente do governo paraguaio para reduzir a circulação de pessoas, só que agora esses profissionais reivindicam seu direito de trabalhar e fecharam a Ponte da Amizade”, explica o presidente do SindiFoz (Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Foz do Iguaçu-PR e região), Celso Antonio Gallegario.
Diante da situação, o fluxo de cargas, que já vinha difícil com acúmulo por conta da fiscalização do lado paraguaio, com cerca de mil veículos retidos à espera de cruzar para o lado brasileiro, deve dobrar e os motoristas podem ficar na fila por até dez dias. “Fizemos contato com Brasília, procuramos a CNTA [Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos] e o Itamaraty relatando a situação, porque já está ficando desconfortável, pois qualquer problema que acontece, eles [paraguaios] estão fechando a ponte. Estamos esperando um retorno para que o transporte bilateral possa voltar a fluir”, ressaltou o presidente.
Desabastecimento
As consequências da paralisação podem ir de desabastecimento até uma mudança de mercado. “Pode haver desabastecimento de produtos alimentícios, higiênicos e consumos em geral no Paraguai e, no Brasil, falta de matéria-prima oriunda do Paraguai para a produção de ração animal e outros derivados. A falta de matéria-prima atinge a região oeste do Paraná e também o oeste catarinense”, frisa Gallegario.
Ele afirma que, diante do risco de desabastecimento, os consumidores devem buscar a matéria-prima no Mato Grosso e uma mudança de mercado não está descartada.
Mais pressão
O presidente do Codefoz (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social de Foz do Iguaçu), Mario Camargo, ressalta que, além dos caminhoneiros, também se juntaram à mobilização motoristas de vans e táxis como uma forma de pressionar o governo paraguaio a rever as medidas em vigor de enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. “As cidades fronteiriças foram, sem dúvida, as mais prejudicadas pelo fechamento total [das fronteiras pelo governo paraguaio]. E, agora, esses profissionais tentam pressionar o governo, mostrando que pode haver um desabastecimento por conta da interrupção da entrada de produtos para que as medidas sejam revistas e possam voltar a trabalhar. As autoridades do lado paraguaio se reúnem nesta quarta para discutir a situação e a nossa sugestão é que os pequenos caminhoneiros, com todas as medidas de precaução, possam voltar a trabalhar… eles precisam e o trabalho que fazem é todo dentro da legalidade”, explica Mario.
Caminhoneiros passam fome e dificuldades
O presidente do SindiFoz, Celso Antonio Gallegario, ressalta o perigo e desassistência a que os caminhoneiros estão expostos dentro do Paraguai: “Nossa maior preocupação é a questão sanitária do lado paraguaio. Do lado brasileiro, as transportadoras têm banheiros, há um maior acesso a higiene e, no Paraguai, não tem nada disso. Os caminhoneiros estão parados à beira de uma rodovia, sem local onde fazer suas necessidades fisiológicas, sem local para se alimentar… Eles estão em desespero lá, sendo assaltados na fila”, lamenta Gallegario.
A reportagem teve acesso ao depoimento de uma dos caminhoneiros. Ele é brasileiro e está no país vizinho desde a última quinta-feira (9) e pediu para não ser identificado: “Estou há cinco dias aqui, no Paraguai. Fui assaltado, levaram a minha caixa de comida, panela, botijão de gás… Não temos banheiro, não temos água, nenhuma autoridade intervém por nós… Todos os colegas estão na mesma situação. A maioria já foi assaltada. Só pedimos que alguém possa nos ajudar, trazer água, comida… alguns que ainda têm um pouco de comida têm dividido com os outros, mas alguns estão passando fome. Esperamos que alguém faça algo por nós”, clama o caminhoneiro.