O fechamento das escolas durante a pandemia de covid-19 poderá ter impacto profundo e de longa duração – cerca de 15 anos – sobre a economia brasileira. A avaliação é da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, que divulgou nesta quarta-feira (17) o Boletim MacroFiscal com um box especial sobre os custos socioeconômicos dessa medida.
Segundo a secretaria, o impacto será sentido no Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas os bens e riquezas produzidos no país), no aprendizado e produtividade do trabalho e no aumento na desigualdade social, já que o acesso ao ensino remoto, ofertado em substituição às aulas presenciais, é distinto, de acordo com as faixas de renda da população.
A SPE considerou que os efeitos da atual crise podem se estender até o final de 2022, resultando em um hiato de três anos na educação de uma grande parcela da população que hoje tem entre 5 e 20 anos (idade escolar). “Um prejuízo de dimensões incalculáveis”, diz o boletim.
“Há duas formas extremas de lidar com o problema. É possível imaginar também soluções intermediárias entre elas. A primeira seria simplesmente deixar o hiato educacional cobrar seu preço no estoque de capital humano brasileiro, de modo que jovens entrem no mercado de trabalho com a mesma idade que entrariam sem a pandemia, porém com uma quantidade menor de anos de educação formal”, diz o boletim. “Essa alternativa seria uma verdadeira catástrofe na acumulação de capital humano e na produtividade do trabalho de uma geração inteira”, avaliou a SPE.
A segunda alternativa seria cobrir esse hiato com anos adicionais de estudo após o término da pandemia. “Mas o efeito visual de se postergar por três anos a entrada dos jovens no mercado de trabalho é ‘dramático’”, diz a secretaria, já que haverá uma proporção menor de adultos em idade laboral e, assim, um encolhimento da população que gera riqueza no país.
De acordo com o boletim, esse efeito deve durar por aproximadamente 15 anos após o término da pandemia, possivelmente até 2038, até que toda essa parcela da população atingida com a paralisação das aulas entre no mercado de trabalho. “Portanto, escolas fechadas hoje causam um país mais pobre amanhã. E esse amanhã deve perdurar por quase duas décadas.”
Desigualdade de renda
Por outro lado, o boletim destaca que o impacto negativo da pandemia sobre o aprendizado dos alunos não é homogêneo na população, já que há o ensino remoto como substituto do ensino presencial, “embora esteja longe de ser um substituto perfeito”. “Ele [o impacto] tende a ser tanto maior quanto mais baixa é a renda familiar, uma vez que a existência de barreiras para o estudo remoto correlaciona-se fortemente com a renda. Um computador conectado à internet, e um ambiente adequado na residência para o ensino a distância, são requisitos praticamente inatingíveis para milhões de famílias de baixa renda”, acrescenta o boletim.
Para a SPE, é possível, inclusive, que crianças que têm condições materiais para acesso ao ensino a distância também tenham experimentado algum déficit de aprendizado, mas “o prejuízo terá sido muito maior para crianças pobres, porque foram destituídas de qualquer tipo de ensino em 2020”.
A secretaria explica ainda que os efeitos da educação sobre o crescimento econômico são muito bem documentados na literatura macroeconômica e estima-se que cada ano adicional de educação é capaz de impulsionar o crescimento do PIB em cerca de 0,58% no longo prazo. Outra estimativa é que aproximadamente 40% da diferença de renda entre o Brasil e os Estados Unidos são fruto do atraso educacional em nosso país.
“Para se ter uma ideia, enquanto em países desenvolvidos, como a Alemanha e os Estados Unidos, a população tenha médias de anos de estudo de 13 ou 14 anos, no Brasil esse número é pouco maior do que 7 anos. Essa diferença evidencia não só uma das razões para o tímido crescimento brasileiro, como também para a baixa qualidade de vida do nosso povo”, diz o boletim.
Além disso, os impactos do baixo nível educacional somam-se a questões relacionadas à disponibilidade de escolas e creches, o que reduz a oferta de mão de obra, em especial, das mulheres; à qualidade do ensino e uma cadeia de outras conexões, como evasão escolar e saúde mental, que potencializam os efeitos da educação sobre o bem-estar econômico no curto e no longo prazos. E isso tende a ser transmitido para as gerações futuras.
Para a SPE, as ações de fechamento de escolas foram justificáveis diante da total incerteza no início da pandemia, mas evidencias recentes vêm demonstrando que a abertura delas pode não ser um fator de risco para a propagação do coronavírus.
“Nosso país optou pelo fechamento completo das escolas públicas no ano de 2020 e por um período muito mais extenso do que o registrado em outros países (média de 40 semanas no Brasil, contra 22 semanas no resto do mundo). E mais: essa política persiste, ressalvadas algumas exceções, em 2021. Nesse sentido, todos os números apresentados até aqui podem ser entendidos como a previsão mais otimista dentre as possibilidades”, ressalta o boletim da SPE.