A mais recente investida do ministro Alexandre de Moraes contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) levanta sérias dúvidas sobre o equilíbrio entre os poderes no Brasil e o verdadeiro alcance da chamada “perseguição judicial” denunciada pela direita. Em decisão autorizada na sexta-feira (18), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) determinou uma série de medidas cautelares contra o ex-presidente, incluindo tornozeleira eletrônica, recolhimento noturno e proibição de comunicação com aliados e diplomatas. O motivo: a atuação do deputado federal licenciado e filho de Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos.
Segundo Moraes, a ida de Eduardo aos EUA com o objetivo de denunciar abusos cometidos por autoridades brasileiras seria um “atentado à soberania nacional” — um argumento inusitado, vindo justamente de um ministro que já censurou parlamentares, jornalistas e cidadãos comuns por simples críticas nas redes sociais. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, foi o autor do pedido que motivou a operação. A acusação? Tentativa de pressionar autoridades norte-americanas a sancionar integrantes do STF, da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República — em outras palavras, a denúncia de uma perseguição institucional virou motivo de mais perseguição.
Proibições
A decisão judicial impõe, entre outras coisas, a proibição de Bolsonaro se manifestar em redes sociais ou manter qualquer contato com representantes estrangeiros. Um ex-chefe de Estado, com 70 anos de idade, impedido de exercer sua liberdade de expressão e sua diplomacia informal com lideranças internacionais. O cerco se fecha de forma simbólica e prática: Bolsonaro não poderá sequer almoçar com embaixadores — encontros que, aliás, sempre fez questão de manter com transparência.
A operação de busca e apreensão realizada na casa do ex-presidente e na sede do PL recolheu US$ 14 mil, valor declarado e com recibos do Banco do Brasil, segundo o próprio Bolsonaro. “Sempre guardei dólar em casa, pô. Todo dólar pego lá tem recibo do Banco do Brasil”, disse. Ainda assim, a presença da Polícia Federal, mais uma vez, segundo o ex-presidente, reforça o tom persecutório da ação. “É a quarta busca e apreensão contra mim. Suprema humilhação”, declarou Bolsonaro, ao lado da sede da PF em Brasília. “Nada de concreto existe. O inquérito do golpe é um inquérito político.”
EUA, sanções e o fator Trump
O pano de fundo internacional da ofensiva contra Bolsonaro expõe ainda mais o alegado viés político da operação. Eduardo Bolsonaro está atualmente nos Estados Unidos, onde mantém diálogo com lideranças conservadoras e aliados do presidente Donald Trump. A relação entre o bolsonarismo e a direita americana tem se intensificado, especialmente em meio ao avanço da pauta globalista e do denunciado autoritarismo judicial no Brasil.
A reação de Trump à situação de Bolsonaro foi imediata. Ao anunciar tarifas sobre produtos brasileiros, o republicano relacionou o processo contra o ex-presidente. Um gesto claro de repúdio ao que se desenha como perseguição política, com implicações diplomáticas e comerciais para o Brasil. O presidente Lula, até agora, tem feito críticas ácidas ao governo americano e culpado Bolsonaro pela crise diplomática sem precedente na história brasileira.
“Eu tenho mais contato com embaixadores do que o próprio ministro das Relações Exteriores”, afirmou Bolsonaro, evidenciando o vácuo diplomático deixado pelo atual governo. O ex-presidente também criticou o alinhamento ideológico de Lula com a China e sua proposta de tirar o dólar das negociações do Brics — proposta que desagradou profundamente o mercado internacional e gerou ruídos com Washington, além das manifestações do petista em apoio público à vice-presidente Kamala Harris, adversária de Trump nas últimas eleições americanas.
“Golpe de festim”
O ex-presidente foi enfático ao rechaçar qualquer plano de fuga: “Sair do Brasil é a coisa mais fácil que tem. Mas não conversei com ninguém sobre isso. Nunca pensei em fugir”. A ideia de que Bolsonaro estaria tentando escapar da Justiça é frequentemente usada para alimentar o discurso da esquerda, mas não encontra respaldo nos fatos. O próprio Bolsonaro fez questão de dizer que se considera “perseguido” e que “não há provas contra ele, apenas suposições”.
A narrativa de uma suposta tentativa de golpe continua sendo usada como justificativa para um inquérito que avança sem prazos definidos, sem provas materiais conclusivas e com decisões que beiram o autoritarismo, segundo análise de diversos juristas. Bolsonaro classificou as acusações como “golpe de festim”, lembrando que nenhuma ação concreta ou violenta foi realizada, tampouco existiu qualquer armação real para tomada do poder.
Bolsonaro diz que vai ser preso até o fim de agosto
“Isso daí [ser preso], a princípio, o sentimento é de que vai acontecer. No máximo no mês que vem, quando é o julgamento. Mais ou menos 20 de agosto o julgamento. Nunca se viu processo tão rápido como o meu. Eu estou com 70 anos de idade, tenho uma vasta experiência de vida, tudo pode acontecer”. Essa foi a afirmação do ex-presidente Bolsonaro aos jornalistas na sede da Polícia Federal.
Ao ser questionado sobre possíveis complicações da sua em caso de ser levado a um presídio, Bolsonaro voltou a afirmar que o “sistema” o quer “morto”. “Tenho 70 anos e a facada tem reflexos até hoje. Agora o sistema não me quer preso, o sistema me quer morto. Porque eu preso vou dar problema pra eles […] É pessoal. É o que o Alexandre de Moraes quer”.
Na última segunda-feira (14), a PGR pediu a condenação do ex-presidente argumentando que ele “alimentou diretamente a insatisfação e o caos social” após as eleições de 2022.
Caso seja condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado, a pena pode passar de 40 anos de prisão.
Imposição de silêncio e prisão em perspectiva
Com a tornozeleira eletrônica e outras restrições em vigor, Bolsonaro se torna, na prática, um preso político monitorado. A proximidade do julgamento do chamado “golpe” aumenta a pressão por uma eventual prisão — decisão que teria consequências graves para o país devido a inegável polarização. A direita, que continua mobilizada, enxerga na operação mais uma tentativa de calar sua principal liderança e fragilizar o campo conservador em ano pré-eleitoral.
A defesa do ex-presidente recebeu com “surpresa e indignação” a imposição das medidas, destacando que ele sempre cumpriu todas as determinações do Judiciário. “Essa é a prova viva de que o Estado de Direito está sendo relativizado”, disse a defesa de Bolsonaro.
Crise e risco
A ofensiva de Moraes contra Bolsonaro não é apenas um ataque a um ex-presidente, mas um sintoma claro da crise institucional no Brasil. O chamado ativismo judicial, age como braço armado de um sistema que não admite oposição. Ao tratar como crime a articulação política do ainda deputado federal Eduardo Bolsonaro nos EUA, o STF ignora princípios diplomáticos básicos e reforça a ideia de que há, sim, uma perseguição em curso.
A criminalização do discurso conservador, o uso seletivo das leis e a restrição de liberdades individuais apontam para um caminho perigoso. Não se trata mais de um embate jurídico, mas de uma guerra política. E nessa guerra, a Constituição vem sendo usada como arma contra aqueles que ousam questionar o sistema.