
Conte algo que não sei.
Dentre os refugiados das guerras que vão buscar asilo na Alemanha, há pessoas de países que não estão em guerra, mas que criminalizam a homossexualidade, como Rússia, Nigéria, Uganda e outros países da África. O problema é que elas ficam em campos de refugiados com outras pessoas que têm a mesma visão em relação à comunidade LGBT, e acabam sofrendo preconceito lá dentro, também. Depois de colocarem fogo num menino que era gay e de homossexuais sofrerem muitas represálias, o governo alemão criou um campo para refugiados LGBTs, em Berlim.
Qual a importância de pesquisar sobre o preconceito contra a comunidade LGBT?
Falar sobre o assunto já é importante, porque tenho a sensação de que a história do mundo é cíclica e as coisas se repetem. Berlim, na década de 20, era considerada um paraíso gay na Europa. Mas veio o nazismo e acabou com tudo. Em três anos, as pessoas começaram a ser perseguidas, denunciadas pelos vizinhos. Foi criada uma lei que tratava a homossexualidade como crime. Hoje, Berlim é de novo um lugar onde há liberdade para os homossexuais, tanto que muita gente está pedindo asilo para lá. Mas, ao mesmo tempo, recomeça uma onda superconservadora e de extrema-direita fascista pedindo que não haja mais casamento gay e a retirada de todas as poucas liberdades alcançadas. A extrema-direita se fortalece na Europa.
Há preconceito contra homossexuais na Alemanha?
O nazismo teve um peso tão grande na vida das pessoas que cada um toma conta da sua vida, e ninguém vai xingá-lo ou agredi-lo na rua por ser gay. Não é igual ao Brasil, onde as pessoas são espancadas e assassinadas por serem gays. Só que os alemães se acham muito evoluídos e que não existe preconceito, mas ainda é igual ao mundo inteiro: uma mãe não quer ter filho gay, e é sempre um problema para um jovem se assumir. Mas não tem o peso da violência física e do assassinato. Avançamos, mas o risco é que, da mesma forma que na década de 20 era muito legal e piorou, agora está muito legal e pode piorar. Precisamos falar sobre isso de alguma forma.
E a situação no Brasil?
Aqui, as pessoas estão se sentindo no direito de cercear a liberdade do outro por conta de figuras públicas e políticas que incentivam e incitam a violência na mídia o tempo todo. Quando um pastor afirma que é um pecado abominável ser gay dá liberdade para uma pessoa bater na outra na rua, por exemplo, e dizer: ?Você não é certo, não é uma figura de Deus, então vou espancá-lo.? No Brasil, essas pessoas estão ganhando cada vez mais voz, o que é um perigo muito grande.
Não é irônico o Brasil ser considerado liberal no exterior?
O Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo todo, principalmente transexuais. Quando eu conto isso na Alemanha, todos ficam chocados, porque as pessoas imaginam que há liberdade sexual aqui no Brasil.
A arte permite conquistar um lugar social mais livre para a comunidade LGBT?
Com certeza. Acho que tem a ver com representatividade mesmo, de sentir que você não está sozinho e que tem gente no mundo inteiro vivendo as mesmas questões. Em alguns países, de formas até muito piores, como é o caso dos países africanos, ou na Rússia. É importante perceber que os direitos que foram conquistados têm que ser muito bem protegidos, para que não sejam perdidos.